Título: Governo tenta barrar investigação
Autor: Paulo Celso Pereira e Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Jornal do Brasil, 30/06/2005, País, p. A3
BRASÍLIA e RIO - Seis dias depois de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva dizer em cadeia nacional de televisão que o governo iria apurar a fundo os casos de corrupção, a bancada governista no Congresso atuou intensamente ontem para evitar que as investigações do mensalão e da CPI dos Correios prosperassem. Ao longo do dia, em várias reuniões, parlamentares governistas se movimentaram buscando alternativas que pegassem a oposição de surpresa. Ao final, uma vitória e uma derrota. O governo conseguiu colocar em votação a CPI do Mensalão restrita à Câmara, para evitar que os senadores participem da investigação da possível venda de votos de deputados, e incluíram no projeto a apuração da possível venda de votos para aprovar a reeleição no governo Fernando Henrique Cardoso, em 1997. Já na CPI dos Correios, a oposição conseguiu pedir a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico do publicitário Marcos Valério, acusado de ser o operador do mensalão. A manobra do governo para criar a CPI do Mensalão restrita à Câmara virou uma guerra, já que o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), havia prometido abrir uma comissão parlamentar mista ainda ontem. Com o objetivo de controlar a comissão, o governo correu contra o tempo para que apenas os deputados investigassem as denúncias contra seus pares, sem a presença de senadores. De quebra, os governistas ainda conseguiram incluir no projeto a investigação das denúncias de que o governo de Fernando Henrique teria pago, em 1997, R$ 200 mil, por deputado, para que votassem pelo projeto de reeleição. As denúncias levaram à renúncia de dois deputados.
Para votar a criação da CPI, era preciso, no entanto, liberar a pauta que estava trancada pela Medida Provisória 249, destinada a criar a Timemania, loteria que ajudaria os clubes de futebol. O presidente da República entrou em campo e mandou rodar uma edição extra do Diário Oficial, em que revogava a MP 249. Sem a MP que trancava a pauta, o governo conseguiu colocar em votação, no início da noite, a CPI do Mensalão na Câmara. Mas até o fim da noite de ontem, governo e oposição ainda travavam uma batalha na Casa. A oposição tentava retardar a votação, contando que o Senado crie uma comissão mista hoje.
¿ Esta foi a mais sórdida manobra feita por este governo até hoje. Mas ela mostra coerência. Coerência por que há dois anos e meio o PT e o governo tentam evitar qualquer investigação ¿ afirmou o deputado Antonio Carlos Mendes Thame (PSDB-SP).
Mais cedo, o governo perdeu a batalha com a oposição e a CPI dos Correios aprovou a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico do publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza, acusado pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) de ser um dos financiadores do mensalão. Foram quatro horas e meia de brigas, reuniões tensas a portas fechadas, mas com gritos que se ouviam no plenário da CPI. Os governistas só aceitavam a quebra dos sigilos após o depoimento de Valério, marcado para a próxima quarta. A oposição propôs abrir mão de outros requerimentos para conseguir quebrar os sigilos.
No fim da sessão, o requerimento foi aprovado por 22 votos, sem objeções, delimitando a quebra para os últimos cinco anos, incluindo um período do governo de Fernando Henrique Cardoso. Também foram aprovadas as quebras de sigilo de Arthur Waschek, acusado de contratar os arapongas que filmaram Maurício Marinho.
A bancada governista, mais especificamente o PT, concordava com a abertura dos sigilos de Arthur Waschek e de Maurício Marinho. Mas no caso de Valério, apelavam para práticas anteriores, segundo as quais sigilos só são quebrados após os suspeitos prestarem depoimentos.
¿ É engraçado, eles só aceitam quebrar sigilo das piabinhas deste mar de lama. Assim, fica fácil ¿ acusou Heloísa Helena.
O deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP) mostrou dados do SIAFI segundo os quais as agências de Valério firmaram com a administração direta contratos de R$ 39,4 milhões durante os anos de 2001 e 2002, contra apenas R$ 14 milhões nos períodos de 2003 e 2004.
O presidente da CPI , senador Delcídio Amaral (PT-MS), remarcou para hoje os depoimentos do ex-diretor dos Correios Antônio Osório (Administração) e Eduardo Medeiros (tecnologia), previstos para depor ontem. A CPI vai ouvir também hoje o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ).