Título: Lula culpa o PT
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Fonte: Jornal do Brasil, 07/06/2005, País, p. A2

O governo do presidente Lula, como Pilatos, lavou as mãos pela segunda vez em relação à denúncia de pagamento de mesada a deputados federais, publicada pelo Jornal do Brasil em 24 de setembro de 2004. Na ocasião, o ministro Aldo Rebelo, da Articulação Política, afirmou que, ¿do ponto de vista do governo¿, o assunto estava superado. Na Câmara, então sob o comando do petista João Paulo Cunha, foi para a gaveta 12 dias depois da reportagem do JB. Com o esquema confirmado pelo presidente do PTB, deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo de segunda-feira, Rebelo, travestido novamente de porta-voz do Planalto, alegou que nada ligava o pagamento ao governo. E jogou a culpa sobre o PT. ¿A denúncia refere-se ao hipotético pagamento de um partido a parlamentares de outros partidos¿, tergiversou. A mesma tese empunhada pelo líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP). Presidente do PT, José Genoino cumpriu seu papel e saiu em defesa do partido. ¿O PT não está num mar de lama¿, bradou.

O caso não é tão simples. Em 24 de setembro do ano passado, o JB revelou a existência da mesada de R$ 30 mil paga a deputados aliados para garantir votos em projetos considerados essenciais ao governo. O deputado Miro Teixeira, então no PPS, hoje no PT, revelou o acerto: ¿ Afirmei, e reafirmo agora, que eu, ou qualquer outro parlamentar que tivesse provas do que vem sendo chamado de mensalão, teria o dever de levar a denúncia ao presidente¿. A senadora Heloísa Helena, confirmou. João Paulo Cunha prometeu investigar o caso e encaminhou a reportagem para a Corregedoria da Casa. Miro Teixeira recuou, Heloisa também, nenhum parlamentar se apresentou para confirmar o pagamento e o assunto foi para o baú.

Do Congresso, não do governo. O governador de Goiás, Marconi Perillo, contou ontem que havia alertado Lula sobre o esquema há um ano e quatro meses. Depois da reportagem do JB, teria-se se seguido, três meses depois, o alerta de Jefferson. Se o governo estancou a gasoduto da propina, não culpou, nem puniu seus autores. Especialmente um, o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, homem de confiança de Lula desde sempre.

Tão de confiança que, entre um e outro, o presidente ficou com o tesoureiro. Abandonou o aliado em quem disse confiar a ponto de entregar um cheque em branco e a qual definiu como um parceiro no momento em que Jefferson estava atolado nas denúncias de propinas nos Correios e no Instituto de Resseguros do Brasil. Aldo Rebelo versificou a mudança de idéia de Lula no fim da tarde, quando desqualificou a versão do presidente do PTB. Juristas argumentam que o silêncio pode configurar crime de responsabilidade, caso se confirmem os pagamentos. O mesmo crime que levou ao impeachment do ex- presidente Fernando Collor em 1992.

A reação confusa do Planalto, a nota difusa do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, a quem Jefferson contou ter alertado sobre o esquema, e a frágil defesa de Genoino causaram perplexidade ao Legislativo.

O senador Delcidio Amaral (MS), líder do PT no Senado, sugere que se apresse a reforma ministerial para contornar a crise e recompor a base no Congresso. Esta seria também uma forma de estancar o ímpeto da oposição. O PSDB sinalizou disposição para o diálogo para evitar que a denúncia ponha em risco a governabilidade. Líder tucano no Senado, Arthur Virgílio Neto observou que se o governo punir os culpados, seu partido está disposto a montar uma agenda de votações no Congresso. Assegurou, contudo, que não há hipótese de a oposição recuar no propósito de instalar a CPI dos Correios. Os governistas, porém, insistem em derrubar a investigação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara.