Título: Inelegíveis virtuais
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 01/06/2005, Outras Opiniões, p. A11

Nada descreve a satisfação do colunista diante da correspondência de leitores inteligentes e propensos a opinar sobre seus textos. Não são poucos os que julgam inúteis as diatribes contra a imensa esculhambação do malfadado governo petista, porque entendem que o tempo tratará de apagar da memória do povo ''deste desgraçado país'' os escândalos e as roubalheiras impunes de jeffersons e waldomiros, entre outros tantos, atirando-os ao ''lixo desta república subdesenvolvida'' onde se juntarão às contas ultra-secretas de Paulo Maluf e aos dólares ululantes de Roseana Sarney.

Uma leitora gaúcha nos acusa, com um pouco de exagero, de alimentar ilusões sobre a possibilidade de substituir os calhordas que não se reelegerem em 2006 por políticos honrados e afirma que ''tal ave rara não existe no Brasil'', e ''novos picaretas receberiam um mandato''. Uma passionária paulista pede que a imprensa exponha os ''fisiologistas infames'' que, após se declararem favoráveis à CPI dos Correios, retiraram, coagidos pelo Planalto, as assinaturas numa ''evidência inequívoca de que nossos políticos não têm convicções confessáveis'' e ''reagem segundo interesses torpes'' à cata de cargos e vantagens no odioso ''vale-tudo pela conquista do poder''. A lista solicitada já saiu nos jornais e agora faz o périplo da Internet; é torcer, portanto, para que toda essa canalhada seja banida da cena política.

Entretanto, a maior indignação de nossos leitores parece ser a provável revogação da inelegibilidade do casal Rosinha e Garotinho decretada pela juíza Denise Appolinária que, num rompante inusitado de lucidez jurídica, condenou ambos por crime eleitoral. ''Intriga da oposição! A juíza é do PT!'', berrou o marido de Rosinha. Ninguém duvida de que, à luz da legislação, a magistrada esteja certíssima, mas, no Brasil, direito e justiça são conceitos divorciados e quase incompatíveis. Diz um leitor carioca que ''não prevalece efeito construtivo em nossa prática jurídica''; garante que, em alguma estância providencial, ''um democrático tribunal de recursos e jeitinhos'', num acórdão floreado, restituirá aos condenados o direito espúrio de tentar, por mais quatro anos, às custas de engenhosas e abusivas mobilizações populistas, transformar nossa vida num inferno de desorganização e violência cada vez mais tenebroso.

Neste momento de nossa história, nada - absolutamente nada, nem mesmo as sete pragas do Egito - poderia ser pior para o Brasil do que a ascensão de Garotinho ao trono do Alvorada. Garotinho e Rosinha representam, em verdadeira grandeza, sem retoques, tudo o que existe de mais desprezível, de medonho, na administração pública. Garotinho no Executivo, com um Parlamento de Severinos, em meio aos destroços deixados pela incompetência das esquerdas atreladas ao caricato Lula da Silva, seria o pior cenário possível; equivaleria a um recuo fulminante à República Velha do coronelismo, do peleguismo e do voto de cabresto.

Há pouca ou nenhuma esperança de o Brasil, em curto prazo, vir a contar com instituições que o incluam no rol dos países sérios e lhe dêem um rumo judicioso e seguro. Infelizmente, na média, os níveis moral e intelectual dos políticos brasileiros andam infinitamente distantes da grandiosidade de um Churchill e demasiadamente próximos da mediocridade de um Garotinho. Resta ao colunista apenas implorar perdão pela heresia de estampar, na mesma frase, nomes tão inconciliáveis. Enfim, a maneira infalível de, num gesto de autopreservação, manter todos esses patifes inelegíveis é simplesmente, consistentemente, negar-lhes o voto.