Título: Desinformação com sotaque francês
Autor: Ana Paula Verly e Duilo Victor
Fonte: Jornal do Brasil, 09/06/2005, Rio, p. A15

Site de consulado recomenda que turista evite o mar de Ipanema e a Lapa e aconselham a andar com dinheiro para o ladrão. Apesar de o Rio estar passando a semana na França (é a vez dos cariocas no Ano do Brasil na França, evento organizado pelo governo local), está mais do que na hora de os franceses passarem alguns dias no Rio, pelo menos na cidade que eles não conhecem. Dicas do Consulado francês na internet mostram que há mais dúvidas do que certezas para os visitantes que vêm da terra do champanhe. O site alerta os compatriotas que querem visitar o Brasil para evitarem passeios turísticos famosos como a orla da Zona Sul durante a noite, não andarem sozinhos pelo Corcovado ou pelos bairros da Lapa e Cinelândia. Além disso, um dos mais famosos guias de viagem vendidos faz recomendações exageradas sobre a cidade, como a de não se banhar na Praia de Ipanema.

Só do setor de turismo, há 40 empresas divulgando seus produtos na Semana do Rio na França. É o dobro de companhias de outros setores da economia fluminense que expõem no evento. A importância que se dá à França faz parte da expectativa dos organizadores de aumentar em 40% o fluxo de turistas na cidade este ano.

- O Rio de Janeiro é a maior porta de entrada de turistas estrangeiros no país. Atentos a isso, os empresários estão divulgando os inúmeros tipos de turismo, privilegiando o histórico, com muita aceitação junto aos franceses - pondera o superintendente do Sebrae, Sérgio Malta, que participa, em Paris, do evento, promovido em parceria com o Sistema Firjan e as câmaras de comércio e indústria (CCPI) de cidades francesas.

Para ele, as recomendações divulgadas pelo governo francês não afastam os visitantes daquele país.

- A violência não é um obstáculo para nós. O Brasil está na moda. Além disso, as empresas vendem os produtos para as operadoras, que conhecem a realidade do Rio - afirma, considerando baixos os índices de violência contra turistas na cidade.

Ao clicar o link chamado ''conselhos aos viajantes'', no site, pode-se encontrar recomendações como a de não carregar grande quantia de dinheiro, mas sempre ter uma nota de R$ 50 para entregar sem hesitação em caso de agressão. Na parte que menciona especificamente o Rio, famosos endereços como a Vista Chinesa, a Floresta da Tijuca, Santa Teresa, Lapa e Cinelândia devem ser, freqüentados com precaução.

Duas turistas francesas que estão hospedadas há um mês na casa de uma parente em Ipanema não procuraram informações sobre o Rio no Consulado. Elas disseram, no entanto, ter ficado espantadas com os conselhos escritos em um guia para turismo do tipo ''mochilão'', o Le Guide du Routard.

- O guia dizia simplesmente para não entrar na Praia de Ipanema nem usar cyber cafés à noite, não me pergunte porquê. Também recomendava não ir ao zoológico nos fins de semana, porque são sujos e estão sempre lotados - conta Chantal Boudalt, 57 anos, sobre Guide du Routard, que em sua versão para internet contém alertas como '' ... não se esqueça que o Brasil detém recordes em relação à Aids. Para quem a abstinência não é uma coisa óbvia, não se esqueça do preservativo naquele tipo de país''.

O secretário estadual de Turismo, Sérgio Ricardo, considera contraditório que o Consulado-Geral da França divulgue tais recomendações:

- O cônsul francês está sempre na Lapa. Vários franceses fazem festa na Lapa. O turismo dos franceses é um dos mercados mais importantes para nós.

Para o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis, Alfredo Lopes, as advertências são ''exageradas''.

- A violência também existe em outros locais do mundo. Assim como na Lapa, não é prudente andar sozinho em ruas ermas, o mesmo acontece em Nova York, Paris e outras cidades turísticas da Europa e dos Estados Unidos.

O presidente do Sindicato dos Hotéis, Bares , Restaurantes e Similares, Alexandre Sampaio, afirma que os conselhos não geram perda de fluxo de turistas para o Rio.

- Essas informações são divulgadas por outros países e destinam-se, principalmente, àqueles que fazem o turismo individual - informa.

Outro alerta divulgado na internet pelo consulado-geral é para evitar ruas que ficam no entorno do Corcovado e só ir até o Cristo Redentor em grupos organizados.

No Pão de Açucar, um dos poucos lugares considerados seguros pelo consulado, as francesas Chantel e sua filha, Frédérique Boudault, contam que não tiveram problemas em visitar as praias ou o Corcovado.

- Amamos o Rio, mas não dispensamos precauções óbvias como não andar com objetos de valor - diz Frédérique.