O Globo, n. 32791, 18/05/2023. Economia, p. 12

Haddad defende início do ciclo de corte na Taxa Selic

Renan Monteiro


O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou ontem que há espaço para o Banco Central (BC) iniciar a trajetória de corte na taxa básica de juros, a Selic, que está em 13,75% ao ano desde agosto de 2022.

— Se você consultar vários especialistas e técnicos, imagina que há espaço para iniciar o ciclo de cortes na taxa de juros. Não estamos questionando a autoridade monetária, do ponto de vista do seu poder. Estou ponderando o que é melhor para o Brasil. Com as medidas tomadas até aqui, sim, haveria espaço para um gesto de mais confiança na economia brasileira, sem que houvesse qualquer percalço na inflação — afirmou Haddad durante audiência pública na Câmara dos Deputados.

Ele foi convidado pelas Comissões de Desenvolvimento Econômico; Finanças e Tributação; Fiscalização Financeira e Controle para “esclarecer a política econômica do governo federal”.

O ministro citou medidas “saneadoras” que estão sendo articuladas pelo governo, bem como a recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre incentivos fiscais dados por estados a empresas, que pode render R$ 90 bilhões aos cofres públicos. O ministro apontou ainda “correções” do que chama de “confusão fiscal” no governo Jair Bolsonaro —em referência a ações como a desoneração de combustíveis iniciada no período pré-eleitoral.

R$ 740 BI gastos com juros

Haddad disse que parte dos chamados gastos tributários do país estão provocando desequilíbrio nas contas públicas. Ele ressaltou que a estimativa de gastos com juros é da ordem de R$ 740 bilhões e criticou isenções tributárias “injustificadas”.

Durante a audiência, o deputado Evair de Melo (PPES), que foi vice-líder do governo Bolsonaro, chamou Haddad de “limitado”. Em resposta, o ministro disse considerar o ex-presidente uma das pessoas mais limitadas que já conheceu:

— Com todo respeito, eu acho que o seu conceito de limitação é bem diferente do meu. O senhor acha o Bolsonaro uma pessoa pouco limitada. Eu acho que talvez seja a pessoa limitada que já conheci em toda a minha vida.

Ao argumentar com o ministro, Melo ainda se referiu a Haddad como “homem à disposição do PT para ocupar cargos”. Após a discussão, parlamentares se exaltaram pedindo respeito, e o presidente da Comissão de Finanças e Tributação, Paulo Guedes (PTMG), teve de intervir para que o debate continuasse.

Na audiência na Câmara, Haddad argumentou ainda que a nova política de preços da Petrobras promoverá efeitos positivos com a redução do nível de preços ao consumidor. A inflação, que tem nos combustíveis um dos itens de maior pressão, está em 4,18% ao ano, e a expectativa de mercado é que o índice fique maior no segundo semestre.

— Com as mudanças da política de preços da Petrobras, com o dólar em queda e o petróleo em queda, você consegue acomodar isso (os preços) sem provocar pressão inflacionária. Pelo contrário, vai ajudar no combate à inflação, sem desorganizar as contas dos governadores — afirmou o ministro, em referência à desoneração dos combustíveis feita por Bolsonaro.

Sem sinais por parte do BC

A nova política de preços, anunciada na terça-feira, passou a considerar os custos internos de produção da Petrobras e não apenas a cotação internacional e o câmbio, como previa a política de paridade internacional (PPI), criada no governo Michel Temer. A nova estratégia também prevê preços diferenciados por cliente e por região.

Na primeira reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) após a divulgação da proposta do governo para controle das contas públicas, no início deste mês, o BC manteve a Taxa Selic em 13,75% pela sexta vez consecutiva. No comunicado, não havia sinais sobre eventual corte na próxima reunião, em junho.

Para o presidente do BC, Roberto Campos Neto, assim como para os oito diretores da autarquia, a batalha contra a inflação não está vencida.