Título: Grito de alerta
Autor: Mariana Filgueiras
Fonte: Jornal do Brasil, 03/06/2005, Rio, p. A15

Nos últimos meses, os médicos têm denunciado as precárias condições de funcionamento dos hospitais públicos, incluindo os estaduais, revelando falhas na infraestrutura, falta de insumos básicos, medicamentos e manutenção precária dos equipamentos. Na Secretaria Estadual de Saúde, o que agrava a crise é a atual política de recursos humanos, que trilha o caminho à margem da lei, no terreno da ilegalidade, precarizando a relação de trabalho e cassando direitos. Isso representa um grave retrocesso se compararmos as primeiras ações adotadas na área durante o governo Garotinho e capitaneadas pelo atual secretário. Na época, o governador, atendendo ao pleito da sociedade, encerrou um ciclo perverso no qual a gestão das unidades havia sido privatizada através da terceirização de cooperativas. Em seguida, foram convocados os concursados de 1995, e em 2001 novo concurso foi realizado. Nenhum dos concursos conseguiu suprir o déficit da rede, pois, além da evasão de muitos profissionais e da convocação insuficiente, o poder público continuou a se valer da mão-de-obra terceirizada sob várias roupagens, todas irregulares, na tentativa de completar o quadro. A atual política de recursos humanos, além de demonstrar a incapacidade para formular propostas que possam fixar o profissional à rede, viola a Constituição Federal, ameaça o Código de Ética Médica e compromete seriamente a qualidade dos serviços prestados à população. O importante resgate da dignidade profissional, o PCCS, aprovado por unanimidade na Assembléia Legislativa, foi inicialmente impedido por decisão judicial. Com a cassação da liminar, a lei voltou a vigorar, e mesmo assim o governo se nega a implantá-lo.

Diante da intransigência das autoridades, não nos restou outra alternativa a não ser recorrer ao Ministério Público do Trabalho, que ontem ajuizou ação civil pública visando à anulação da terceirização da mão-de-obra. É inadmissível pensar que não haja outra saída além das chamadas cooperativas, que têm inúmeros pareceres contrários dos órgãos fiscalizadores. A solução tem que ser o que a lei estabelece. É inadiável a convocação dos últimos concursados, um contrato emergencial com direitos trabalhistas assegurados para suprir o déficit e a imediata convocação de novo concurso público. A continuidade dessa fórmula irregular de contratação desrespeita diversas decisões dos Conselhos de Saúde, órgãos fiscalizadores do sistema, que o gestor é obrigado a cumprir, ficando evidente ainda o seu propósito clientelista e eleitoreiro. Os recentes acontecimentos, em que casos graves que chegam às emergências não são atendidos por falta de especialistas ou por outras razões da crise, demonstram que o quadro tende a se tornar mais grave se nada for feito. Não temos mais tempo a perder. O nosso grito de alerta tem por objetivo fazer valer o que a lei estabelece e o motivo maior é o respeito à vida dos nossos pacientes. Essa tarefa não é só dos médicos, mas principalmente das nossas autoridades que a tudo assistem e pouco fazem.