Título: Anulado julgamento de ex-militares
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Fonte: Jornal do Brasil, 11/05/2005, Internacional, p. A13

Grupo fora declarado culpado de massacre em 1994. Aliados de Aristide chamam decisão de ''partidária''

PORTO PRÍNCIPE - Trinta e oito ex-líderes militares haitianos, que em 2000 foram declarados culpados de assassinato e tortura, tiveram seus julgamentos anulados. Eles eram acusados de assassinato em massa durante um ataque a aliados do ex-presidente Jean Bertrand Aristide em Raboteau, em 1994. Para o premier interino, Gerard Latortue, a decisão dos juízes da Corte de Cassação mostra a independência do Judiciário. Mas políticos pró-Aristide criticam a medida, classificando-a como ''partidária''.

Segundo a Corte, as sentenças foram eliminadas porque testemunharam como vítimas no Tribunal de Gonaïves ''pessoas que não foram atacadas e que, portanto, não podiam ser objeto de qualquer recurso''.

Latortue, que substituiu Aristide, defendeu que a decisão mostra a separação entre líderes políticos e juízes.

- Lutamos toda a vida contra a interferência do Executivo nos assuntos judiciais. - afirmou. - Nenhuma ordem ou instrução foi dada. Se a sentença foi anulada, os juízes assim decidiram independentemente.

Mas para Gerard Gilles, ex-senador do partido de Aristide, o Lavalas, a medida prova justamente o contrário:

- Ela mostra que o atual governo é partidário, vingativo e que não é sério com a Justiça.

Segundo Brian Concannon, o advogado americano que ajudou a preparar o caso contra os ex-militares - que faziam parte do grupo paramilitar Frente para o Desenvolvimento e Progresso do Haiti - , a anulação das sentenças é um ''completo retrocesso'' no longo esforço de estabelecer justiça no país.

- Esse julgamento foi um marco na luta contra a impunidade - lembra.

Se confirmada pelo Supremo Tribunal, a decisão dos juízes pode significar a iminente libertação, em uma semana, de algumas das mais polêmicas figuras haitianas. Uma delas é Louis-Jodel Chamblain, um dos líderes do levante que no ano passado culminou com a renúncia de Aristide.

Em meio à crise, a ONG Rede Nacional de Defesa dos Direitos Humanos pediu que o governo interino, partidários do Lavalas e a missão de estabilização da ONU ''deixem a Justiça tratar dos documentos criminais com independência''.

Pelo menos 15 pessoas morreram no brutal ataque em Raboteau, cidade litorânea a noroeste de Gonaïves. O alvo eram aliados de Aristide, que havia sido democraticamente eleito em 1991, mas retirado do poder. Em 1994, ele voltou à presidência, com o apoio dos Estados Unidos. No ano passado, foi novamente destituído.

Testemunhas contam que durante o massacre de Raboteau, soldados e mercenários invadiram dezenas de casas, batendo nas pessoas e detendo-as. Quem tentasse fugir era alvejado. É quase certo que o número de vítimas seja maior do que 15, pois os ex-líderes militares jogaram vários corpos no mar, ameaçando as famílias para que não tentassem resgatá-los. Um ano mais tarde, o Exército foi desmobilizado, por ordem presidencial.