Título: Código de Ética da Alerj pode virar 'santo de bordel'
Autor: Paulo Celso Pereira
Fonte: Jornal do Brasil, 02/05/2005, País, p. A4
Afirmação é de deputados que não acreditam na moralização da Casa
A Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro começou a votar na semana passada o projeto de criação de um Código de Ética. A medida, que entrou na ordem do dia logo depois da absolvição do deputado Alessandro Calazans (sem partido) - que sofreu um processo de cassação de mandato por suposta venda de votos numa CPI da qual era presidente -, teoricamente proporcionaria uma maior moralização da Casa.
Apesar de o intuito da Assembléia ser apresentar uma maior transparência, os parlamentares reconhecem que o Código pouco poderá ajudar em termos práticos. Deputados dos mais diversos partidos, inclusive os autores do Código, os deputados Paulo Melo (PMDB), Paulo Pinheiro (PT) e Paulo Ramos (PDT), afirmam que a moralização não passa pela criação do Código.
- O Código de ética não vai tornar ninguém melhor, só vai criar normas. O resultado do caso Calazans não seria diferente por ter o Código de ética. Ele iria ganhar pelos mesmos 37 a 25 - explica Paulo Melo.
A proposta do Código é determinar com precisão quais são os atos que devem ser considerados quebra de decoro parlamentar e dar maior agilidade ao processo. Segundo os autores do projeto, com isso seria mais fácil indicar a cassação de um deputado quando necessário for. Mas, o resultado final sempre dependerá da maioria do plenário. O deputado petista Carlos Minc é cético, e objetivo, em relação ao perigo de o Código oferecer apenas uma aparente moralidade:
- Depois do que vimos na absolvição de Calazans, é importante tomarmos cuidado senão o Código pode virar santo de bordel. Há o risco de termos o Código de ética e não termos ética - atacou Minc.
O projeto foi apresentado há quase dois anos, no dia 11 de setembro de 2003. Desde então, ficou atravancado nas mais diversas comissões da Casa e só se acelerou com a crescente desmoralização da Assembléia após a conclusão do caso Calazans, no último dia 14. Na data, o deputado conseguiu se livrar da cassação de mandato por 37 votos a 25, mesmo com o relatório da Comissão de Constituição e Justiça apresentando nove argumentos a favor da perda.
- Certa ou errada deve-se respeitar a decisão da maioria. Afinal, o regime democrático pode até ter defeitos mas é o melhor para a sociedade civil - defende o presidente da Alerj, Jorge Picciani (PMDB).
No entanto, ele reconhece que o Código apenas facilita a cassação, mas não é a solução para a corrupção:
- O importante mesmo é ter ética. Mas, sempre que se aperfeiçoa as instituições fica mais fácil punir. E quando o julgamento se dá mais perto do fato, as chances de isso ocorrer aumentam. A lentidão do processo permitiu que a decisão do caso Calazans se desse longe da denúncia e isso facilitou a defesa - alega Picciani.
Outro autor do projeto o deputado Paulo Pinheiro explica que os Códigos não são feitos para coibir os atos, mas só para facilitar a punição.
- O Código não vai resultar numa mudança de comportamento, só vai agilizar o trabalho da Alerj. Não tenho nenhuma esperança que mude a conduta das pessoas. O Código só será ágil para punir quem puder. Ele não atua coibindo. Afinal, existe um Código Penal e nem por isso as pessoas deixam de realizar os crimes - lembra.
Como a decisão final sobre qualquer caso de cassação voltará ao plenário, a dúvida que fica no ar é de o quanto o novo Código poderá ser eficaz. No caso Calazans o plenário mostrou claramente que o corporativismo vigora na Casa, já que os indícios para cassação eram inúmeros. Paulo Pinheiro afirma que só há uma forma de mudar a votação final:
- A decisão será das mesmas pessoas, os deputados. O Código não vai mudar as pessoas, mas ele agiliza e facilita a decisão. Esses instrumentos facilitam a cobrança da sociedade e dão ao povo mais informação para melhorar seu voto.
Pinheiro acredita, no entanto, que os inúmeros problemas de corrupção que tem atingido a Assembléia não são isolados. Segundo ele, são apenas o reflexo de toda a sociedade
- Nesse mesmo período o Judiciário, o Executivo e a polícia também tiveram inúmeras denúncias. A sociedade como um todo está arranhada e a Alerj é só mais um exemplo. Quem aranha a Assembléia são os deputados, mas todos eles foram colocados lá pelo voto. O importante do Código é dar maior transparência para que a sociedade possa mudar seu voto na próxima eleição.