Título: Mal na fotografia
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Fonte: Jornal do Brasil, 24/06/2005, Internacional, p. A8

Pesquisa do Pew Center mostra que imagem dos americanos, em especial de Bush, no mundo, é pior que a da China.

WASHINGTON - Dois anos depois da invasão ao Iraque, a imagem dos Estados Unidos no exterior é tão esfarrapada que até a China, governada por uma ditadura comunista, é vista de maneira mais favorável do que os EUA em muitos países. Segundo a pesquisa do americano Pew Research Center for the People & the Press, a imagem ruim persiste, mesmo depois de o governo George Bush ter promovido a democracia em vários países e depois de ter contribuído com centenas de milhões de dólares em ajuda humanitária para os sobreviventes do tsunami que arrasou nações na costa do Oceano Índico, em dezembro do ano passado.

- É impressionante ver como a opinião pública européia tem os EUA em tão pouca conta, especialmente em comparação com a China - diz Andrew Kohut, diretor do Pew Research Center.

Onze dos 16 países que participaram da pesquisa - Grã-Bretanha, França, Alemanha, Espanha, Holanda, Rússia, Turquia, Paquistão, Líbano, Jordânia e Indonésia - têm uma visão mais favorável de Pequim do que de Washington. As exceções ficam por conta de Índia e Polônia. Os canadenses, por sua vez, vêem tanto o China quanto os EUA favoravelmente.

A sondagem, divulgada ontem, encontrou suspeita em relação aos EUA em várias nações onde as pessoas questionavam a guerra ao Iraque. Além disso, cresce a cautela sobre a guerra ao terrorismo, lançada por Washington.

- A invasão ao Iraque deixou uma impressão duradoura nas pessoas, que suspeitam das intenções dos americanos. Assim, fica mais difícil para a Casa Branca convencer a opinião pública mundial - analisa Shibley Telhami, pesquisadora do Brookings Institution.

A imagem dos EUA derrapa desde março de 2003, confirma a pesquisa do Pew Research Center, e não apresenta retomada otimista em lugares como Grã-Bretanha, França, Alemanha e Espanha. Em países muçulmanos como a Jordânia e Paquistão, ela continua ruim. Mas a Indonésia, que tem a maior população islâmica do mundo, agora vê os EUA de maneira mais simpática, depois de ter recebido doações americanas após a tragédia do tsunami. O mesmo acontece com a Índia. Os russos não deixaram de sentir simpatia pelos EUA, desde a queda do comunismo.

Já a liderança de Washington na guerra contra o terror tem um relativo apoio de britânicos, franceses, alemães, canadenses e espanhóis, mas entre paquistaneses, turcos e jordanianos, se mantém baixo.

- Há um reconhecimento geral que o terrorismo é um terrível problema que atinge lares em todos os países - afirmou John Danforth, ex-embaixador dos EUA na ONU. - Mas os países muçulmanos tratam da questão com cautela.

A pesquisa detectou ainda uma reação positiva nos países europeus em relação à campanha de Bush por democracia no exterior. Apesar de os habitantes das nações islâmicas também tratarem desta questão com cuidado, se mostram abertos à idéia de democracia em seus países. Para Danforth, os recentes atos eleitorais no Oriente Médio são um exemplo disso:

- Devemos continuar os esforços por igualdade entre cidadãos, mas temos que fazer um trabalho de comunicação melhor do que o atual - opina.

Para a maioria das pessoas que responderam às perguntas do Pew, os EUA não levam em consideração o interesse de outros países ao tomarem decisões de política internacional. Também afirmaram que gostariam de ver outra nação alcançar o poderio militar americano, apesar de poucos citarem a China neste papel. Os entrevistados também acreditam que a invasão ao Iraque tornou o mundo um lugar mais perigoso. Por isso, os estrangeiros que têm uma visão ruim dos EUA costumam citar pessoalmente Bush como a causa deste risco, e não um problema geral da política na Casa Branca.

Madeleine Albright, secretária de Estado quando Bill Clinton era presidente, acrescenta que a grande maioria dos estrangeiros está descontente com Bush.

- A reeleição do republicano só os fez enxergar os EUA de maneira menos favorável - afirma.

As sondagens foram realizadas em 16 países, do fim de abril ao fim de maio. No geral, a média de entrevistados em cada nação foi de mil pessoas: um pouco mais na Índia e na China e um pouco menos na Europa. A margem de erro é de dois a quatro pontos percentuais, dependendo do tamanho da amostragem.

Os menores índices de aprovação geral dos EUA foram registrados na Jordânia (21%), Turquia e Paquistão (23%). A Polônia (62%) é quem mais respalda Washington.

Sobre o modo de ser dos americanos em geral, os franceses são os que mais os consideram trabalhadores: 89%. Entre os canadenses, 64% acham os vizinhos violentos e 53%, rudes. Para 42% dos russos, os ex-rivais da Guerra Fria são ''imorais''.

Mesmo ciente de que a ocupação ao Iraque é motivo de ódio contra os EUA, o secretário de Defesa, Donald Rumsfeld, afirmou ontem que seria um ''erro'' marcar uma data para a retirada das tropas americanas do país árabe, como pediram alguns legisladores republicanos e democratas. Eles sugeriram 1º de outubro de 2006.

- Isto daria um salva-vidas aos terroristas que nos últimos meses sofreram baixas significativas, perderam refúgios e viram o apoio popular diminuído - justificou Rumsfeld, ao ser sabatinado pelo Comitê das Forças Armadas do Senado. - Aqueles que dizem que estamos perdendo esta guerra estão errados. Não é verdade.

O senador democrata Edward Kennedy lembrou a Rumsfeld sobre os ''graves erros e equívocos'' no planejamento da guerra e no pós-guerra do Iraque, que se tornou ''um atoleiro''.

- Não chegou o momento de o senhor renunciar ao cargo? - perguntou Kennedy a Rumsfeld.

O chefe do Pentágono respondeu que apresentou seu afastamento a Bush duas vezes, ambas rejeitadas.

- É decisão dele - argumentou.