Título: Embriões no centro da polêmica
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 13/06/2005, Internacional, p. A12
ROMA - Os italianos abriram ontem as votações de um referendo que visa a permitir o tratamento de infertilidade e a pesquisa embrionária. A questão põe em lados opostos alguns dos políticos mais populares da Itália e a Igreja Católica, que fez campanha pelo boicote. O baixo comparecimento no primeiro dia de votação pode representar uma vitória do Vaticano.
O referendo tem como finalidade decidir sobre a anulação de uma rígida lei restritiva sobre reprodução assistida, que leva muitos casais italianos inférteis a procurar tratamento embrionário no exterior. A polêmica lei italiana proíbe, entre outros pontos, a doação de esperma e óvulos e a pesquisa com células-tronco embrionárias. Bispos italianos apoiados pelo papa Bento 16 e outros grupos lideram o movimento pela permanência da lei e pedem o boicote dos eleitores.
Com apenas três horas para o fechamento das urnas no primeiro dos dois dias de votação, somente 13% dos eleitores depositaram seus votos. Para que o referendo seja válido, pelo menos metade dos 40 milhões de eleitores italianos deve participar. Hoje termina a votação.
Entre os primeiros votantes estavam importantes políticos da ala católica, que desafiaram o boicote. A lista inclui o presidente italiano, Carlo Azeglio Ciampi, e sua esposa. O líder da oposição, Romano Prodi, e o vice-primeiro-ministro Gianfranco Fini também compareceram às urnas.
A Itália chegou a ser reconhecida como uma nação avançada nas questões de pesquisa de fertilização. Nos anos 90, ganhou fama no país o caso de um médico que ajudou uma mulher de 62 anos a engravidar. Hoje, entretanto, o país tem uma das leis mais conservadoras em relação ao tema na Europa. Desde que a lei foi aprovada, o número de casais inférteis que buscam ajuda médica no exterior triplicou.
A Itália também tem uma das mais baixas taxas de natalidade da Europa. Se a maioria dos italianos optar pelo sim em qualquer um dos quatro referendos, a lei será modificada. Com isso, além de anular o embargo contra doadores de óvulos e de esperma e permitir a pesquisa embrionária, ainda estaria autorizado o congelamento de embriões e cairia o limite no número de óvulos que pode ser fertilizado durante cada tentativa.
O referendo também visa a modificar a legislação que concede aos embriões direitos legais totais e, com isso, proíbe o diagnóstico para doenças genéticas antes que eles sejam transferidos para o útero. A ministra Stefania Prestigiacomo diz que a legislação atual é um ataque aos direitos da mulher e precisa ser modificada para auxiliar as italianas a terem filhos.
A votação provocou o mais polêmico debate desde que o divórcio e o aborto foram legalizados no país, nos anos 1970. Os padres usaram os púlpitos para fazer sermões com o slogan: ''a vida não pode ser submetida à votação: não vote''. Em algumas cidades italianas, pôsteres chegaram a ser espalhados com o apelo ao boicote. O papa Bento 16, eleito em abril, fez sua primeira interferência na política italiana com o apoio à campanha propagado pelos bispos.