Título: Planalto em crise no Congresso. De novo
Autor: Daniel Pereira, Nelson Carlos de Souza e Paulo de
Fonte: Jornal do Brasil, 13/05/2005, País, p. A3

Renan diz que decisão contra reajuste de servidores do Legislativo é ''ato de hostilidade''. Severino promete plano de cargos e salários

A decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de vetar o aumento de 15% no salário dos servidores do Senado, da Câmara e do Tribunal de Contas da União (TCU) criou novo conflito entre Executivo e Legislativo, corroendo ainda mais a relação entre os dois poderes. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), normalmente calmo com as decisões do governo, cogita a possibilidade de colocar em votação a derrubada do veto. O presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), mostrando mais compreensão, disse achar quase impossível que o Congresso derrube a decisão presidencial.

Calheiros classificou a decisão de Lula como um ''ato de hostilidade do Executivo contra a Legislativo''. Lembrou que o aumento foi fruto de acordo firmado em outubro de 2004 entre os ministros da Fazenda, Antonio Palocci, e da Casa Civil, José Dirceu, com os presidentes da Câmara e do Senado na época, João Paulo Cunha e José Sarney, em conseqüência do reajuste de 15% a 37% que o Executivo concedera a várias categorias.

No Rio, durante participação no XVII Fórum Nacional, no BNDES, Severino e Renan foram bastante incisivos. O presidente do Senado afirmou que o governo ''tem uma capacidade incrível de criar crises, sobretudo na relação entre os Poderes''. Tradicionalmente crítico em relação ao Planalto, Severino foi um pouco mais cauteloso. Afirmou que seria difícil derrubar a decisão, mas prometeu, entretanto, garantir o aumento para os servidores, colocando em votação o Plano de Cargos e Salários, que deseja implantar na Câmara.

Pela manhã, o veto foi discutido de forma acalorada em reunião entre os principais líderes do Senado. Renan lembrou que o reajuste foi acertado em outubro por seu antecessor, José Sarney, com o presidente Lula e que a medida foi paga em novembro, dezembro e no 13º salário. Ele também rechaçou a alegação do líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), de que a correção não está prevista no Orçamento, o que desrespeitaria a Lei de Responsabilidade.

Segundo o presidente do Senado, os gastos com os novos salários dos servidores do Senado estão na atual lei orçamentária. Custariam R$ 103 milhões a mais em 2005. Ele também desmente que não tenha feito previsões orçamentárias para bancar o reajuste.

- Não é verdade que o Senado não tem orçamento. Temos previsão e recurso em caixa para honrar a autorização. Fizemos cortes e enxugamos tudo. A gastança não mora aqui. Se existe, mora em outra Casa. O Senado não precisa suplementar nada - afirmou.

Ele insistiu na tese de que o Executivo tem o direito de descumprir o acordo fechado no ano passado, em torno do reajuste, mas advertiu:

- O Executivo tem o direito de vetar, mas o Legislativo tem o direito de votar e vai exercer esse direito em sua plenitude - afirmou.

Normalmente aliado incondicional do governo, Renan chegou a acusar o porta-voz do anúncio do veto, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, de falar ''besteiras''.

- Paulo Bernardo não sabe o que acontece, falou besteira - disse, sobre a justificativa dada para o veto: falta de previsão orçamentária.

Outros líderes avaliaram que a luta pela manutenção do reajuste pode reforçar a fama de corporativista do Congresso. A análise, entretanto, não fez diminuir a vontade de votar o fim do veto.

- Não podemos permitir que o Lula 'Severinize' o Senado - bradou o senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA).

Severino afirmou que haverá uma tentativa de derrubar o veto e convocou os funcionários a pressionar os parlamentares. Se acontecer, a votação será secreta, que é um dos grandes pesadelos do Planalto neste ano, como demonstram a eleição de Severino e a vitória de Alexandre de Moraes, candidato do PFL e do PSDB, para a vaga da Câmara no Conselho Nacional de Justiça.

O presidente da Câmara afirmou que não é problema dele, mas do Executivo, o impacto do reajuste nos cofres públicos. Segundo o Planalto, o aumento de 15% nos salários dos funcionários do Senado, Câmara e TCU custaria R$ 578 milhões a mais por ano. Além disso, abriria brecha para que o Executivo e o Judiciário reivindicassem o mesmo. A fatura total, incluindo a correção para os três poderes, chegaria a R$ 11 bilhões anuais.

Integrantes do governo reconheceram o acordo entre Sarney e Lula. O líder do PT no Senado, Delcidio Amaral, lembrou que, em 2004, apenas os servidores do Legislativo não foram contemplados por reajuste. Não foi por falta de tentativa. Um ato conjunto das mesas do Senado e da Câmara foi baixado, mas derrubado pelo Supremo Tribunal Federal. Em razão da decisão, foram apresentados os projetos de lei aprovados pelo Congresso e vetados pelo chefe do Executivo.