Título: Uma nação de presidiários
Autor: Olivia Hirsch
Fonte: Jornal do Brasil, 01/05/2005, Internacional, p. A10

O país que se apresenta ao mundo como a terra da liberdade é também a terra dos encarcerados. Segundo dados divulgados na última semana pelo Departamento de Justiça, mais de 2,1 milhões de cidadãos - a população da Eslovênia - estão presos atualmente nos EUA. Filho de um cubano e de uma americana, Michael Santos, de 41 anos, é um deles.

- Quando fui preso, em 1987, não conhecia ninguém que estivesse. Agora, quase todos os americanos conhecem alguém. Estamos criando uma nação de presidiários - diz ao JB.

Segundo Malik Russell, da organização independente Justice Policy, a atual população carcerária do país é um reflexo da entrada em vigor de muitas leis, parte de uma intensificação do combate às drogas no início da década de 90, durante o governo de George Bush, pai.

- Levou 160 anos para o país alcançar 1 milhão de presos, cifra que mais que dobrou desde os anos 90 - observa. - Atualmente, a maioria está detida por crimes não violentos.

Entre junho de 2003 e junho de 2004, período a que se referem as estatísticas, a população carcerária aumentou em 48,4 mil pessoas no país, crescimento que se destacou mais no estado de Minnesota, onde foi de 13,2%. A situação é mais crítica entre os negros. Ao todo, 12,6% dos homens negros entre 25 e 30 anos nos EUA estão presos, contra 3,6% dos de origem hispânica e 1,7% dos brancos.

O crescimento da população carcerária, no entanto, contradiz os dados atuais sobre criminalidade. Segundo Howard Abadinsky, da Divisão de Justiça Criminal da Universidade St. John, os delitos reduziram nas últimas duas décadas.

- Este declínio provavelmente está relacionado a redução da população de risco, entre 15 e 25 anos - diz.

Mas na opinião de Jock Young, autor do livro A Sociedade Excludente, há outra explicação. Para ele, está havendo uma mudança nas bases.

- Parece que os jovens se cansaram de levar tiros, de ver os outros morrendo, de consumir drogas pesadas. E é uma mudança que não é possível ocorrer de cima para baixo, por isso tão positiva - diz.

Young afirma ainda que essa redução é um tendência geral nos países desenvolvidos e não deve ser associada ao aumento da repressão, pois também pode ser observada no Canadá, onde há apenas 36 mil presos.

Mas há quem se beneficie com o fato de 726 americanos de cada 100 mil residentes - 12 vezes mais que o Japão - estarem atrás das grades. Russell afirma que políticos recebem mais verbas federais quanto mais forem os encarcerados de sua região - já que o cálculo não é feito pela área de onde vêm os detentos, mas onde estão.