Título: Denúncias de brigadeiro exigem resposta
Autor: Cláudio Magnavita*
Fonte: Jornal do Brasil, 23/05/2005, Economia & Negócios / Além do Fato, p. A18

A ingerência política em alguns setores do serviço público, principalmente os ligados a aviação, é extremamente perigosa. O loteamento e a nomeação para cargos utilizando critérios político-partidários podem colocar em risco atividades públicas que exigem capacidade técnica e especialização. Dois setores ligados a aviação comercial cresceram no Brasil sem nunca terem sofrido interferências. Imunes historicamente às pressões político-eleitorais, a Empresa Brasileira de Infra-estrutura Aeroportuária (Infraero) e o Departamento de Aviação Civil (DAC) aprenderam a dizer ¿não¿ e se transformaram em referência internacional, ganhando conceito de seriedade e servindo de exemplo para vários países. O clima de caserna e o rígido sentimento de serviço público sempre foram a marca dessas duas entidades. Hoje, porém, o país assiste passivamente o desmonte desses princípios espartanos e, também passivamente, vê uma dessas instituições passar por um processo perigoso de mutação. A Infraero, loteada politicamente, passou a ter novos assessores, que, em contraste com os funcionários de carreira, não batem ponto e não conhecem profundamente a realidade aeroportuária.

Os cargos de comissão já superam duas centenas em todo o Brasil, com salários altos e atividades que fogem do seu objetivo. Um contraste gritante com os funcionários de carreira e que ajudaram historicamente a construir a estatal. A greve dos aeroportuários teve como estopim as disparidades salariais entre os funcionários de carreira e os assessores nomeados.

Soma-se a isso, um fato significativo que sinaliza publicamente o que pode estar ocorrendo e aponta as graves seqüelas que isto pode gerar. Trata-se de uma polêmica carta de demissão assinada pelo brigadeiro Edilberto Teles Sirotheau Corrêa, ao se desligar da Superintendência de Segurança Aeroportuária da Infraero no final de abril. Muito mais do que um desabafo, o documento é um atestado do seu incorformismo e ganha peso pela exemplar carreira do subscritor.

O brigadeiro Sirotheau afirma na sua carta de demissão: ¿a frustração de não haver conseguido os meios necessários para estruturar e operacionalizar as atividades de Segurança Aeroportuária, acrescento a minha discordância em relação à atual Política de Gestão da Empresa, que degradou ao extremo a sua condição econômico-financeira. Dentre outras opções equivocadas, aponto a obsessiva prioridade que vem sendo dada às ações e obras que proporcionem 'visibilidade', em detrimento das necessidades operacionais e do funcionamento normal dos aeroportos, o que poderá resultar, em futuro próximo, em ocorrências graves em alguns deles.¿

Para atender normas internacionais de segurança, a Infraero deveria ter realizado pesados investimentos na aquisição de scaners que controlam a entrada e saída de veículos, cargas e bagagens. Nada disso foi realizado e o prazo internacional para que o país adote estas medidas termina em janeiro de 2006. O alerta do brigadeiro deve ser visto com muita atenção, principalmente quando afirma que ¿poderá ocorrer, em futuro próximo, ocorrências graves em alguns aeroportos¿.

O volume de obras nos aeroportos é classificado pelo brigadeiro Sirotheau como obsessiva prioridade da Infraero, que opta por investimentos que proporcionem ¿visibilidade¿ em detrimento das necessidades operacionais e o funcionamento normal dos aeroportos. São acusações sérias e merecem uma reflexão profunda por parte do primeiro escalão da empresa. Se houver silêncio é possível que o mercado aceite como verdade absoluta o que foi escrito pelo brigadeiro. Se a visão dos gestores for diferente, é necessário que respondam com veemência o documento que se tornou público, até para maior tranqüilidade dos usuários do setor aeroportuário. O presidente Carlos Wilson Campos tem um nome e uma reputação de bom administrador a zelar, portanto, não pode ficar passivo diante das manifestações do seu ex-auxiliar.

Imersa em uma turbulência administrativa que inclui um movimento grevista, que segundo o Sindicato Nacional dos Aeroportuários (Sina) já atingiu no início desta semana 70% dos funcionários, levando os aeroportos brasileiros a trabalharem no limite da carga operacional do quadro de serviço, a estatal terá de reajustar as tarifas de embarque para cumprir com as exigências da Organização de Aviação Cívil Internacional (OACI). O usuário terá de pagar do seu próprio bolso pela opção da atual administração da estatal, que como protesta o brigadeiro Sirotheau, preferiu dar prioridade ¿obsessiva¿ às obras de ¿visibilidade¿ que estão transformando os nossos aeroportos em verdadeiros shoppings centers.

*Presidente Nacional da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e Membro do Conselho Nacional de Turismo