Título: Juro alto esfria crescimento
Autor: Mariana Carneiro e Samantha Lima
Fonte: Jornal do Brasil, 01/06/2005, Economia e Negócios, p. A17

PIB tem expansão de apenas 0,3% no primeiro trimestre Investimento em queda pelo segundo trimestre consecutivo e consumo retraído. Esta é a síntese dos primeiros três meses do ano, período em que a política de juros altos do Banco Central surte efeito e resfria a economia. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou ontem que, no primeiro trimestre, a soma de todas as riquezas geradas no país, ou Produto Interno Bruto (PIB), cresceu apenas 0,3%, a menor expansão trimestral desde o segundo semestre de 2003, quando atingiu 0,1%. O dado acendeu a luz amarela para analistas, que começaram ontem mesmo a rever as projeções de crescimento para este ano. No banco americano JP Morgan, a previsão para este ano caiu de 3,4% para 3%. Na LCA Consultores, a revisão foi de 4,1% para 3,6%. Se o resultado do primeiro trimestre fosse repetido ao longo de todo o ano, a economia cresceria apenas 1,21% em 2005.

¿ Esperava-se que o investimento influenciasse negativamente o indicador, mas a queda acabou sendo mais forte e se transformou no fator mais negativo do resultado do primeiro trimestre ¿ avalia Bráulio Borges, economista da LCA Consultores.

O investimento caiu 3% no período, depois de um recuo de 3,9% no último trimestre do ano passado. A construção civil foi a vilã nesta conta, segundo o IBGE. O setor responde por 60% do indicador Formação Bruta de Capital Fixo (leia-se investimento).

¿ A produção de bens de capital (máquinas para a indústria) continuou bem, a queda apareceu na construção civil ¿ explica Bráulio. ¿ Mas os indicadores de financiamento de imóveis em março mostram aumento de 62% ante fevereiro, o que melhorará os investimentos no setor daqui para frente.

A taxa básica de juros (Selic) ¿ atualmente em 19,75% ao ano ¿ é a responsável pela queda no ritmo dos investimentos, segundo economistas. No trimestre, a taxa média de juros foi de 18,75%.

¿ É muito preocupante a redução do investimento. Como fatores, temos primeiro o encarecimento do dinheiro, com a elevação da taxa de juros e dos preços de máquinas e equipamentos puxados por insumos como aço. Outra razão se deve ao menor grau de uso da capacidade produtiva, provocada por uma deterioração da expectativa do empresário em função, novamente, da Selic. O empresário está não só adiando investimentos, mas desacelerando a produção, o que se reflete em menor contratação de mão-de-obra. E isso pode explicar a queda no consumo das famílias ¿ avalia o economista Claudio Amitrano, do Centro de Estudos Conjunturais da Unicamp.

Outro indicador preocupante, o consumo privado das famílias recuou 0,6%. No quarto trimestre do ano passado, este item tinha segurado o PIB.

¿ Foi uma surpresa ruim porque o consumo caiu a despeito do aumento do crédito consignado e de uma renda mais elevada ¿ avalia Fábio Akira, economista do JP Morgan.

Entre os setores analisados, a agricultura foi a única que avançou na comparação (2,6%). A indústria caiu 1%, e o setor de serviços recuou 0,2%. O IBGE reconhece a redução no ritmo da economia, mas faz ressalvas.

¿ Não podemos falar em desaquecimento da economia, já que, no período de um ano, os indicadores ainda estão em crescimento. Mas o recuo na comparação com o último trimestre de 2004 indica, de fato, uma desaceleração. Houve retração em diversos subsetores, e o mais preocupante foi o da construção civil (queda de 5,8%) ¿ explica Rebeca Polis, gerente de Contas Nacionais do IBGE. Na comparação com o primeiro trimestre de 2004, o PIB cresceu 2,9%. O resultado foi motivo para críticas dos empresários. A Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), a CUT e a Confederação Nacional da Indústria (CNI) prontamente criticaram o desempenho.

¿ Os dados referendam o alerta que a Fiesp já vinha fazendo há tempos: a insistência na política de juros altos e câmbio irreal já se reflete na performance da economia, com crescimento pífio de 0,3% ¿ reclamou o presidente da Fiesp, Paulo Skaf.

Por composição da demanda, o único segmento com taxas positivas foi o de comércio exterior. As exportações avançaram 3,5% em relação ao fim de 2004 e as importações, embora tenham registrado avanço de 2,3%, reduziram o ritmo. No segundo trimestre, para os economistas, a expectativa é de que as exportações ainda mostrem vigor, apesar do dólar baixo, porém em um ritmo mais lento.