Título: Lula fecha acordo com o MST
Autor: Hugo Marques
Fonte: Jornal do Brasil, 19/05/2005, País, p. A5

Lavradores terão R$ 100 milhões para investir em agroindústrias nos assentamentos

Um acordo fechado com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no início da madrugada de ontem fortalece o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra. O MST terá R$ 100 milhões para investir em agroindústrias nos assentamentos. O acordo tem sete itens, em que se destaca uma portaria interministerial - a ser anunciada nas próximas semanas - para atualizar os índices de produtividade agrícola. O acordo foi anunciado ontem pela manhã pelo ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto, e por três coordenadores nacionais do MST. Para fechar o acordo, Lula teve reunião na noite de quarta com os sem-terra. Depois, ministros do Palácio do Planalto tiveram reunião em separado com o MST. Lula bateu o martelo na primeira meia-hora da madrugada de ontem e telefonou pessoalmente para os sem-terra no acampamento ao lado do Ginásio de Esportes, em Brasília. Pela manhã, Lula conversou com o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, para acertar a liberação de dinheiro para cumprir o acordo.

Os R$ 100 milhões para os projetos de agroindústria serão emprestados aos assentados pela linha ''A'' do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). O governo vai emprestar até R$ 18 mil por família, com juros de 3% ao ano para quem pagar em dia. Os assentados que implantarem projetos de agroindústria terão três anos de carência e 8 anos para quitar a dívida, em parcelas.

Um dos principais coordenadores do MST, João Pedro Stédile, afirma que a revisão dos índices de produtividade inclui ''uma infinidade'' de fazendas na lista de improdutivas, que hoje se protegem em uma legislação com base em indicadores de três décadas atrás, quando havia pouca mecanização da lavoura. Esta é uma das principais mudanças ''estruturais'' reivindicadas pela Marcha Nacional da Reforma Agrária, com 12 mil manifestantes do MST, que retornou aos Estados ontem, após caminhada de 17 dias entre Brasília e Goiânia.

Ainda na área de crédito, o MST conseguiu elevar o valor do teto de financiamento de R$ 15 mil para R$ 18 mil na linha A do Pronaf, destinada aos assentados. O governo instituiu uma linha de crédito para ''recuperação dos assentamentos'', de R$ 6 mil por família, com disponibilidades de recursos fixada em cada safra. O crédito para a construção de cisternas no semi-árido sobe de R$ 1 mil para R$ 1,5 mil.

O MST conseguiu assegurar uma cesta básica mensal para todas as famílias acampadas. São mais de 120 mil famílias ligadas ao movimento, que só recebiam comida entre três a quatro vezes ao ano.

A reforma agrária, segundo o acordo, vai priorizar a seleção de famílias nos acampamentos, o que também reforça a estratégia de mobilização do movimento. O governo vai descontingenciar os recursos do Programa Nacional de Educação da Reforma Agrária (Pronera). Durante o encontro com o MST, o presidente Lula reconheceu que não vem cumprindo as metas para assentar 430 mil famílias em seu governo.

- Estou em dívida com o MST e a reforma agrária - disse o presidente, segundo relato de coordenadores do MST.

Lula afirmou que o movimento social ''tem razão'' ao fazer críticas ao governo. O presidente, no entanto, fez uma defesa da política econômica do ministro Palocci durante o encontro com os sem-terra. Demonstrou, no entanto, estar surpreso com a falta de uma resposta de seus ministros a várias reivindicações do MST .

- Temos que conversar mais - propôs Lula.

O coordenador nacional Jaime Amorim afirmou que o acordo será ''muito importante para o desenvolvimento dos assentamentos''. Ele não confirmou se a pancadaria dos sem-terra com policiais militares na Esplanada dos Ministérios teria acelerado o acordo.

O governo envia ao Congresso, até 31 de maio, um projeto de lei com suplementação orçamentária para cumprir as metas da reforma agrária, mas ainda não definiu os valores. Também serão remanejados recursos do próprio Ministério do Desenvolvimento Agrário para atender às reivindicações do MST. O ministro Rossetto já tem disponível um estoque de 9,9 milhões de hectares para deslanchar a reforma, fruto de desapropriação e utilização de áreas públicas. O ministro elogia a Marcha Nacional.

- A marcha provocou uma atualização do debate sobre a reforma agrária no nosso país. Temos todas as razões para comemorar esse momento.