Título: Conforto e estética em conflito
Autor: Melissa Medeiros
Fonte: Jornal do Brasil, 09/05/2005, Brasília, p. D3

Para reduzir o calor dos apartamentos, moradores recorrem a soluções que interferem na beleza arquitetônica dos edifícios

Para diminuir a luminosidade e o calor causados pela incidência direta do sol nos apartamentos, moradores do Plano Piloto incrementam suas janelas com toldo, película e papel alumínio; fecham suas varandas com vidros e colocam ar-condicionado. As mudanças constatadas nos prédios das asas Norte e Sul inspiraram a tese de mestrado da arquiteta Darja Kos Braga intitulada Arquitetura residencial das superquadras do Plano Piloto de Brasília: aspectos de conforto térmico.

Segundo Darja, o ponto de partida seria uma pesquisa quantitativa para verificar a dimensão do objeto de estudo. Mas ela não encontrou dados estatísticos, nem legislação relativa ao assunto no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Com ajuda de uma estagiária, visitou 1.392 edifícios das quadras 100, 200, 300 e 400 documentando quais tipos de acessórios os moradores usam para diminuir o calor.

O levantamento mostra que 68% dos prédios têm películas nos vidros, 56% dos edifícios de seis pavimentos e 11% dos de três andares têm ar-condicionado. Os toldos estão em 33% dos prédios de seis andares e 26% dos de três. Em 5% dos edifícios, ao menos dois apartamentos recorrem ao papel alumínio para forrar as janelas e 90% as varandas são fechadas com blindex.

A comerciante Heloísa Sandes mora na 108 Norte desde que chegou a Brasília em 2001 e conta que imaginava que uma cidade tombada como patrimônio histórico, seria mais bonita e não seriam permitidas essas mudanças na estética dos prédios.

- Achei que os próprios moradores tinham consciência e procuravam conservar a beleza da cidade. É muito feio, para que vem de fora, ver esses toldos coloridos nos prédios históricos - afirma Heloísa.

Por outro lado, o vendedor José de Souza concorda com a colocação de toldos, películas, papéis alumínio e blindex. Ele considera que o conforto é mais importante que a beleza do prédios.

- A pessoa tem de morar em um lugar que se sinta bem. Não adianta está em lugar bonito e morrendo de calor - diz o vendedor.

A arquiteta explica que dá para manter o conforto térmico e manter a estética. De acordo com ela, a maioria dos objetos que estão sendo usados para proteger do calor não fazem o efeito desejado. A colocação de blidex nas varandas, por exemplo, impede a circulação do ar e forma uma estufa, passando o calor para dentro do apartamento. As películas cinzas ou pretas impedem a passagem de luz, pois absorvem mais calor que o vidro transparente e deixam o ambiente interno ainda mais quente. Papel alumínio até reduz um pouco o calor porque reflete os raios solares, mas é uma das opções de proteção que mais alteram as fachadas dos edifícios. A pesquisadora diz que o toldo é a pior escolha para quem quer evitar o calor e também se preocupa com a estética de Brasília.

- Os toldos formam uma poluição visual que incomoda quem olha os prédios. Mesmo alguns prédios padronizando tamanhos, formatos e cores, percebe-se uma desarmonia e alteração no projeto inicial de arquitetura. Além disso, eles só filtram a luz e ainda formam uma corrente de ar quente que vai para dentro do apartamento - explica a arquiteta.

Darja sugere que para manter o conforto térmico sem afetar a harmonia visual de Brasília, as pessoas devem procurar apartamentos que tenham sido bem planejados para conforto térmico e luminoso. Se forem colocar película, escolham a refletiva e padronizem um cor única para todo o prédio ou quadra. Em caso de ar-condicionado, contratem profissionais que instalem com o mínimo de interferência externa.