Título: Um desafio para José Dirceu
Autor: Sérgio Pardelas
Fonte: Jornal do Brasil, 01/07/2005, País, p. A2

BRASÍLIA - Com um hematoma sob o olho esquerdo, o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) subiu ontem ao palco da CPI dos Correios no Congresso, falando mais uma vez ao ¿povo brasileiro¿. Afirmou que aceita participar de uma acareação com o deputado José Dirceu e o tesoureiro do PT, Delúbio Soares e deu novas pistas sobre o pagamento do mensalão. Segundo o deputado, parte dos pagamentos do mensalão era feito em uma agência do Banco Rural, no nono andar da torre norte do Brasília Shopping. Ele garantiu que os registros de entrada no prédio onde fica o banco poderiam revelar os parlamentares que participavam do esquema.

Ontem mesmo, parte da denúncia pôde ser confirmada. Pelo registro do prédio, o publicitário Marcos Valério esteve, no dia 19 de agosto de 2003, na agência do Banco Rural que funciona no shopping. Segundo dados do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), neste mesmo dia foram sacados naquela agência R$ 150 mil da conta da DNA Propaganda, empresa da qual Valério é sócio.

Durante o depoimento, Jefferson procurou levar Dirceu para o centro da discussão da CPI:

¿ Tudo o que tratei foi com Dirceu. Tudo o que conversei, até de negócios de política e os R$ 20 milhões, o fiz com ele.

A partir das declarações do deputado, o senador Jefferson Peres (PDT-AM) afirmou que vai apresentar requerimento para realizar uma acareação entre o petebista, o ex-ministro da Casa Civil e o tesoureiro do PT, Delúbio Soares. Para o senador, a medida é importante para saber até que ponto Dirceu comandaria ou supervisionaria o mensalão.

Durante a primeira parte do depoimento, que durou 38 minutos, Jefferson relacionou o Banco do Brasil à mesada supostamente patrocinada pelo Planalto. Segundo ele, 60% das notas repassadas a ele como recurso de campanha, carregavam a etiqueta do BB.

A metralhadora giratória do parlamentar também teve como alvo o PT. Jefferson atacou o partido ao lamentar ter visto uma legenda que no passado ¿fazia da investigação sua afirmação de luta¿ empenhado em impedir a quebra de sigilo de Valério, ¿versão moderna e macaqueada do PC Farias¿.

¿ Muitos dos que exorcizavam aqueles fantasmas (à época de Fernando Collor), hoje se abraçam com eles.

Além de sugerir que a Abin atuaria sob a orientação de integrantes do governo, lançou mão da ironia ao dizer que a agência de inteligência foi capaz de descobrir um petequeiro leviano (Maurício Marinho, ex-chefe de departamento dos Correios) que pegava R$ 3 mil, mas não conseguiu descobrir os saques diários de R$ 1 milhão de Marcos Valério.

Jefferson também pontuou as questões políticas que, na sua avaliação, afligiriam o país, como o financiamento de campanhas. Munido das prestações de contas à Justiça Eleitoral dos atuais deputados e senadores, disse não haver eleição à Câmara orçada em menos de R$ 1 milhão. E para se eleger senador, acrescentou, ninguém gastaria menos de R$ 2 milhões a R$ 3 milhões. Mas as declarações registrariam gastos, em média, R$ 100 mil (deputados) e R$ 250 mil ( senadores).

Como forma de corrigir a distorção do processo eleitoral, Jefferson defendeu a reforma política. Avalia que seria imperativo reduzir o número de deputados e senadores por estados, além de acabar com a figura do suplente.

Com um curativo no olho feito pela enfermeira do Senado, em virtude de um suposto choque com um armário, Jefferson não titubeou sobre a proposta de acareação feita por Perez: ¿A hora que os senhores quiserem, venho para a acareação¿.

O deputado repetiu que as indicações políticas para cargos de estatais e ministérios eram acertados pelo secretário-geral do PT, Silvio Pereira e chancelados por Dirceu. Afirmou que a prática o levou a cunhar a expressão: ¿nos dão a cabeça, mas nos tiram o corpo¿.