Título: Guerrilha leva o inferno a Bagdá
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Fonte: Jornal do Brasil, 13/05/2005, Internacional, p. A8
Rebeldes mostram poder de fogo e mantêm rotina de ataques a civis. Ontem, carro-bomba matou mais 14 em mercado
BAGDÁ - Um carro-bomba explodiu em um mercado da parte xiita da capital iraquiana ontem, matando 14 pessoas e ferindo 56. O ataque é o último na escalada de violência que já causou mais de 400 vítimas fatais e mil feridos desde a nomeação do novo governo do país, há duas semanas.
O governo iraquiano revelou que abril trouxe o maior número de ataques suicidas desde a invasão do Iraque pela Coalizão, em março de 2003. A primeira quinzena de maio mostra que a ameaça continua a crescer.
Numa cena que se torna cada vez mais familiar, cidadãos carregavam carroças com os corpos de homens e mulheres em meio ao caos. As sirenes soavam alto, enquanto chamas e fumaça saíam do mercado do distrito de Nova Bagdá. Além do sofrimento, cidadãos irados agrediram policiais e jornalistas, chegando a bater em dois fotógrafos iraquianos.
- Há famílias ainda no prédio e muitos estão feridos - gritava um médico em seu celular, enquanto um casal de idosos com ferimentos na cabeças sentava em sua ambulância.
A explosão aconteceu depois de uma série de ataques suicidas na quarta-feira que matou pelo menos 71 pessoas.
Três soldados americanos também morreram ontem em ataques com bomba no Norte e Sul de Bagdá.
Um funcionário que trabalhava no centro de operações do ministério da Defesa também foi assassinado ontem no Sudoeste de Badgá. O brigadeiro Ayad Imad Mehdi foi atingido por três guerrilheiros que bloquearam seu carro e atiraram à queima-roupa. Em outro ataque, o coronel Muhammad al-Taie, funcionário do ministério do Interior, também foi morto por guerrilheiros.
As investidas se intensificaram depois de 28 de abril, data do começo do mandato dos escolhidos na primeira eleição democrática no país. A violência levanta o receio de uma guerra civil se os políticos escolhidos não garantirem a estabilidade prometida. Os insurgentes sunitas têm aumentado os ataques a alvos xiitas nas duas últimas semanas, numa campanha que o governo iraquiano considera desenhada para aumentar a divisão entre os grupos.
As eleições de 30 de janeiro modificaram radicalmente a estrutura de poder no Iraque depois de décadas de domínio sunita pela ditadura de Saddam Hussein. Os xiitas e curdos, antes oprimidos, são os novos líderes do país, com a maioria no parlamento, e pretendem colocar os sunitas numa boa posição no governo, para aplacar a ira da guerrilha.
Como parte dessa estratégia, Saadounal-Dulaimi, um sunita exilado durante o regime de Hussein, agora ocupa o ministério da Defesa. Mas o assassinato de oficiais de segurança pela guerrilha mostra sinais de que a tática não está funcionando.
Os cidadãos que colaboram com a administração atual ou com a ocupação americana também têm sido alvo dos insurgentes. Testemunhas viram atiradores matarem dois moradores por terem vendido pães aos soldados iraquianos.
Com medo de serem assassinados ou seqüestrados, os médicos iraquianos, sobretudo os que têm consultórios privados, pediram ao governo autorização para usar armas durante o atendimento médico. Após longas negociações, o Ministério da Saúde autorizou a solicitação.
Na província rebelde de Al Anbar, próxima à fronteira com a Síria, as tropas americanas realizam a Operação Matador, para desmontar campos de insurgentes, inclusive de outros países. Cinco soldados americanos e cerca de 100 guerrilheiros já morreram desde sábado.
Além dos atentados, os guerrilheiros mantêm os seqüestros a civis estrangeiros. A libertação de Douglas Wood, capturado no final de abril, estava vinculada à retirada das tropas australianas do país até a última terça-feira. O governo se recusou a dialogar e ainda não se conhece o destino do estrangeiro, de 63 anos.
O japonês Akihiko Saito, 44 anos, foi seqüestrado no domingo, numa emboscada a um comboio de segurança. O responsável é o Exército de Ansar al-Sunna, considerado um dos grupos mais cruéis.