Título: Por políticos humanos
Autor: Marcus Quintella
Fonte: Jornal do Brasil, 22/06/2005, Outras Opoiniões, p. A13

Há anos, em todo o planeta, o número de pessoas vivendo em péssimas condições sociais e humanas está crescendo assustadoramente e, caso permaneçam as atuais tendências, as disparidades econômicas entre países ricos e subdesenvolvidos deixarão de ser injustas para se tornarem desumanas.

No caso do Brasil, elites experimentam níveis recordes de bem-estar e a maioria do povo afunda na falta de esperança e na miséria. Fica a dúvida se nossos políticos e governantes estão agindo para melhorar essa situação, de forma altruísta e humanística, sem qualquer interesse pessoal ou político. Os políticos deveriam entender que desenvolvimento econômico requer desenvolvimento social. De nada adianta uma nação apresentar elevadas taxas de crescimento econômico, inflação controlada, saldos na balança comercial, etc, se tudo isso não for percebido pela população em seu dia-a-dia, com a materialização das principais necessidades humanas básicas, que compreendem educação, saúde, nutrição, água, saneamento, habitação e transporte.

A população nada entende de economia, mas entende de qualidade de vida, que lhe é negada há décadas por todos os governos, inclusive o atual. Na verdade, o que interessa para a população são benefícios tangíveis e não anúncios oficiais na TV de que o país está crescendo, se ninguém vê onde isso está ocorrendo. É uma situação paradoxal, pois existe muita gente desempregada ou subempregada, sem casa própria, com esgoto na porta de casa, sem água encanada, sem transporte, fazendo, quando muito, uma refeição por dia, com contas atrasadas e problemas de saúde, tendo de trabalhar mais de 12 horas por dia, e no final do mês nada sobra e a situação piora com dívidas eternas. Enquanto isso, a mídia mostra os escândalos no Congresso Nacional, as viagens incansáveis do presidente, o jogo de números da economia, o financiamento brasileiro para o metrô de Caracas, as estradas apodrecendo, os assaltos aos cofres públicos, as sonegações tributárias, a impunidade de bandidos, políticos e poderosos, as representações dramatúrgicas dos políticos diante das câmeras de TV, os mensalões, a corrupção generalizada no país etc. E tudo isso com o dinheiro público, ou seja, com aquela absurda carga tributária que é sugada mensalmente do salário do trabalhador.

Certa vez, li um artigo do Banco Mundial com a estimava de que para cada dólar emprestado aos países em desenvolvimento, inclusive o Brasil, somente trinta centavos de dólar chegavam ao objetivo final, sendo que os setenta centavos restantes eram perdidos com desperdício, incompetência, impertinência e corrupção. Trata-se de um dado grave e alarmante, mesmo que impreciso. Intuitivamente, podemos concluir que esse número não deve ser tão impreciso assim e deve valer também para cada real de tributo recolhido aos cofres públicos brasileiros, visto que não constatamos o retorno desses tributos.

Assim sendo, somente nos resta a esperança de que os políticos brasileiros reflitam e entendam que também pertencem à espécie humana, além de possuir família de seres humanos, e que todos os projetos que passam pelo legislativo e executivo deveriam ter como foco, primeiramente, a população brasileira, composta por seres humanos, pois as conseqüências de projetos de interesse político/pessoal, na maioria das vezes desumanos, afetarão seres humanos, inclusive os próprios políticos autores desses projetos.