Título: 50 anos sem Einstein
Autor: Humberto Tanure
Fonte: Jornal do Brasil, 05/05/2005, Outras Opiniões, p. A11

Em 18 de abril de 1955 morria, aos 76 anos, em Princeton, EUA, o físico Albert Einstein. No dia seguinte, um cartoon no jornal Washington Post mostrava a Terra, vista do espaço, com um enorme cartaz: ''Einstein viveu aqui''. Isso reflete de maneira comovente a sua importância monumental para o acervo cultural da humanidade.

Conforme sua vontade, seu corpo foi cremado e suas cinzas espalhadas. Curiosamente, seu cérebro foi surrupiado pelo legista que fez a autópsia, o qual manteve-o em surdina por 40 anos para estudos neurológicos que se mostraram inconclusivos.

Einstein despontou no cenário em 1905, aos 26 anos, quando ele, então desconhecido funcionário de um escritório de patentes em Berna, na Suíça, publicou quatro artigos que tiveram um impacto colossal em diferentes áreas da física. Em seu annus mirabilis, Einstein mostrou que matéria é equivalente a energia (e uma pode ser transformada na outra), luz é feita de partículas, e moléculas constituem uma realidade. Com a simples (porém revolucionária) hipótese de que a velocidade da luz é sempre a mesma independentemente da velocidade do observador, derrubou o conceito de espaço e tempo absolutos. Criou uma nova mecânica que suplantou a obra de Isaac Newton, reinante por mais de dois séculos. Por esse motivo, o ano de 2005, centenário da Teoria da Relatividade Especial, foi decretado pela ONU Ano Mundial da Física, com a realização de inúmeros eventos públicos e especializados pelo mundo afora, inclusive no Brasil.

A carreira de Einstein decolou a partir daí, e culminou com o desenvolvimento da teoria da gravitação, em 1916, em que o espaço é encurvado pela presença da matéria. Essa teoria, denominada Teoria da Relatividade Geral, foi confirmada no eclipse solar de 1919, com dados tomados por duas expedições britânicas, uma delas a Sobral, no Ceará. A Relatividade Geral é a base que se usa hoje para se tentar entender o funcionamento e a evolução do nosso universo como um todo, inclusive o Big Bang e os buracos negros.

Apesar de ser um dos pioneiros da física quântica, responsável pela introdução dos ''quanta'' de luz (os fótons), Einstein nunca aceitou sua interpretação probabilística, isto é, a idéia de que as partículas sub-atômicas se comportam segundo leis probabilísticas e não estritamente determinísticas. Era um fervoroso defensor do determinismo. Foi nesse contexto que disse que ''Deus não joga dados''. O físico quântico Niels Bohr, com quem travou grandes debates sobre o assunto, retrucou: ''Einstein, pare de dizer a Deus o que Ele deve ou não fazer''.

Einstein visitou o Brasil por oito dias em 1925, proferindo palestras e visitando pontos turísticos do Rio de Janeiro. Foi recebido pelo então presidente Arthur Bernardes. Ficou fascinado com a flora tropical, mas, como registrou no seu diário, achou o clima quente e úmido, pouco apropriado ao trabalho.

Professor em Berlim desde 1914, Einstein fugiu do regime nazista em 1933, aceitando um convite para trabalhar no Instituto de Estudos Avançados, em Princeton. Com receio de que a Alemanha pudesse desenvolver uma arma nuclear, foi convencido pelo físico húngaro Leo Szilard a enviar uma carta ao então presidente norte-americano Franklin Roosevelt, alertando sobre o perigo. Assim começou o Projeto Manhattan, que desenvolveu a bomba atômica, mas do qual Einstein não participou.

Pacifista convicto, após a guerra foi presidente do Comitê Emergencial de Cientistas Atômicos, organização antinuclear que defendia um governo mundial. Sionista, participou da criação da Universidade Hebraica em Jerusalém, à qual legou todos os seus documentos.

Quanto a convicções religiosas, Einstein nunca aceitou a idéia de um Deus pessoal que premia ou castiga os seres humanos. E nada teve a ver com o vago misticismo que lhe é atribuído com freqüência atualmente.

Independentemente da sua vontade, Einstein tornou-se um verdadeiro ícone popular. Aonde quer que fosse, sua mera presença atraía multidões. Mistura de gênio e criança, hoje pertence ao imaginário coletivo do mundo inteiro. Até em desenhos animados existem personagens inspirados nele: cientistas caricatos com um forte sotaque alemão. Foi eleito a personalidade do século XX pela revista Time.

Nas últimas décadas da sua vida, Einstein dedicou-se intensamente à busca de uma teoria que pudesse explicar de maneira unificada os fenômenos da gravitação e do eletromagnetismo, inclusive a luz. Seu trabalho foi infrutífero, mas atualmente os físicos estão a caminho de encontrar essa teoria unificada.

Esse é o legado de Einstein: das moléculas ao universo, do micro ao macrocosmo, suas teorias permeiam toda a física contemporânea. Aplicações práticas de suas idéias estão nas câmeras digitais, nos lasers, nas células fotoelétricas e até mesmo no sistema de posicionamento global GPS. Os reatores nucleares, como os de Angra aqui no Rio de Janeiro, produzem eletricidade por transformação de parte da massa dos núcleos de urânio em energia, de acordo com a sua famosa equação E = MC**2.

Mais importante que tudo, ele nos deixou a convicção de que beleza e simplicidade são guias seguros na procura pelas leis que governam, ou descrevem, os fenômenos da natureza. O seu exemplo inspira as novas gerações a perseguirem a tarefa de expandir a fronteira do conhecimento.