Título: Regulação aérea sem débito
Autor: Cristiane Crelier, Samantha Lima e Julia Ribeiro
Fonte: Jornal do Brasil, 16/05/2005, Economia & Negócios, p. A19

Encontro de contas é 'abatido' de projeto de agência

O líder do PT no Senado, Delcidio Amaral (MS), retirará do projeto que cria a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) regras incluídas pelos deputados para facilitar a recuperação de companhias aéreas em dificuldade financeira. No relatório que apresentará à Casa Civil e ao Ministério da Defesa nesta semana e será submetido à Comissão de Infra-estrutura do Senado até o final do mês, Delcidio rejeitará, por exemplo, a autorização à União para que promova um encontro de contas com as companhias aéreas.

A idéia do relator é que o projeto trate apenas da organização e das funções da Anac, entre elas a homologação dos preços de passagens sugeridos pelas empresas do setor.

- Como o governo decidiu por uma solução de mercado, não vejo necessidade de colocar no projeto penduricalhos para resolver a situação de companhias aéreas - afirma.

O encontro de contas é defendido, entre outros, pela coordenadora do Grupo Parlamentar Misto em Defesa da Varig, deputada federal Yeda Crusius (PSDB-RS). Pelo mecanismo, as companhias abateriam de suas dívidas com a União indenizações a que têm direito conforme decisão judicial. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) assegurou à Varig o direito de receber R$ 2,5 bilhões do Tesouro Nacional devido a perdas com o congelamento de tarifas entre 1985 e 1992. Vasp e TAM têm ações semelhantes à espera de julgamento no STJ no valor de, respectivamente, R$ 3 bilhões e R$ 158 milhões, segundo a Advocacia-Geral da União.

As empresas consideram os números superestimados. No final de abril, o vice-presidente da República e ministro da Defesa, José Alencar, disse que as faturas serão pagas apenas depois de uma decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal (STF). Como o STF já decidiu em caso semelhante a favor da Transbrasil, que recebeu R$ 1 bilhão no final da década passada, a declaração de Alencar deixa claro que não há vontade política para o encontro de contas. De acordo com Delcidio, outros dois ''penduricalhos'' serão derrubados.

Um deles é a renovação automática de todas as concessões de aviação civil até 2010 e a suspensão por cinco anos do poder do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para julgar fusões e aquisições no setor aéreo. Este segundo ponto facilitaria, em tese, a compra da Varig por um concorrente brasileiro, ao eliminar um dos entraves legais. Segundo o parlamentar, a Anac terá de homologar os preços de passagens definidos pelas companhias aéreas.

- Era muito bonito o discurso liberal segundo o qual o mercado acomoda e ajusta tudo, mas ele deu nisso aí - afirma Delcidio, referindo-se à situação financeira das empresas.

A Anac substituirá o Departamento de Aviação Civil (DAC), permanecendo o vínculo ao Ministério da Defesa. Pela proposta do relator, todos os funcionários da agência serão civis em um prazo de cinco anos. Delcidio reconhece que o Ministério da Defesa não vê com bons olhos a proposta, até porque o DAC é comandado hoje pelos militares.

- Os militares continuarão com o controle do tráfego aéreo - ressalva o parlamentar. Ele acrescenta que ainda não há definição sobre o chamado direito real de uso das instalações aeroportuárias, como hangares e balcões de check-in. Hoje, a Infraero concede às empresas o direito de explorar tais espaços. Uma das propostas prevê o arrendamento, o que permitiria ás empresas considerar os hangares como ativos, acarretando aumento de patrimônio.