Título: Putin exalta sacrifício soviético
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 10/05/2005, Internacional, p. A7

Ex-repúblicas boicotam evento, do qual participaram 57 líderes mundiais

MOSCOU - O presidente russo, Vladimir Putin, acompanhado de dezenas de chefes de Estado e de governo, comemorou ontem o 60º aniversário da derrota nazista com uma parada militar na Praça Vermelha, impregnada de símbolos soviéticos. Em um cenário há pouco tempo impensável para um presidente americano, George Bush sentou em um lugar de honra, ao lado de Putin, e saudou a vitória militar de quem um dia foi o maior inimigo dos Estados Unidos.

Em frente à tumba de Lenin, o presidente russo, ao contrário do que esperavam alguns líderes, não demonstrou qualquer pesar pela dominação soviética da Europa do Leste e Central que teve início após o fim da II Guerra Mundial. Recentemente, os governantes da Polônia e de outros países Bálticos afirmaram que a derrota do ditador nazista Adolph Hitler não resultou em libertação, mas em supressão sob uma nova ideologia. De fato, quase todos os chefes de Estado da Europa do Leste se recusaram a comparecer às comemorações.

- Um país deve chegar a um acordo com seu passado e [Moscou]deveria expressar pesar pelo que aconteceu sob o regime soviético - disse o presidente da Letônia, Vaira Vike-Freiberga, único líder báltico a participar.

Entre os 57 dignatários estavam também líderes de países derrotados, como o chanceler alemão Gerhard Schröder, o premier italiano Silvio Berlusconi e o premier japonês Junichiro Koizumi. Já Tony Blair foi substituído pelo vice, John Prescott.

Em discurso, Putin homenageou veteranos de todas as nações aliadas, mas deu ênfase aos sacrifícios feitos pela URSS, que perdeu 27 milhões de cidadãos durante o conflito. Ele ainda condecorou o antigo homem forte da Polônia comunista, o general Wojciech Jaruzelski, autor em 1981 de ações contra o sindicato independente Solidariedade.

- Os eventos mais cruéis e decisivos tiveram lugar em território soviético - afirmou o líder russo, descrevendo o dia 9 de maio como ''o dia da vitória do bem contra o mal''. - Saúdo a todos os veteranos da Grande Guerra Patriótica [como é chamada a II Guerra Mundial no país].

Cerca de 2.500 veteranos participaram do desfile na Praça Vermelha e milhares de outros, sem condições de marchar, foram levados em carros. A cerimônia começou com quatro soldados vestidos em uniformes verdes e dourados, carregando bandeiras vermelhas com a imagem da foice e do martelo.

Bush não demonstrou desconforto por participar das homenagens em meio a símbolos soviéticos. Na verdade, os dois presidentes fizeram questão de aparentar coleguismo e respeito, apesar da tensão entre Moscou e Washington em relação à democracia na Rússia e ao itinerário da viagem de Bush na região. Ontem, o presidente americano seguiu para a Geórgia, país cujo governo foi um dos que boicotaram o evento. Antes, Bush se reuniu com líderes de organizações civis, alguns críticos ferrenhos do governo de Moscou.

A intenção de Putin de tentar usar o aniversário do Dia da Vitória - celebrado na antiga URSS, e agora na Rússia, um dia depois do término formal das hostilidades - para reunir a população russa, não foi bem-sucedida. Em Moscou, as comemorações geraram protestos. Centenas de manifestantes enfrentaram policiais perto da estação de trem de Belaruskaya, a poucos quilômetros da Praça Vermelha. Pelo menos 50 ativistas foram detidos, segundo uma emissora de rádio local.

- Putin é um fascista - gritou um manifestante de meia-idade, citado pelo jornal The New York Times.