Título: Moradia para todos
Autor: Roberto Kauffmann*
Fonte: Jornal do Brasil, 03/05/2005, Economia & Negócios / Além do fato, p. A18

Apesar de termos vivenciado um período favorável recentemente com a retomada do crescimento em 2004, sabe-se que ainda há muito por fazer para a redução da desigualdade e da violência, não restrita às grandes metrópoles urbanas de nosso país. O enorme déficit habitacional, estimado em cerca de 7 milhões de unidades no país, e a falta de um processo contínuo de geração de emprego estão por detrás destes problemas. O setor da construção civil apresenta grande potencial para desempenhar um papel estratégico na solução destas questões, principalmente pela sua capacidade de gerar empregos para trabalhadores de baixa renda e baixa qualificação. Este papel ganha importância em um momento em que a cadeia da construção supera o período mais negativo de seu desempenho.

Com efeito, o início do século XXI foi marcado por uma série de dificuldades: enquanto o PIB industrial do país cresceu 7% de 2000 a 2003, o PIB da construção civil caiu 7,1%. Fatores como o baixo poder de compra do trabalhador brasileiro, a baixa oferta de linhas de financiamento e o equivocado direcionamento das linhas disponíveis, que privilegiavam a aquisição de imóveis usados, por exemplo, explicam estes resultados.

Todavia, o ano de 2004 pode ser considerado um marco, com a aprovação da Lei 10.931/04, que reduz a insegurança jurídica e o aumento do direcionamento dos recursos da poupança para o financiamento habitacional, através da resolução 3.177 do Banco Central. Com as mudanças, a disponibilidade de recursos privados este ano será muito maior, da ordem de R$ 20 bilhões.

O setor da construção civil vem negociando com os bancos privados a elevação dos financiamentos concedidos, com resultados positivos. Os novos financiamentos com recursos da caderneta chegaram a R$ 909 milhões no primeiro trimestre, o que representou uma elevação de 62,78% em relação ao mesmo período de 2004, superando os 30% de aumento acordados entre os bancos, o governo e o setor da construção. Se o acordo fechado recentemente para o segundo trimestre for avalizado pelo governo, a previsão é de que o primeiro semestre encerre com aumento de pelo menos 30% comparado ao mesmo período de 2004, representando R$ 1,7 bilhão de financiamento imobiliário.

Há a possibilidade de que estes recursos sejam ainda expandidos. É preciso que as linhas de crédito oferecidas sejam adequadas às necessidades dos tomadores. Para tanto, o setor da construção apresentou sugestões de programas que, no passado, tiveram grande sucesso.

Dentre eles, destacam-se: a) o Fimaco-Recon, financiamento para a aquisição de material de construção por parte das empresas construtoras; b) o programa de financiamento direto ao produtor; c) o retrofit-revitalização, visando reforma e revitalização de imóveis localizados em sítios históricos ou áreas de requalificação urbana, transformando, assim, casarões antigos em habitações, mantendo as características de volumetria e fachada; d) a aquisição de imóveis comerciais, lojas ou escritórios; e) o Proemp, linha que contempla empresas que queriam proporcionar moradias a trabalhadores próximas da localidade da empresa.

Para a população de baixa renda (até seis salários mínimos), está sendo proposta a criação de uma nova linha que combine recursos da poupança e do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), com juros mais baixos, contemplando imóveis de menor valor. Para a faixa de renda abaixo de três salários mínimos, é conhecida a necessidade de subsídio explícito por parte do governo. A aprovação do projeto de lei 36/04, que está no Senado (já aprovado na Câmara dos Deputados), é de vital importância neste aspecto, uma vez que cria o Fundo Nacional de Subsídio à Habitação e Interesse Social. Este fundo viabilizará a oferta de recursos para a disponibilização de moradias para a população carente, que não tem condições de tomar crédito.

As perspectivas são assim promissoras. Foram dados passos largos na direção da revitalização de uma cadeia estratégica como a da construção. Mas é importante lembrar que ainda restam tarefas inacabadas, principalmente para a parcela mais necessitada da população.

*Presidente do Conselho Empresarial da Indústria da Construção da Firjan e presidente do Sinduscon-Rio