Título: Crescer para atrair capital
Autor: Rafael Rosas
Fonte: Jornal do Brasil, 18/10/2004, Economia & Negócios, p. A-17
Especialistas relativizam piora do Brasil em relatório de competitividade e defendem regras claras nos mercados
A divulgação, na última quarta-feira, do Índice de Competitividade Global, elaborado pelo Fórum Econômico Mundial, repercutiu negativamente no país, já que o Brasil caiu da 54ª para a 57ª posição entre os 104 países listados. A baixa competitividade - o Brasil ficou atrás de nações como Chile, México, Costa Rica e Marrocos - acendeu a luz amarela em relação à entrada de investimentos estrangeiros diretos no país. De acordo com dados do Banco Central, o Brasil recebeu US$ 12,9 bilhões em investimentos estrangeiros diretos no ano passado, depois de aportes de US$ 18,7 bi em 2002 e de US$ 21 bi em 2001. A projeção da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet) para 2004 é de ingressos de US$ 15 bi.
Um dia antes da divulgação dos dados coletados pelo fórum, a consultoria americana AT Kearney havia listado o Brasil como o 17º destino mais atraente para o investimento estrangeiro, depois da nona colocação obtida em 2003.
A piora do Brasil em análises recentes, no entanto, é relativizada por Antônio Corrêa de Lacerda, presidente da Sobeet. Para ele, relatórios como o do Fórum Econômico Mundial se baseiam em opiniões de executivos que muitas vezes desconhecem os países analisados.
- Acontecem desvios provocados por desconhecimento, questões ideológicas e critérios adotados. O quadro não é tão grave. Li que o Brasil estava atrás de Botsuana. Quem é que realmente acredita nisso? - argumenta o economista, autor do livro Globalização e Investimento Estrangeiro no Brasil.
Lia Valls Pereira, economista do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), vai além. Para ela, relatórios são muitas vezes superestimados.
- O investidor não dá muita bola para isso. Fundamental é a perspectiva de lucro. As estratégias das empresas variam caso a caso e esses rankings não significam que o país esteja mal visto no exterior - afirma.
Lia, entretanto, bate na tecla de que os principais atrativos permanentes para o capital produtivo estrangeiro são o crescimento sustentável da economia e a estabilidade das regras.
- Hoje, a China e a Índia vivem uma época de crescimento dos investimentos estrangeiros. As economias destes países avançam a taxas altas há algum tempo. Não adianta nada crescer 6% por dois anos e 2% depois, já que o investidor prefere um ambiente mais estável - defende.
Lacerda - que alerta para a diminuição global do investimento estrangeiro e para o grande número de fusões e aquisições computadas nas contas de entrada de capital produtivo - faz coro com a economista do Ibre sobre a necessidade de crescimento e critica a política monetária ortodoxa adotada pela equipe econômica do governo.
- Falta ousadia. A política monetária é conservadora e inibe o investimento estrangeiro, pois limita muito a capacidade de crescimento. A alta taxa de juros aumenta a relação dívida-PIB. Precisamos repensar a estrutura desta política - acusa, acrescentando que há uma preocupação exagerada com a inflação. - A meta de inflação é muito pretensiosa. Não há país que tenha montado regime de metas com os resultados que nós obtivemos.
Lacerda é enfático ao afirmar que uma política industrial que gere crescimento é essencial para aumentar não apenas o volume de investimento, mas também a qualidade do capital que entra no país.
- Os investidores têm que aumentar a capacidade produtiva, gerar valor agregado, gerar exportação e substituição de importações.
Mas as críticas à política monetária não são unânimes. Para Armando Castelar Pinheiro, economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a atual política monetária é essencial para permitir o crescimento sustentado de longo prazo. De acordo com ele, os maiores problemas estão na questão dos sistemas regulatórios.
- Ainda há muitas quebras de contrato, pirataria, desrespeito ao direito de propriedade e ativismo judicial. O governo tem dado respostas lentas e de direção incerta. Reformas no judiciário, na previdência, combate à corrupção e à burocracia são essenciais para atrair investimento na produção.
Unânimes mesmo são as observações sobre a necessidade de melhor infra-estrutura e logística para alavancar investimentos no país. As péssimas condições das estradas e a falta de investimentos nos portos para melhorar o escoamento da produção são lembrados com ênfase.
- O país tem problemas sérios de infra-estrutura, o que encarece muito a vinda do investidor estrangeiro para o Brasil. A aplicação de recursos em estradas e portos é importante para atrair mais dinheiro e diminuir o custo da produção - reforça o economista do Ipea.