O Globo, n. 32797, 24/05/2023. Economia, p. 13

Exploração em suspenso

Geralda Doca
Jennifer Gularte
Dimitrius Dantas
Sérgio Roxo
Camila Turtelli


A reunião na Casa Civil que debateu a exploração da petróleo na foz do Rio Amazonas foi encarada como uma vitória, ao menos por ora, da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e do Ibama, na visão de técnicos que participaram do encontro. O entendimento é que foi reafirmado o compromisso feito pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ainda na campanha, de ter maior zelo em relação ao meio ambiente. Outros ministros, no entanto, adotaram um tom de neutralidade, dando a entender que a disputa não está encerrada.

Participaram da reunião, além de Marina, o ministro da Casa Civil, Rui Costa; o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates; o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira; e o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho.

Ao deixar a reunião, Marina disse que todas as decisões de exploração de petróleo precisarão passar por avaliação da área ambiental. Ela defendeu a decisão do Ibama de negar licença para testes de exploração, pela Petrobras, na chamada Margem Equatorial, na foz do Rio Amazonas.

— A partir de agora fica estabelecido o cumprimento da lei. Todas as frentes de exploração de petróleo passarão pela avaliação ambiental estratégica. O que a Petrobras vai fazer é decisão da Petrobras — disse a ministra. — O procedimento que está estabelecido para o conjunto das ações dos investimentos que serão feitos, envolvendo processos de licenciamento, terá de cumprir esse requisito, que foi estabelecido pelo próprio governo em 2012.

Ela se referia a uma portaria que exige, em pedidos de licenciamento, uma avaliação ambiental de área sedimentar (AAAS). Esta permite identificar áreas em que não seria possível realizar atividades de extração e produção de petróleo e gás em razão dos graves riscos e impactos ambientais associados. A licença de exploração da área foi pedida em 2014, ainda pela petrolífera BP. Os direitos foram transferidos para a Petrobras em 2020.

A ministra ressaltou que a decisão do Ibama foi técnica:

— O parecer do Ibama, considerando a posição unânime de dez técnicos, foi contrário, e a partir de agora o que está estabelecido é o cumprimento da lei —afirmou. — É uma decisão técnica, e a decisão técnica em um governo republicano e democrático é cumprida e respeitada, com base em evidências.

‘A ciência vai nortear’

Segundo Marina, caberá à Petrobras decidir os próximos passos:

— O que a Petrobras vai fazer é decisão da Petrobras. O pedido de licença foi negado pelo Ibama e o importante é a decisão de que vai ser cumprida a portaria que foi estabelecida em 2012 para todos os projetos com abrangência de grande impacto ambiental.

O presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, que também participou da reunião, disse que os ministérios do Meio Ambiente e de Minas Energia devem realizar em conjunto novos estudos ambientais na região. Serão os AAAS, que o Ibama vinha solicitando desde 2012. E, como ressaltou Marina, o pedido de uma nova licença “partirá do zero”.

— Essa foi a decisão. Não significa que foi rejeitado nem que foi liberado, significa que a ciência vai nortear — disse Agostinho ao GLOBO.

Antes de entrar na reunião, Agostinho havia dito que não cabe composição política em decisões técnicas:

— Muitas vezes a gente vai tomar decisões que vão agradar um grupo de pessoas, desagradar outro grupo de pessoas.

De acordo com um interlocutor que participou da reunião, ficou constatado que os estudos apresentados pela Petrobras ao Ibama foram insuficientes para que a estatal obtivesse a licença de exploração da área, diante dos riscos do empreendimento para o meio ambiente. Contudo, a estatal poderá apresentar estudos complementares e pedir reconsideração da decisão do órgão. Esse técnico ressaltou que o que foi indeferido foi a licença, não o empreendimento.

O levantamento da Petrobras, explicou esse técnico, terá de considerar toda a Margem Equatorial, não as bacias de forma isolada. Os estudos terão duração média de dois anos e vão depender do tipo de empreendimento, da sensibilidade das áreas ambientais e da coleta de dados e pesquisas já existentes.

A bacia da Foz do Amazonas é uma das regiões da chamada Margem Equatorial, que abrange todo o litoral norte, desde o Amapá até Rio Grande do Norte. A região é considerada ambientalmente sensível por reunir grande quantidade de fauna e flora marinha, além de concentrar grande parte dos manguezais do país.

A decisão do Ibama de negar a licença da Petrobras, há uma semana, colocou em polos opostos Marina e Silveira, que defende a exploração de petróleo no local.

Sem envolvimento de Lula

O ministro da Casa Civil buscou imprimir um tom de neutralidade a respeito do impasse entre Ibama e Petrobras. Costa foi escalado por Lula para mediar a reunião de ontem. Segundo fontes, o presidente não deve se envolver pessoalmente na queda de braço entre Marina e Petrobras neste momento.

Antes da reunião, Costa conversou com Lula por telefone. Por enquanto, não será feita nenhuma mudança brusca de decisão e fica mantida a negativa do Ibama ao projeto. A orientação é que a Petrobras faça novos estudos e tente convencer os técnicos do Ibama da viabilidade ambiental do projeto.

Já o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, disse que o governo acredita ser possível combinar o desenvolvimento econômico com proteção ambiental. Ele falou depois de se reunir com o presidente Lula e outros ministros no Palácio da Alvorada. Após o encontro, Padilha afirmou que o presidente deverá nos próximos dias saber o resultado da reunião entre os ministérios do Meio Ambiente e de Minas e Energia:

— Esse é um tema técnico. A condução fundamental tem a ver como a gente combina a necessidade de desenvolvimento econômico, da exploração de riquezas naturais importantes, com a preservação ambiental. O Brasil já mostrou que é possível fazer isso.

Segundo Padilha, esse alinhamento é necessário porque o país acredita que a questão da proteção ambiental também é um ativo importante para o desenvolvimento no país, sobretudo do ponto de vista internacional:

— Acreditamos que é possível o Brasil ser um modelo de desenvolvimento econômico, da exploração de riquezas naturais e de proteção ambiental. Sempre respeitando a lei, as regras.