Título: Exército ''lamenta'' morte de Herzog
Autor: Hugo Marques e Luiz Orlando Carneiro
Fonte: Jornal do Brasil, 20/10/2004, País, p. A-3
Em nota assinada ontem pelo comandante da força, general Francisco Roberto de Albuquerque, o Exército ''lamenta'' a morte do jornalista Wladimir Herzog, em outubro de 1975 nas dependências do Doi-Codi, em São Paulo. A versão oficial, na época, era de que o jornalista havia se enforcado com um cinto. O texto diz que uma nota anterior do Exército não havia abordado o assunto de forma apropriada. O documento, publicamente criticado ontem, teve origem numa reportagem do Correio Braziliense, no último domingo, com fotos em que Herzog aparece nu e humilhado, antes de morrer.
A ausência de uma ''discussão interna'', - diz o general Albuquerque, no novo texto -, fez com que o Centro de Comunicação Social do Exército publicasse uma nota ''não condizente com o momento histórico atual''. Albuquerque afirma que o Exército ''não quer ficar reavivando fatos de um passado trágico''.
O texto anterior dizia ainda que ''as medidas tomadas pelas forças legais foram uma legítima resposta à violência dos que recusaram o diálogo'' e pegaram nas armas. O Exército considerava a divulgação das fotos ''ação pequena'' para ''reavivar revanchismos''.
A reportagem e as fotos levaram a Comissão de Direitos Humanos da Câmara a abrir nova investigação sobre mortes e desaparecidos durante o regime militar. As fotos, reconhecidas pela mulher do jornalista, Clarice Herzog, foram entregues à mesma Comissão de Direitos Humanos da Câmara, em 1997, pelo militar José Firmino Alves. A Presidência da República, o Ministério da Justiça e a Universidade de Brasília também receberam as fotos, sem legendas que identificassem Herzog, junto com um relatório do Exército, de setembro de 1975, onde aparece uma lista de 47 mortos nas dependências do Doi-Codi.
O presidente da Comissão de Direitos Humanos, deputado Mário Heringer (PDT-MG) acha que as fotos representam a chave para libertar ''os fantasmas do período''. O deputado reúne hoje a comissão para definir as ações, mas antecipa que vai pedir laudo sobre as fotos e deve convocar os comandantes militares para explicações. Heringer não acredita que o ministro da Defesa, José Viegas Filho, tenha força política suficiente para abrir os arquivos militares.
- É muito difícil que um ministro civil possa ter força para impor a abertura de arquivos - afirmou.
O deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP) considerou a primeira nota ''reveladora das práticas violadoras dos diretos humanos no regime militar'' e cobrou explicações de Viegas.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva conversou duas vezes com o ministro ontem.
- Não há mais mal estar. Está tudo resolvido. Esta nota corrige e esclarece a posição da força - afirmou Viegas ontem à noite, durante solenidade no Ministério Público.
Lula escolheu o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), para acalmar os ânimos entre os petistas. Mercadante telefonou para Greenhalg ontem para informar que o Exército redigiria nova nota. Foi uma forma de evitar a convocação de Viegas pelo Parlamento.
- O caso está encerrado. Foi um gesto de humildade das Forças Armadas - afirmou Greenhalgh.