Título: Meirelles terá sigilo quebrado
Autor: Luiz Orlando Carneiro
Fonte: Jornal do Brasil, 13/05/2005, Economia & Negócios, p. A19
Supremo Tribunal Federal dá sinal verde para investigação do presidente do BC. Polícia Federal não será acionada
O Supremo Tribunal Federal autorizou o Ministério Público Federal a quebrar o sigilo fiscal do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e outras seis diligências requeridas pelo procurador-geral da República, Claudio Fonteles, para apurar supostos crimes de sonegação fiscal, evasão de divisas e lavagem de dinheiro que teriam sido praticados por Meirelles entre 1996 e 2002, quando morou nos Estados Unidos e foi presidente do BankBoston. O inquérito já está em curso no STF - foro privilegiado para processar e julgar o presidente do BC, de acordo com a Lei 11.036/04, considerada constitucional pelo tribunal, na semana passada. Além da requisição dos ''dossiês integrados (pesquisa completa) e cópia de todas as declarações de impostos de renda desde o ano-exercício de 1996'' de Meirelles, como pessoa física e jurídica, o ministro-relator do inquérito, Marco Aurélio de Mello, determinou também à Receita Federal o ''relatório circunstanciado da auditoria fiscal promovida contra o representado e empresas por ele controladas, e cópia de todos os documentos solicitados pelos auditores fiscais ou apresentados por Meirelles''.
As requisições dirigidas ao Banco Central (três) referem-se a processos e informações sobre a Boston Comercial Participações, Silvânia One, Silvânia Two e outras sete empresas que teriam sido controladas pelo atual presidente do BC. A única das diligências negada pelo ministro-relator do inquérito foi a requisição à Ordem dos Advogados do Brasil da relação dos advogados do escritório Demarest e Almeida, de São Paulo.
O ministro Marco Aurélio de Mello explicou que não houve necessidade de acionar a Polícia Federal, já que as diligências solicitadas restringem-se à requisição de documentos existentes na Receita, no BC e no Conselho de Contribuintes.
Num despacho de pouco mais de três páginas, o ministro solicita que, ao fim das apurações junto à Receita e ao BC, ''atente-se para o acesso reservado do Ministério Público e do interessado Henrique Meirelles, devendo os documentos permanecerem, por isso, envelopados, com a tarja relativa à preservação do sigilo, de acordo com o artigo 3º da Lei Complementar 105/2001''. Essa lei dispõe sobre o sigilo de operações das instituições financeiras.
Marco Aurélio ressalta ainda no despacho que as diligências autorizadas são relativas a ''simples inquérito'', não cabendo ainda definir a ''identidade'' dos crimes pelos quais Meirelles foi indiciado pelo MPF, mas considera ''razoável'' a solicitação do procurador-geral da República. E acrescenta: ''Descabe, nesta fase, avaliar o envolvimento ou não do indiciado. De início, há de se viabilizar a atuação do Ministério Público, até mesmo para que não pairem dúvidas sobre o perfil de quem dirige autarquia da envergadura do BC''.
O ministro também comentou que o indiciado disse estar ''absolutamente empenhado em esclarecer inteiramente as questões colocadas contra si'', e que ''tratando-se de homem público, detentor de cargo da maior importância no cenário nacional, outra postura não seria de se aguardar''.
Tradicionalmente, o STF acolhe os pedidos de investigação feitos pela Procuradoria-Geral da República, mesmo quando os indícios não são consistentes, avaliam analistas. Perguntado sobre a repercussão desta decisão no mercado financeiro, Marco Aurélio de Mello disse que ''em Direito, os meios justificam os fins''.
- Não podemos privilegiar a estabilidade do mercado a ponto de prejudicar um bem maior que é a elucidação dos fatos - disse o ministro. - Para chegar ao trancamento de um inquérito, teríamos que perceber uma inocência escancarada.
O governo prepara estratégia de defesa política de Meirelles. Avalia, por exemplo, que a oposição vai convocá-lo ou convidá-lo a dar explicações no Congresso. O Planalto já teria orientado Meirelles a não reagir emocionalmente, evitando, por exemplo, pedir demissão.
Os advogados de Meirelles disseram que o despacho do ministro do STF é ''correto e equilibrado''. Segundo eles, as investigações permitirão dar esclarecimentos suficientes da inocência do presidente do BC. Eles anunciaram que vão entrar, na próxima semana, na Corregedoria do Ministério Público, para apurar a responsabilidade pelo vazamento de informações pessoais de Meirelles.