Título: Reunião de emergência para discutir crise
Autor: Daniel Pereira, Karla Correia e Paulo de T. Lyra
Fonte: Jornal do Brasil, 24/05/2005, País, p. A2

A dificuldade em barrar a CPI dos Correios levou a cúpula do governo a realizar uma reunião de emergência ontem à noite no Palácio do Planalto. Motivo: o esforço para conseguir a retirada de assinaturas do pedido de abertura de CPI não está surtindo o efeito desejado. Ontem, a oposição protocolou mais 26 assinaturas de deputados, aumentando a lista para 245. No Senado, 49 senadores já apoiaram a criação da CPI.

Estavam presentes ao encontro o vice-presidente José Alencar, o chefe da Casa Civil, ministro José Dirceu, os ministros das Comunicações, Eunício Oliveira, da Integração Nacional, Ciro Gomes, da Ciência e Tecnologia, Eduardo Campos, e da Coordenação Política, Aldo Rebelo, e o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP).

O governo já sabe que será praticamente impossível retirar as assinaturas dos senadores e aposta todas as fichas na negociação com os aliados da Câmara.

- Se há alguma chance, está na Câmara - desabafou o líder do governo na Casa, Arlindo Chinaglia (PT-SP).

O pedido de criação da CPI será lido às 10 horas da manhã de quarta. Para barrá-la, o governo precisaria retirar até lá 74 assinaturas. A estratégia do Planalto é só anunciar as retiradas, na última hora, quando tiver certeza de que a CPI foi sepultada. Para não fornecer mais munição à oposição, os governistas não revelam quantas assinaturas terão condições de retirar de fato - por enquanto, apenas quatro deputados do PL e um do PCdoB pediram para retirar seus nomes do requerimento. No PT, a cúpula aposta que 11 das 19 assinaturas de petistas podem desaparecer até quarta-feira.

O tempo curto para tentar a retirada das assinaturas do requerimento da CPI dos Correios fez com que o governo partisse para o ataque de vez contra a oposição. O ministro da Articulação, Aldo Rebelo, chegou a afirmar que a oposição tenta promover um ''clima de 54'' contra o governo.

O governo abdicou do esforço no Senado. De acordo com um líder da base aliada, os parlamentares vêem a digital do governo na divulgação do suposto esquema de corrupção nos Correios. O objetivo seria atingir o PTB e diminuir o ímpeto do partido sobre os cargos da administração. No raciocínio do mesmo líder, o governo e o PT deixaram a sensação de que podem fazer o mesmo com outros aliados, por isso a CPI será instalada.

- Não há lealdade, não há confiança. Era para ser um tiro no dedo, mas acertou o peito da base aliada. Foi uma burrice muito grande - declara o líder, com assento no Senado.

Um líder petista ainda não se conforma com a situação e voltou a criticar a falta de coordenação política do governo. Segundo o petista, a saída seria orientar os deputados a assinarem uma CPI apenas da Câmara. Se isto tivesse acontecido, o pedido ficaria dormindo na fila de espera de outras tantas comissões parlamentares de inquérito que aguardam para serem instaladas.

- Fazer o que? Não temos coordenação política mesmo - reclamou o petista.

A operação do governo para convencer congressistas aliados a retirarem suas assinaturas da CPI foi criticada até mesmo por senadores do PT. Foi o caso de Cristovam Buarque (DF), que em seu discurso afirmou que a oposição é oportunista, mas ao mesmo tempo sintonizada com os anseios da sociedade.

- Há uma certa ansiedade da opinião pública, do povo, para que as investigações sobre denúncias de corrupção não sejam feitas apenas pela Polícia Federal - declarou.

Segundo Cristovam, ele tem pedido nas reuniões de bancada do seu partido que o PT apóie a CPI. Ele também criticou a conduta governista e lamentou que os petistas estejam adotando a mesma tática dos seus antecessores ao tentar barrar a CPI dos Correios. Para o senador, ''o PT está se igualando por baixo na incoerência''.

- É um equívoco achar que a melhor maneira de defender a honestidade do governo é ficar contra a CPI.

O senador Tião Viana (PT-AC) foi um pouco mais comedido e afirmou que o governo tem agido corretamente no combate à corrupção. Apesar de se dizer favorável à instalação da CPI, Viana afirmou que só apoiará a iniciativa após os resultados das investigações promovidas pelo Executivo.