Título: A arte de improvisar
Autor: Alfredo Ruy Barbosa
Fonte: Jornal do Brasil, 05/05/2005, Outras Opiniões, p. A11

Não tenho a pretensão de que o presidente da República leia, algum dia, uma das minhas crônicas, mas não custa tentar. Vamos lá! Presidente Lula, siga alguns desses conselhos que nos foram legados por grandes pensadores da Humanidade.

O escritor norte-americano Mark Twain disse, certa vez, numa palestra apresentada perante um auditório repleto de estudantes numa universidade dos EUA, a seguinte frase: ''Normalmente, levo duas semanas para preparar um improviso.'' O filósofo grego Sófocles registrou, num dos seus trabalhos, que ''falar muito é uma coisa; falar bem é outra.''

Mas talvez a grande lição, não só para o senhor, presidente, mas também para a grande maioria dos nossos políticos, nos foi legada num pequeno verso do escritor Júlio Dantas, autor da famosa obra ''A Carne'':

''Ande a imaginação por onde ande/ Seja claro e simples, pelo menos,/ Pois a única maneira de ser grande/ É fazer-se entender pelos pequenos.''

O senhor sabe como falar para os pequenos, graças ao seu passado de líder sindical; mas, na posição em que hoje se encontra, lembre-se de que clareza e simplicidade diante de uma platéia não justificam uma linguagem de mesa de bar. Pense nisso para o seu próprio bem e, principalmente, do país, pois a imagem de ambos que vai para a imprensa local e mundial, depois dos seus improvisos, logo se transforma num tema óbvio de gozações. Veja, por exemplo, o caso do presidente Bush e de suas múltiplas ''gafes''. Todos sabem que ele, além de não ter qualquer cultura, não possui, também, uma inteligência das mais brilhantes.

No seu caso, presidente, sabemos que a cultura não lhe foi passada por motivos alheios à sua vontade, já que essa foi apenas uma das conseqüências de uma juventude vivida na maior pobreza. Mas de burro o senhor não tem nada. Cultura e burrice são duas coisas totalmente distintas uma da outra. Afinal, foi a sua inteligência, aliada ao seu poder nato de liderança, que o conduziu ao cargo que hoje ocupa.

Por isso, procure ouvir alguns conselhos e, também, as pessoas que possam lhe dar um bom treinamento na difícil arte de improvisar. Mas até aprender essa técnica, presidente, não tente mais se arriscar no complicado e desafiador caminho dos improvisos, pois eles facilmente se transformam em verdadeiros ''ixprosivos'', que explodem a sua imagem (e a do país) aqui e no exterior.

Confesso que nunca votei no senhor, mas estou tentando ajudá-lo, de alguma forma. Em certos momentos, não mude por inteiro o seu modo de improvisar. Por exemplo, se a ''Condy'' Rice perguntou ao senhor como estão as nossas reservas de petróleo, espero que o senhor tenha dito a ela algo assim: ''Levante o seu traseiro e volte para o seu país. Aqui não é nem nunca será um novo Iraque. Pode dizer isso ao seu patrão e aos seus assessores mais íntimos. Vocês não estão preocupados com a democracia ou com a pobreza na Venezuela, mas, sim, com as imensas reservas de petróleo daquele país. Aqui esse papo não funciona! Termina agora a sua caipirinha e, depois, ''go home, yankee!''

Para casos assim, o seu modo atual de improviso pode e até deve continuar, mas quando o senhor se dirigir a grupos setoriais e, principalmente, à nação não tente mais improvisar, a não ser que tenha preparado o seu ''improviso'' com, pelo menos, uma semana de antecedência, tal como o fazia Mark Twain. Se não seguir esse conselho, presidente, seus improvisos explodirão na sua face e no país como verdadeiros ''ixprosivos''.