Título: Votação sob suspeita de fraude
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Fonte: Jornal do Brasil, 19/06/2005, Internacional, p. A14

Preterido nas pesquisas, prefeito ultraconservador de Teerã disputará segundo turno. Moderados questionam lisura do pleito.

TEERÃ - O Irã vai ao segundo turno das eleições presidenciais na sexta-feira em clima de suspeita de fraude. Disputam agora o cargo o candidato que já liderava as pesquisas, o ex-presidente Akbar Hashemi Rafsanjani, tido como moderado, com 6,1 milhões de votos (21%) e o ultraconservador Mahmoud Ahmadinejad, com 5,7 milhões (19,48%) - 62,7% dos 47 milhões de eleitores foram às urnas. A votação do segundo colocado foi mais que uma surpresa no país onde os únicos ''observadores'' do pleito foram oficiais do temível Conselho dos Guardiães e da Guarda Revolucionária, que apóiam Ahmadinejad, e onde o governo divulgou oficialmente que jogou 1,2 milhão de cédulas fora porque os eleitores ''cometeram erros''.

O primeiro a chamar a atenção para o que pode ter sido uma manipulação oficial das eleições foi o terceiro colocado na votação, o clérigo moderado Mehdi Karroubi, que acabou em terceiro lugar, com 17,28%, depois de passar boa parte da apuração em segundo.

- Vi dinheiro trocar de mãos - acusa Karroubi, que vai ao Guia Supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, pedir investigação. Ahmadinejad, porém, é bastante próximo do líder. Prefeito de Teerã, ele integrou unidade de elite da Guarda Revolucionária.

Também há denúncias de que o ex-oficial declarou publicamente que estaria no segundo turno antes que o Ministério do Interior, responsável pelas eleições, fizesse o anúncio oficial dos resultados. Karroubi garantiu, ontem, que, além de receber dinheiro, eleitores foram pressionados.

- Tenho provas. Posso mostrar fitas que provam que eles fizeram discursos para forçar as pessoas a elegerem candidatos conservadores.

O clérigo moderado recebeu o apoio do reformista Mostafa Moin, que era apontado por especialistas e pesquisas de intenções de votos como provável segundo colocado, mas acabou em quinto, com mais de 4 milhões de votos. Segundo Moin, o Conselho dos Guardiães e a Guarda Revolucionária se uniram para promover um candidato. Mas não deu o nome.

- Temos que estar atentos porque atitudes assim podem levar à militarização do regime e ao controle político e social. É uma ameaça à sociedade civil - disse. O candidato poupou o atual presidente, Mohammad Khatami, que não tem, segundo ele, poder para mudanças.

Um assessor de Moin disse que membros do conselho, que deveriam apenas monitorar os postos de votação, acabaram se envolvendo na apuração.

A Karroubi, Ahmadinejad mandou recado um curto e grosso:

- É óbvio que quem perdeu vai protestar. O Sr. Karroubi, que é um clérigo e usa trajes sagrados, deveria ter mais cuidado ao fazer seus comentários.

Não houve resposta oficial às denúncias, mas quando vieram à tona, o presidente Khatami se apressou em vir a público para tranqüilizar a população.

- Quero agradecer ao Ministério do Interior e garantir que os votos estão sendo contados com cuidado. Se alguém disser algo contrário, está errado.

Em Paris, iranianos protestaram contra as eleições, que consideram uma ''farsa''.