Título: A hora do diálogo
Autor: Olivia Hirsch
Fonte: Jornal do Brasil, 22/05/2005, Internacional, p. A8

Congresso aprova permissão para governo conversar com separatistas do ETA. Vitória política socialista traz esperança de paz

Em um possível passo rumo ao fim de 37 anos de luta armada, o Congresso espanhol concedeu na última terça-feira permissão ao governo do primeiro-ministro José Luis Rodriguez Zapatero para que dialogue com o grupo separatista basco ETA (Pátria Basca e Liberdade), caso concorde em abandonar as armas. A iniciativa, rechaçada apenas pelo conservador Partido Popular (PP), do ex-primeiro-ministro José Maria Aznar, contribuiu para reforçar o sentimento de que o país vive hoje uma ''oportunidade histórica'' para desarmar a organização, que desde 1968 deixou mais de 800 vítimas. - Nunca tivemos tantas expectativas como agora - comenta ao JB Joseba Zulaika, diretor do Programa de Estudos Bascos da Universidade de Nevada, nos EUA.

O especialista observa que o momento é positivo para o diálogo devido ao enfraquecimento do grupo separatista. Além da detenção de mais de 160 membros apenas no ano passado, o terrorismo, de maneira geral, se tornou ''o grande tabu da política'' desde os ataques de 11 de Setembro.

- O ETA está num atoleiro e não sabe como sair - afirma.

A chegada do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) ao poder, há 14 meses, também contribui. Os socialistas têm uma tradição mais federalista, ao contrário do PP, que governou a Espanha por oito anos.

- Antes, ser duro com o ETA era politicamente bom para o governo. Mas é fato que resolver a questão seria um logro histórico e uma vitória garantida para os socialistas nas próximas eleições - comenta Zulaika.

Não à toa, os conservadores se manifestaram duramente contra a resolução, que foi aprovada por 192 deputados - socialistas e membros das seis minorias do Congresso - e rechaçada por 147, todos do PP. Ninguém se absteve de votar. O partido conservador alega que a proposta significa ''negociar com criminosos''.

- Isso é um erro gravíssimo. O que há de errado com a luta contra o terrorismo que é preciso mudar? - disse o porta-voz Eduardo Zaplana na terça-feira. - Quando terroristas são convidados a negociar, o primeiro que pensam é que seus crimes e assassinatos valeram a pena.

O líder popular, Mariano Rajoy - que seria o sucessor de Aznar, não fosse o atentado de 11 de março em Madri -, foi ainda mais enfático e acusou o governo de ''trair as vítimas causadas pelo ETA''.

A polêmica também está dividindo a população. Enquanto uma pesquisa feita recentemente aponta que 61% dos espanhóis apoiam a abertura ao diálogo, a Associação das Vítimas do Terrorismo (AVT) convocou para junho uma manifestação na capital para protestar contra o apoio do Congresso.

- Sentar-se em uma mesa com o ETA significa se render ao terrorismo - denunciou o presidente da AVT, Francisco Alcaraz.

Na opinião de Zulaika, realmente há chances de o grupo separatista buscar o diálogo. O especialista afirma que o Batasuna, braço político do ETA que foi tornado ilegal, chegou a manifestar claramente a intenção da organização de buscar a via política.

- Dessa forma eles poderiam ter verdadeira influência, como tem hoje o nacionalismo moderado basco - explica. - Do jeito como a situação está, a população está cansada do grupo e de suas reivindicações.