Título: Cofre fechado atrapalha votações
Autor: Sérgio Pardellas
Fonte: Jornal do Brasil, 18/10/2004, Brasil, p. A-3

Levantamento mostra que Planalto pagou apenas 3% das emendas dos parlamentares previstas no Orçamento

O governo federal tem motivos de sobra para se preocupar com a votação de projetos importantes no Congresso depois das eleições municipais. As queixas e reclamações de descaso dos parlamentares da base governista pela demora na liberação de emendas ao Orçamento 2004 encontram razões nos números. Levantamento feito pelo Jornal do Brasil junto ao Sistema de Acompanhamento Financeiro do Governo Federal (Siafi) revelou que o governo federal pagou apenas 3% das emendas individuais dos parlamentares previstas no Orçamento Geral da União 2004. Embora já estejam empenhados 50,96 % dos recursos, dos R$ 890 milhões autorizados, apenas R$ 26,7 milhões foram efetivamente pagos. E a bancada governista, é claro, que se declara em dia com as votações favoráveis ao Palácio do Planalto no painel eletrônico, também entra na leva dos parlamentares cujas emendas ainda não foram ou foram parcialmente liberadas. Para se ter uma dimensão da insatisfação da base, 271 (77,4%) dos cerca de 350 parlamentares da bancada do governo não receberam nem um centavo sequer. Os dados foram atualizados pelo gabinete do deputado distrital Augusto Carvalho (PPS-DF) até o dia 1º de outubro.

Entre os deputados que não viram nenhuma de suas emendas pagas está o líder do PL na Câmara, Sandro Mabel (GO), os deputados Nélson Marquezelli (PTB-SP), José Mentor (PT-SP), Jovair Arantes (PTB-GO) e os presidente nacionais do PL, Valdemar Costa Neto, e do PMDB, Michel Temer (SP). Ex-aliado de primeira hora, o senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA), que na última semana se insurgiu contra o governo por conta da disputa eleitoral em Salvador (BA), também não foi agraciado com nenhuma emenda. O rosário de reclamações será levado pelos líderes partidários na próxima terça-feira ao presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), e ao ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo.

Um dos mais contrariados é o líder do PMDB na Câmara, deputado José Borba (PR). O parlamentar, no entanto, fala pelos seus liderados. Porque, ao contrário da maioria dos peemedebistas, conseguiu a proeza de liberar R$ 119,8 mil de suas emendas orçadas em R$ 1,4 milhão.

- Os dados são alarmantes. É preciso que a base seja mais bem-atendida. Até porque temos que trabalhar muito ainda esse ano. Precisamos costurar um entendimento para liberação destes recursos - disse Borba, segundo quem já haveria, no entanto, uma sinalização de que as emendas seriam pagas assim que terminar o segundo turno das eleições municipais.

Nem todos os parlamentares, contudo, têm direito de cobrar a fatura no balcão de liberação de emendas do governo. Na lista dos felizardos estão, coincidência ou não, deputados, senadores e partidos da bancada de sustentação ao governo Lula no Congresso. Os dois mais favorecidos conseguiram liberar mais de R$ 1 milhão em emendas individuais. É o caso do deputado campeão Luciano Leitoa (PSB -MA), contemplado com R$ 1,17 milhão, e do líder do PP na Câmara, Pedro Henry (PP-MT) - R$ 1,10 milhão. Os dois tiveram duas emendas liberadas. Leitoa para modernização e reformas de campos de futebol e adequação da avenida Tiuba em Timon (MA), seu reduto eleitoral, e Henry para a implantação de núcleos de esporte recreativo e lazer e apoio ao hospital regional cárceres em Mato Grosso.

O presidente nacional do PTB, deputado Roberto Jefferson (RJ), que recebeu em jantar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na quinta-feira, figura em 30º lugar na lista de parlamentares mais agraciados. Recebeu R$ 299,9 mil em emendas. Também do PTB, o líder do governo no Congresso, senador Fernando Bezerra, ficou em 15º, com R$ 435 mil. O seu partido, no entanto, apesar dos apelos por mais atenção, é o primeiro depois do PT em valores pagos em emendas parlamentares. Conseguiu R$ 4,3 milhões. Vem seguido pelo PMDB, (R$ 3, 7 milhões), PP (R$ 3,1 milhões) e PSB (R$ 2,2 milhões). O PDT, hoje na oposição, não recebeu nenhum centavo.

Procurada na noite de sexta-feira, a assessoria de imprensa do ministro Aldo Rebelo não quis comentar o assunto, alegando falta de tempo hábil para se debruçar sobre os dados. Para chegar aos números, o JB usou o seguinte critério: foram selecionadas emendas individuais em que o valor autorizado fosse menor ou igual ao valor da emenda, com o objetivo de excluir as emendas aglutinadas de vários parlamentares e cuja programação continha valor original no PL. Estão excluídas as emendas de bancada ou mesmo as individuais quando não foi possível identificar-se claramente o autor.