Título: Reforma universitária
Autor: Wanderley de Souza
Fonte: Jornal do Brasil, 26/06/2005, Outras Opiniões, p. A14

Desde que o Ministério de Educação lançou a primeira proposta para a reforma do ensino universitário, a comunidade acadêmica vem debatendo o tema de forma apaixonada. Isso reflete por um lado a importância do assunto e por outro o engajamento de uma comunidade altamente mobilizada.

A primeira proposta foi objeto de ampla discussão e muitas sugestões foram levadas em consideração pelo MEC. No dia 30 de maio uma nova versão foi apresentada, para mais uma rodada de debates. Aqui, cabe elogiar a abertura à crítica e a capacidade de entender as divergências por parte do ministro Tarso Genro. Alguns pontos merecem destaque:

A nova proposta enfatiza a modalidade de ensino a distância. Inclusão importante, já que esse modelo pode permitir a rápida ampliação do número de vagas em instituições públicas, sobretudo visando à formação de licenciados em várias áreas do conhecimento. A experiência adquirida pelo Consórcio Cederj, do governo do Estado do Rio de Janeiro, que reúne seis universidades públicas, atesta a validade e a qualidade do ensino a distância.

Certamente haverá reação contrária a essa modalidade, sobretudo por aqueles que defendem o inchaço das instituições públicas, sem compromisso com produtividade acadêmica.

Na nova proposta, continua muito frágil o conceito de universidade. É preciso ampliar as exigências para que uma instituição possa efetivamente receber esse título. Seu corpo docente deve ser majoritariamente constituído por professores com doutorado, trabalhando em regime de tempo integral e engajados em projetos de pesquisa. Não se deve dar tempo para adaptação.

É preciso resgatar o conceito, sempre lembrado por Carlos Chagas Filho, de que a ''universidade é um centro de pesquisa e, porque pesquisa, ensina''. Isso irá estimular alguns centros universitários a investirem para um dia alcançar o status de universidade. É preciso reconhecer a importância dos centros universitários, mas não se deve obrigá-los a desenvolver atividade de pesquisa ou cursos de pós-graduação. Tal atividade deve ser estimulada e não transformada em obrigação. Se formos rígidos no entendimento do que é uma universidade, sua dimensão não tem a menor importância.

Merece aplausos o Art. 29, que incentiva o trabalho cooperativo entre a União, os estados e municípios, no esforço de ampliar o ensino universitário público, e prevê o financiamento, por parte da União, das instituições de educação superior estaduais e municipais, desde que firmado o compromisso de aumentar a oferta de vagas.

Gostaria de ver melhor explicitada a política de democratização do acesso à universidade. O MEC afirma que não houve recuo nesse item e faz menção ao Projeto de Lei regulamentando o assunto, em discussão no Congresso Nacional. A experiência já adquirida com as universidades estaduais do Rio de Janeiro deixa claro que é possível contar com um sistema de cotas que mantenha a qualidade do processo de formação de recursos humanos. Alunos cotistas têm apresentado excelente desempenho em programas de iniciação científica. Pelas informações de que disponho, em breve muitos ingressarão em cursos de pós-graduação.

Por último, destaco a iniciativa do MEC, que tem se tornado mais clara nos pronunciamentos do ministro, que propõe trocar dívidas de estados com a União por investimentos em educação superior, como forma de ampliar a oferta de vagas. Essa proposta é importante e deverá ser objeto de muitos debates. Como era de se esperar, tecnocratas preocupados mais com a questão fiscal, pura e simples, do que com o desenvolvimento do país, já se manifestaram contra. Mas o debate vai ajudar a elucidar as novas questões levantadas pela sociedade e colocar as coisas em seu devido lugar.