Título: Novos eleitores, novos democratas
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Fonte: Jornal do Brasil, 22/10/2004, Internacional, p. A-7

Passou desapercebida a divulgação, no início do mês, do relatório de Direitos Civis do governo George Bush, preparado pela Comissão de Direitos Civis e cuja apresentação está prevista na lei. O texto foi abafado pelo governo republicano mas publicado no site da Comissão. ¿Bush não demonstrou liderança ao lutar pelas questões civis, nem tomou atitudes condizentes com suas palavras¿, diz o documento.

A Casa Branca despreza a Comissão de Direitos Civis desde o relatório de junho de 2001, sobre as práticas eleitorais na Flórida durante a campanha de 2000. Naquela época a conclusão foi a de que ¿a generalizada privação dos direitos dos eleitores ¿ e não o concorrido empate ¿ foi o acontecimento mais extraordinário nas eleições da Flórida. Os direitos dos eleitores neste estado foram negados, em especial aos negros¿.

Esforços para mobilizar ou anular eleitores afro-americanos ou hispânicos atingiram níveis sem precedentes. Os republicanos em Ohio, por exemplo, tentaram invalidar registros democratas porque teriam sido feitos em papel de gramatura irregular. A manobra foi rejeitada pela Corte Federal. Da Pensilvânia ao Arizona, uma firma republicana de consultoria desencoraja novos eleitores democratas a participar da eleição.

Enquanto isso, o Partido Democrata tem mais de 10 mil advogados a postos para defender o direito ao voto. Dois mil dos juristas estão na Flórida, para onde grupos de direitos civis estão enviando mais 6 mil defensores. Bush x Gore ainda é uma ferida aberta e a batalha pelo direito ao voto e pela própria democracia está sendo disputada, mais uma vez.

Desde 2002, quando os republicanos usaram o terror para manchar o patriotismo dos democratas nas eleições para o Congresso, o partido do senador John Kerry começou a ganhar apoio de grupos civis. Mais de 100 mil ativistas entraram na briga. Só em Ohio, 300 mil novos eleitores democratas se inscreveram, contou Cecile Richards, diretora do America Votes.

As pesquisas não contam os novos eleitores, que não têm registro passado. Não medem cerca de 6% da população, que vão votar nos democratas numa proporção de quase dois para um.

Já a sondagem da Democracy Corps contabiliza os novos eleitores. Há quatro meses, eles eram 1% do universo entrevistado. Há um mês, chegavam a 4%. Hoje, são 7%, continuam aumentando e vão votar mais em Kerry (61%) do que em George Bush (37%).

A aprovação da política de emprego do presidente caiu para 47% nesta pesquisa. Para um ocupante, menos de 50% de aprovação significa derrota. Bush ficou sem fazer campanha em Ohio por três semanas, num estado onde o desemprego não pára de subir.

¿ Não há outra explicação para a ausência, a não ser evitar estar lá ¿ diz Stanley Greenberg, que fazia as enquetes da campanha de Bill Clinton, na campanha de 1992.

Segundo a Democracy Corps, quanto maior o número de novos eleitores, maior o número de democratas.

Desde 11 de setembro, Bush evoca imagens de nuvens de cogumelos, cruzadas, seguidores do demônio, sombras e um universo de morte. O imaginário induz a uma dinâmica de paralisia diante da ameaça. Um temor sem fim pede uma fé sem limites.

Mas Bush ainda se encontra na defensiva, agora que o The New York Times divulgou os planos para o segundo mandato: uma Suprema Corte ainda mais de direita, a privatização do seguro social e a entrega de terras nacionais às companhias de petróleo. Kerry quis discutir as questões e Bush disse que ele estava praticando uma ¿política do medo¿. Mas, no dia seguinte, foi o vice Dick Cheney que falou de terroristas explodindo bombas nucleares nos EUA e ofereceu Bush como salvador do apocalipse.

¿Nenhuma paixão é tão eficiente como o terror, em roubar da mente o poder de ação e justificativa¿, escreveu Edmund Burke. Mas nem mesmo a possibilidade de destruição vai reprimir o eleitorado.