Título: Democracia neles
Autor: Ubiratan Iorio
Fonte: Jornal do Brasil, 27/06/2005, Outras Opiniões, p. A11

O tsunami de imoralidade que vem deixando pasma nossa sociedade pode ser olhado por um prisma, digamos, menos pessimista, apesar do velho e malicioso dito de que um pessimista nada mais é do que um otimista bem informado... Refiro-me ao verdadeiro banho de democracia a que estamos assistindo, à lavagem pública de toda a sujeira provocada pela lama de denúncias de corrupção envolvendo o outrora ''ético'' Partido dos Trabalhadores e seus aliados de ocasião, comprados, ao que tudo sugere, a peso de ''mensalão''. Corruptores e corruptos, na verdade, são farinha do mesmo saco, enchido pela vontade de poder nietzschiana, já que o objetivo dessa gente que está envergonhando o país é a permanência no poder a qualquer preço, para isso pouco importando os meios, mesmo que estes firam a honra, a dignidade e o mínimo de respeito para com os eleitores.

Democracia neles! Não vivêssemos em um regime democrático - apesar de todas as falhas, ditas, escritas e reescritas, de nosso sistema político-partidário - todas essas operações execráveis não teriam, trazidas pela imprensa, vindo à tona e chegado ao âmago da opinião pública. O famoso livro de Karl Popper, A sociedade aberta e seus inimigos, deveria ser leitura obrigatória em todos os cursos de graduação em Ciências Humanas, mas, como muitos dos professores de nossas universidades padecem de sinistropatia crônica, uma diátese caracterizada pela predisposição mórbida a enaltecer apenas autores marxistas, poucos brasileiros o conhecem. De fato, o que está ocorrendo no Brasil, nestes tristes episódios, é uma lavagem de roupa suja, operação exigida por todas as pessoas de bem, que não apenas esperam, mas exigem, com a autoridade de quem são chamadas a votar a cada dois anos, que as apurações prossigam até o fim, tanto nas CPIs ''chapas brancas'', quanto na Polícia Federal e por parte do Ministério Público. Somente um regime democrático torna isto possível! O que se deve buscar, agora, é aperfeiçoar nossas instituições, escoimando-as de velhos defeitos, para que nossa democracia, já consolidada, saia aperfeiçoada e fortalecida. Nada de ''fora Lula e o PT'', mas de ''fiquem, mostrem-nos seu despreparo''!

É de assustar que o PT não tenha afastado, pelo menos até que sua eventual inocência pudesse ser atestada pelas averiguações, além do sr. Dirceu, o seu presidente, o secretário-geral e o tesoureiro; que o presidente Lula não tivesse tempestivamente tomado, assim que soube das denúncias, as providências que se esperariam de um chefe de Estado, o que o torna, no mínimo, sujeito à acusação de complacência com ''companheiros'' sem qualquer ética e que confundem seu partido ou seita com o próprio Estado, como ocorre em sua amada Cuba e nos regimes ''democráticos'' de partido único; que não se tenha anunciado, desde já, a privatização da ECT, do IRB e de dezenas de outras estatais que, a despeito da seriedade de seus funcionários de carreira, sugam as já exânimes forças da economia com nomeações, para cargos de confiança e de diretoria, de indicados dos políticos que chafurdam na excrescência de um poder apodrecido; que o ex-ministro Dirceu, alvo de acusações seriíssimas, tenha, ao ser forçado a deixar o cargo que ocupava no governo, acenado com alianças do partido com ''movimentos sociais'', tal como o formado pelos fora-da-lei que encabeçam o MST, cuja única finalidade é implantar um modelo maoísta aqui; e que, entre outros fatos geradores de perplexidade, o presidente e outros não tenham atentado para os perigos de aproximações e alianças com gente desse tipo, o que poderá transformar o Brasil em uma nação dividida, tal como o histriônico ''sargentão'' Hugo Chávez, que leva nas axilas, por onde quer que vá, aquele livrinho - que deve exalar um almíscar insuportável! - que chama de Constituição bolivariana, fez com a Venezuela.

O papel da imprensa, da PF e do MP, neste grave momento, é, mais do que nunca, fundamental e imprescindível. Democracia neles, os inimigos da sociedade aberta!