Título: Ídolos bem longe do Brasil
Autor: Márcio Mará
Fonte: Jornal do Brasil, 22/05/2005, Esporte, p. A29

Após deixarem cedo o país, jogadores aliam o tempo nos gramados a compromissos publicitários e ações humanitárias

Três personalidades brasileiras que ganharam o mundo viveram, durante a semana, situações que deram a exata dimensão da importância do ídolo. Seja num campo de futebol, numa campanha pela paz ou num festival de cinema. Ronaldinho Gaúcho, Ronaldinho e Pelé, em meio a compromissos publicitários e funções diplomáticas, vêem a conta bancária e o frisson crescerem ao redor. Pelé é rei desde o tempo em que a mídia tinha menos recursos e tempo de exposição para os astros. Mas os melhores jogadores resistiam bravamente às tentações fora do país. Os Ronaldinhos são os filhos de uma geração cujos holofotes brilharam mais no exterior. Kaká e Adriano seguiram os passos, e agora Robinho é a bola da vez. Apesar dos 21 anos, o jovem atacante do Santos, atual nome da moda do futebol brasileiro, até teve tempo de ganhar dois Campeonatos Brasileiros. Mas com certeza terá mais tempo ainda de conquistar mais fãs no velho continente. Robinho vai deixar órfãos os torcedores do Santos com a mesma idade com que Kaká deixou o São Paulo rumo ao Milan, da Itália, e Ronaldinho Gaúcho fez os tricolores gaúchos chorarem ao trocar o Grêmio pelo Paris Saint-Germain, antes de conquistar Barcelona. Adriano foi do Flamengo para o Inter de Milão com 19 anos. Ronaldinho, quando saiu do Cruzeiro para o PSV Eindhoven, da Holanda, logo depois de se sagrar tetracampeão nos Estados Unidos em 1994, foi dos astros brasileiros o mais precoce a sair do país. Tinha 17.

- Os clubes não conseguem segurar por muito tempo os nossos grandes ídolos, e com isso o torcedor brasileiro fica privado de ver os melhores jogadores. Isso é fruto da grande desorganização e incompetência. E mesmo negociando os jogadores, os clubes não saem da crise financeira. É um absurdo. Vejam o caso de clubes como Grêmio, Vasco, Flamengo - afirmou Pelé, para quem Robinho é o melhor jogador do Brasil no momento.

Vários clubes querem o atacante do Santos, mas o seu destino deverá ser o Real Madrid de Ronaldinho, de quem já ficou amigo na Seleção Brasileira. Robinho, e todo jovem talentoso que deixa o Brasil, sonha repetir o sucesso do Fenômeno e alcançar dinheiro, fama e respeito.

Ronaldinho, que nem teve tempo de virar ídolo no Cruzeiro, arrebanha séquito de fãs por onde passa. Do PSV ao Barcelona, passando pelo Inter de Milão até chegar ao Real Madrid. Papão de títulos, tem no entanto no de embaixador da ONU para a paz o que o tornou celebridade maior ainda. Segunda-feira, uniu no Oriente Médio crianças israelenses e palestinas, com camisa 9 amarela às costas, que o ovacionaram num campo de futebol.

- A presença de um ídolo internacional como Ronaldinho chama a atenção para o problema entre israelenses e palestinos. Pode ajudar a trazer uma solução - afirmou Alon Beer, coordenador de esportes do Centro Peres para a Paz.

Sempre sorridente, o craque, que na verdade segue os passos de Pelé, que já parou uma guerra na África nos anos 60 e foi dos primeiros jogadores de futebol a se tornar embaixador da ONU, mostrou interesse em voltar à Palestina.

- Espero que minha visita aqui encoraje outras pessoas famosas a visitar este lugar. Sinto orgulho de ser embaixador das Nações Unidas - afirmou Ronaldinho, que além de ir à Cisjordânia esteve na cidade de Herzylia, ao norte de Tel Aviv.

Tostão, supercraque brasileiro dos anos 60 e 70 e colunista do JB, lamenta não ter tido na sua época a oportunidade de tornar-se embaixador para a paz. Mas faz uma ressalva.

- Claro que todo jogador gostaria de participar de uma ação social como essa. Ronaldinho sente prazer em fazer isso, mas é, como todos os outros, garoto-propaganda. Eles acabam requisitados por todos os lados, é interessante para os governos e as empresas que vendam essa imagem. Hoje, os jogadores de futebol têm muito mais visibilidade na mídia, são mais badalados, por isso atraem mais multidões e ganham muito mais dinheiro.

Que o diga o Fenômeno. Ronaldinho ganha R$ 500 mil por mês no Real Madrid e R$ 500 mil por mês da Nike, empresa de material esportivo com quem tem contrato vitalício. Ronaldinho Gaúcho, eleito pela Fifa maior jogador do mundo de 2004, é a nova mina de ouro. Campeão espanhol no sábado passado pelo Barcelona, levou 900 mil catalães às ruas para gritar seu nome no domingo. O clube está com tanto medo de perdê-lo que aumentou cláusula rescisória de seu contrato, válido até 2007, para 150 milhões de euros - R$ 525 milhões. Também de contrato com a Nike, teve lançada coleção de camisas e chuteiras com a sua marca.

- Cheguei ao Barcelona com a intenção de marcar uma era e ser lembrado, no dia em que partir, como um jogador que ganhou muitos títulos. E quero continuar uma história aqui - disse Ronaldinho Gaúcho.

Segundo Pelé, o astro do Barcelona merece o título de melhor do planeta. Mas sua habilidade com a bola nos pés não pode ser considerada superior à de craques como Garrincha, Zizinho e Didi, que não tiveram na época em que jogaram a mesma mídia.

- Claro que a TV os tornou maiores celebridades, e que grandes jogadores do passado ganhariam mais dinheiro hoje. Mas existe sempre um pouco de saudosismo quando surgem as comparações. Todos foram brilhantes e os melhores no seu tempo. Zizinho, Garrincha, Didi, depois a geração de Zico, Maradona, a de Romário e agora a de Zidane e os Ronaldinhos - afirmou Tostão.

Pelé, com quem formou dupla de taque no tricampeonato de 1970, é sempre para Tostão um caso à parte. Celebridade por onde passa, inclusive no Festival de Cannes, acabou dando início aos contratos com empresas de material esportivo.

- Lembro que em 70 todos usávamos chuteira Adidas, e ele assinou com a Puma. Até nisso Pelé foi Pelé.