Título: Vem aí a operação "Deus nos Acuda"
Autor: Sérgio Pardellas e Hugo Marques
Fonte: Jornal do Brasil, 19/05/2005, País, p. A3
Para esvaziar a necessidade de uma CPI para investigar propinas, Lula manda intensificar ação da Polícia Federal
O Palácio do Planalto montou uma estratégia para tentar a todo e qualquer custo barrar a CPI no Congresso para investigar propina nos Correios. Na avaliação do núcleo político mais próximo do presidente Lula, a CPI teria consequências incalculáveis para o governo e para o projeto de reeleição. Para dar uma resposta rápida à sociedade e à base parlamentar no Congresso, a Polícia Federal foi orientada a intensificar as investigações na estatal e apresentar resultados concretos sem demora. A ordem ditada pelo próprio Lula, é que a investigação, batizada por agentes e assessores palacianos de Operação ''Deus nos Acuda'', apareça já nos próximos dias. Com isso, o governo espera esvaziar a tese pela necessidade de um inquérito parlamentar.
Na reunião com a Mesa da Câmara e líderes governistas e de oposição ontem de manhã, Lula deixou clara a estratégia em curso ao defender a atuação da PF. Segundo líderes que participaram do encontro, o presidente avaliou que a PF tem se destacado no cumprimento das tarefas ao conduzir com muita competência as investigações. Insinuou que a instalação de CPI nesse momento era desnecessária pois a polícia iria esclarecer todas as dúvidas.
O presidente Lula também pediu ontem urgência no envio de relatórios detalhando as operações da Polícia Federal realizadas em todo o país. Quer utilizá-los no programa quinzenal de rádio ''Café com o presidente''. A intenção é demonstrar que o governo combate efetivamente a corrupção no país.
A ''Operação Deus nos acuda'', numa alusão à ordem que partiu do terceiro andar do Planalto, não quer deixar que nada fique sem resposta e nenhuma suspeita deixe de ser investigada em relação à propina.
O governo teme que a CPI transborde para além da estatal ligada ao Ministério das Comunicações e motive uma guerra de dossiês na imprensa, assegurando palanque de pelos menos seis meses à oposição disposta a jogar areia no projeto de reeleição de Lula daqui a dois anos.
A linha de raciocínio se assemelha à utilizada pelo governo no caso Waldomiro Diniz. Na ocasião, no entanto, a entrada da PF no caso não foi capaz de aplacar o afã da oposição, que acabou conseguindo as assinaturas necessárias para a abertura da CPI no Senado Federal. Mesmo num momento em que o governo aparentava exercer um maior controle sobre sua bancada no Congresso. Por isso, a necessidade agora de uma operação casada com os operadores políticos do Planalto. O questionamento para não instalação da CPI pelo então presidente do Congresso, José Sarney (PMDB-AP), acabou indo parar no Supremo Tribunal Federal (STF).
Numa outra ponta, o governo age politicamente a fim de evitar o número de assinaturas necessárias para a abertura da Comissão Parlamentar de Inquérito. Ontem, orientados por ministros, os líderes no Congresso dispararam telefonemas no sentido de convencer os integrantes da base a desistirem de subscrever o documento. O requerimento de CPI para investigar o esquema de corrupção nos Correios foi protocolado na tarde de ontem. Mas, até a leitura do requerimento na sessão do Congresso, os parlamentares podem retirar suas assinaturas. A instalação da CPI também depende da indicação dos representantes de cada partido, competência dos líderes de bancada.
Participam da execução da operação anti-CPI, os líderes do governo no Congresso, Câmara e Senado, Fernando Bezerra (PTB-RN), Arlindo Chinaglia (PT-SP) e Aloizio Mercadante (PT-SP), além do presidente do PT, José Genoino, e do tesoureiro do partido, Delúbio Soares, que desembarcou anteontem em Brasília para o corpo-a-corpo na bancada petista. Governadores também foram mobilizados para demover suas bancadas.
Ao mesmo tempo em que trabalha para retirar o endosso de parlamentares governistas ao pedido de CPI, o governo manda recados à oposição. Diz que uma ampla investigação no Congresso poderia representar um tiro no pé de PSDB e PFL que controlaram os Correios em gestões anteriores.
- Estão todos alvoroçados agora. Vamos ver depois. Por exemplo, o ex-ministro (das Comunicações) Pimenta da Veiga que se cuide - ameaçou um integrante do primeiro escalão de Lula.
Integrantes do Planalto reconheceram que não teve boa repercussão a defesa explícita feita anteontem pelo presidente Lula ao presidente do PTB, Roberto Jefferson, deputado envolvido na denúncia. A solidariedade ao petebista, ao contrário do que imaginava o Planalto, acabou por dar um novo fôlego para os partidários da CPI.