Título: Choque ético contra o descrédito
Autor: Israel Tabak
Fonte: Jornal do Brasil, 12/06/2005, País, p. A3

Um pacto nacional para aplicar um choque ético na política e assim resguardar a estabilidade democrática. Parlamentares da situação, da oposição e representantes de movimentos sociais convergem na idéia de que, acima dos antagonismos eleitorais, é necessário um entendimento de alto nível, para evitar o descrédito dos políticos e eventuais ameaças autoritárias. No Congresso, se intensificam as conversas entre representantes de diversos partidos, que se concentram em torno da urgência da reforma política e da necessidade de motivar o governo a tomar medidas específicas para evitar novas crises geradas por denúncias de corrupção. No front das ruas, O Movimento Nacional contra a Corrupção Eleitoral quer reviver, em moldes atualizados, a campanha pela ética na política, que se fez presente na década de 90 , em episódios como a renúncia de Fernando Collor e dos anões do Orçamento. A idéia é difundir para toda a sociedade - sobretudo para as camadas mais pobres - o princípio de que é preciso combater, nas diversas esferas de poder, os costumes políticos viciados.

O presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, Antonio Carlos Biscaia (PT-RJ)) vem mantendo contatos com políticos da situação e oposição, com o objetivo de formar um pacto suprapartidário para tentar moralizar a vida política e assim preservar as instituições democráticas.

Um dos fundadores de um movimento pela credibilidade do Parlamento, o deputado Chico Alencar (PT-RJ) concorda que o momento é delicado, com o risco de o descrédito da atividade política ser explorada por gente saudosa dos tempos autoritários. Para isso - opina - são necessárias medidas duras e nítidas do governo para prevenir práticas condenáveis.

- Caso contrário é melhor nem governar, para não ficar refém de práticas que a sociedade repudia - avalia.

Na visão de Biscaia, é nefasto aproveitar a crise para antecipar a disputa eleitoral, o que pode agravar o ainda mais o quadro e trazer o risco de instabilidade institucional.

- Esse pacto político, acima de conveniências eleitorais, tem que vigorar para votar projetos que são de interesse do país, além de investigar a fundo os casos de corrupção.

Para Biscaia, este também é o momento do ''choque ético'' dentro do próprio PT.

- Parlamentares de todas as tendências do partido se mostram preocupados com a situação e se sentem constrangidos quando são cobrados pelos eleitores.

O deputado fluminense tem conversado com ''homens de bem'' de vários partidos e vem sentindo o mesmo interesse em evitar que a crise ponha em risco a normalidade democrática.

- Outro dia o senador Eduardo Azeredo, presidente do PSDB, me telefonou preocupado em acelerar a reforma política. Este é um dos projetos fundamentais.

O presidente da CCJ comenta que, até agora, pareceu existir um temor do governo em não desagradar os partidos aliados que se opõem à reforma.

O relacionamento com os aliados, um dos focos da crise, provoca questionamentos:

- É inaceitável fazer acordos com políticos de condutas imprevisíveis. Isso não ajuda a governabilidade. O que precisamos é firmar alianças com pessoas, dentro dos partidos, que tenham princípios e valores.

O parlamentar também considera inadmisível fazer alianças negociando cargos nas estatais, em áreas técnicas. Condena, além disso, ''os pacotes prontos'', apresentados pelos partidos da base de apoio, onde o projeto de loteamento de cargos já está definido, com destaque, por exemplo, para áreas delicadas, como as de fiscalização e compras.

Outra providência urgente, segundo Biscaia, é aumentar o rigor na checagem dos nomes indicados para cargos executivos, e assim prevenir problemas de conduta e gestão. Isso sem falar na troca imediata de pessoas sobre as quais recaiam suspeitam graves ou que estejam sendo processadas.

A compra de votos - expressão repetida na crise de Brasília e freqüente nas campanhas eleitorais - é o principal alvo do Movimento Nacional contra a Corrupção Eleitoral, que tem como principal apoiadores a OAB e a CNBB. Para um dos coordenadores, Daniel Seidel, essa prática ''não pode se repetir na relação entre poderes''. Esse ambiente - comenta - faz com que a população se torne cada vez mais desinteressada pela política. Nas camadas mais pobres, a atenção só é despertada nas proximidades das eleições, o único momento em que os pobres podem barganhar com o poder.

- Forma-se uma aliança perversa. Os setores atrasados compram votos justamente dos mais pobres e não têm qualquer interesse em mudar a estrutura social. Por isso nos preocupamos em disseminar a participação popular na reforma política, uma forma de conscientizar a sociedade para mudar esse quadro.