Título: Roubos a serviço da extorsão
Autor: Gustavo de Almeida e Waleska Borges
Fonte: Jornal do Brasil, 14/05/2005, Rio, p. A13

Celulares roubados e furtos de transeuntes alimentam indústria das ameaças telefônicas que aterrorizam o Rio

Um crime a serviço do outro. O terror via telefone, que consiste em pedir dinheiro ou cartões de celulares sob ameaça de morte, ganhou uma variante sinistra, segundo a qual os aparelhos roubados - principalmente em áreas como o Centro - têm a agenda eletrônica vasculhada e seus números usados para as ameaças. Além do roubo de celular servir à extorsão, também os batedores de carteira indiretamente perpetuam este tipo de crime. A recomendação dos especialistas é expressa: os donos de celulares não devem anotar o números de suas residências ou de parentes com palavras que os identifiquem facilmente, como ''casa'', ''pai'' ou ''mãe''. - Este é um procedimento básico. Deve-se evitar andar com este tipo de informação, evitar que possa ser obtida pelos criminosos facilmente - diz a inspetora de Polícia Civil Marina Maggessi, que acredita ser a extorsão por telefone um crime que passa ao longe da cúpula do crime organizado.

O delegado Marcus Drucker, titular da 1ªDP (Praça Mauá), responsável pela área do Centro, confirma os roubos de aparelhos celulares. São pelo menos três prisões por semana na área - casos de furtos, segundo Drucker, são mais freqüentes do que assaltos, pois acontecem por descuido das vítimas:

- Os celulares roubados são revendidos em áreas carentes, como a Favela Nova Holanda, em Bonsucesso, de onde procedem alguns dos ladrões.

Quanto à falta de organização, a opinião de Marina Maggessi é corroborada pela de um agente da Setor de Inteligência do Serviço Penitenciário (Sispen), órgão ligado à Secretaria de Administração Penitenciária (Seap). O Presídio Hélio Gomes, do Complexo da Frei Caneca, no Estácio, é um reduto de golpistas que extorquem pelo telefone. A unidade abriga presos que estão ''no seguro'' - aqueles que não pertencem a facções.

- Em alguns casos, os golpistas têm usado de centrais em linhas telefônicas abertas com documentos roubados por batedores de carteiras. Eles vendem estes documentos por preços que vão de 15 a R$ 30. Com o número do CPF, da identidade e o endereço da vítima, os golpistas abrem as centrais - explica o investigador, que não pode se identificar.

De acordo com o Sispen, para aplicar os golpes, os presos ligam a cobrar para a Central, que transfere a ligação para a nova vítima. Com esta artimanha, o número do celular do preso não aparece nos identificadores de telefones. Este ano, o Sispen estourou uma central telefônica no Morro da Providência, no Centro. No local, foram encontrados diversos documentos roubados. Sete funcionários de empresas que prestam serviços à Telemar foram presos por envolvimento com o golpe.

- A transferência de ligação impede que a polícia descubra o preso que está aplicando o golpe. Chegamos até a central, mas, geralmente, o número do telefone pertence a um laranja - explica o investigador.

Além de presos condenados por estelionato que ameaçam, principalmente, empresas, escolas e farmácias, segundo o investigador, também estão envolvidos nos golpes pessoas ligadas aos detentos. Um dos casos ocorreu na Rodovia Presidente Dutra. Um frentista de posto de gasolina anotava a placa, cor e nomes de motoristas de caminhões. Do local, ele passava as informações para uma central telefônica, no Morro dos Marítimos, em Niterói, que transferia as ligações para presos do Hélio Gomes fazerem ameaças.

Segundo levantamentos do Sispen, as ameaças por telefone tem crescido no interior e em cidades de fora do Estado, entre elas, São Paulo, Rio Grande do Sul e Paraná. Investigadores do Sispen vêm traçando o perfil dos golpistas e 100 detentos já foram identificados.

- O estudo do perfil dos golpistas vai permitir que a Secretaria de Administração Penitenciária elabore ações para inibir o crime. Há a possibilidade de se abrir uma ala numa unidade prisional voltada para estelionatários - adiantou.

As investigações do Sispen revelam ainda que os presos do Presídio Plácido de Sá Carvalho, em Bangu, também participam do golpe. Eles pertenceriam à facção Terceiro Comando.