Título: Fontelles entra com ação contra pesquisa com células tronco
Autor: Luiz Orlando Carneiro
Fonte: Jornal do Brasil, 31/05/2005, País, p. A5

O procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, ingressou ontem, no Supremo Tribunal Federal, com ação de inconstitucionalidade contra o dispositivo da Lei de Biossegurança que permite - para fins de pesquisa - a utilização de células-tronco obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro, ainda que - como está na norma legal -- tais embriões sejam ''inviáveis'' ou estejam congelados há mais de três anos. Para Fonteles, o artigo 5º da Lei 11.105/05 contraria o princípio constitucional da ''inviolabilidade do direito à vida'', já que ''a vida humana acontece na , e a partir da , fecundação''. Católico fervoroso, o chefe do Ministério Público argumenta que há vida a partir da fecundação, mas fundamenta a sua ação em depoimentos de nove professores universitários, sem qualquer menção ao aspecto religioso. Esse entendimento sobre o começo da vida, entretanto, coincide com o defendido pela Igreja Católica.

Fontelles solicita que seja realizada, antes do julgamento da ação, uma audiência pública com o depoimento de nove especialistas em embriologia, ginecologia e bioética, entre os quais os professores universitários Dernival da Silva Brandão, Alice Teixeira Fonseca e Claudia Maria de Castro Batista. Suas opiniões são amplamente citadas por Fonteles na argumentação de 12 páginas em que se baseia a ação.

Sustenta o procurador-geral que a vida humana ''acontece na, e a partir da, fecundação'', quando o zigoto é gerado pelo encontro dos 23 cromossomos masculinos com igual número de cromossomos femininos, e que ''a vida humana é contínuo desenvolver-se porque o zigoto, constituído por uma única célula, imediatamente produz proteínas e enzimas humanas''.

Além disso, Fonteles destaca que a pesquisa com células-tronco adultas é ''objetiva e certamente mais promissora do que a pesquisa com células-tronco embrionárias, até porque com as primeiros resultados auspiciosos acontecem, do que não se tem registro com as segundas''. Depois de citar a observação do professor Dernival da Silva Brandão, membro emérito da Academia Fluminense de Medicina, de que ''o embrião é o ser humano na fase inicial de sua vida'', Fonteles afirma que o artigo 5º da lei ''por certo inobserva a inviolabilidade do direito à vida, e faz ruir fundamento maior do Estado democrático de direito, que radica na preservação da dignidade da pessoa humana''.

Na tramitação do projeto da Lei de Biossegurança, deputados ligados à Igreja Católica tentaram retirar o artigo sobre células-tronco. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil distribuiu carta com esse pedido. Portadores de deficiências físicas que podem ser beneficiadas pelas pesquisas com células-tronco pressionaram pela aprovação. A Lei também regulamentou o plantio e venda de transgênicos. A clonagem humana continua proibida, mesmo para fins terapêuticos (caso no qual também seriam obtidas células-tronco embrionárias).