Título: PT se recusa a ''cortar na própria carne''
Autor: Marcos Seabra
Fonte: Jornal do Brasil, 09/06/2005, País, p. A2

Um dia depois de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmar que iria ''cortar na própria carne'', o PT decidiu apoiar o secretário nacional de Finanças do partido, Delúbio Soares, mantendo-o no comando do caixa. Dois dias depois das denúncias envolvendo seu nome virem a público, Delúbio deu entrevista negando todas as acusações. Em São Paulo o petista, que atua como tesoureiro do partido há cinco anos, colocou à disposição da Justiça seu sigilo fiscal, bancário e telefônico, assim como os de sua família.

Delúbio Soares foi acusado por Roberto Jefferson de ser o intermediário na distribuição de propinas a deputados do PP e do PL em troca de apoio ao governo de Lula. Visivelmente emocionado, Delúbio negou as acusações depois de uma reunião extraordinária de cinco horas da executiva nacional do PT, em São Paulo. Logo após a reunião, durante entrevista, o petista acusou Jefferson de tentar chantagear o governo Lula.

- Não me prejulguem por afirmações caluniosas que fazem parte de uma chantagem contra o governo - disse o tesoureiro do PT.

Dizendo-se ''indignado'' pelas acusações do deputado petebista, Soares prometeu que o partido irá se defender ''pelos meios legais''.

- Não tenho medo de investigações - repetiu durante todas as suas respostas.

- O PT não compra e não vende votos e não aceitamos nenhum tipo de chantagem - garantiu o tesoureiro.

Ele negou ainda que tenha recebido a visita de Roberto Jefferson em sua casa em São Paulo ou Goiás, onde também mantém residência.

- Fiz e recebi visitas de integrantes do PL, inclusive de seu presidente, Waldemar Costa Neto, para tratar de assuntos de interesse do partido e de apoios eleitorais - garantiu Soares. A justificativa foi a mesma para as visitas ao Palácio do Planalto.

O presidente nacional do PT, José Genoino, que liderou as discussões durante a reunião de ontem do partido, disse que o afastamento de Soares não foi tema de discussão.

- Qualquer atitude neste sentido só poderá ser tomada através de instrumentos partidários, já que Delúbio faz parte da executiva nacional do PT - explicou o presidente do PT.

Delúbio Soares, por sua vez, disse que não se sentiu atingido pelo discurso de Lula de terça-feira, quando o presidente prometeu punições.

O desligamento do secretário de Finanças deverá voltar à pauta com toda a força nos próximos dias 17 e 18, quando será realizada uma reunião do diretório nacional do PT. Para a próxima reunião, Soares prometeu se explicar a todos os filiados.

Antes e durante a reunião de ontem, algumas vozes se aproveitaram do momento instável para marcar suas posições dissonantes à executiva petista liderada por Genoino. João Felício, da secretaria sindical do partido, sugeriu a criação de uma CPI do mensalão.

- Talvez assim possamos apurar todos os fatos de maneira aberta - disse o petista.

Marta Suplicy, vice-presidente da executiva nacional do PT, a última a chegar na reunião, se preocupou em demonstrar a unidade do partido.

- Ficamos alegres com a atitude do presidente Lula (disposição de punir possíveis culpados petistas) e precisamos apurar tudo corretamente, pois não podemos deixar esse assunto em mãos suspeitas - disparou.

Mas a mais enfática discordância veio de Markus Sokol, que participou da reunião como representante da tendência O Trabalho, ala mais à esquerda do partido.

- O governo está enlameando o PT - disparou Sokol.

Para ele, o ministro da articulação política, Aldo Rebelo (PCdoB), cometeu um desplante ao dizer que as denúncias de Roberto Jefferson são um problema do PT.

- Temos que rever não só a nossa política econômica, entre outros, como também as nossas alianças políticas - alardeou. .