Título: Ameaçado referendo sobre venda de armas
Autor: Rodrigo Vasconcelos
Fonte: Jornal do Brasil, 01/07/2005, Brasília, p. D4
É incerta a realização, ainda este ano, do referendo popular sobre o comércio de armas de fogo e munições no Brasil, previsto para o próximo mês de outubro. De acordo com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Carlos Velloso, para que o referendo fosse feito ainda este ano, o Congresso deveria aprovar até ontem o projeto de decreto legislativo que autoriza a realização do referendo. Mas o projeto não foi votado. Um acordo entre as lideranças parlamentares estabeleceu que se votaria apenas a medida provisória que autoriza o pagamento dos salários das tropas enviadas ao Haiti. A discussão do projeto foi adiada para a terça-feira e promete mobilizar manifestantes favoráveis e contrários à realização da consulta popular.
Cerca de 50 mães participaram ontem de uma vigília no Salão Verde da Câmara dos Deputados. Flores, fotos, camisas e outros pertences pessoais de vítimas de crimes cometidos por meio de armas de fogo foram dispostos em formato de cruz e devem permanecer no local até que o projeto do referendo seja votado.
Desde o início da campanha de entrega voluntária de armas de fogo, no dia 16 de agosto do ano passado, 3.351 armas foram entregues às autoridades no Distrito Federal, das quais 744 armas neste ano. Outras 3.066 armas foram apreendidas desde o início de 2004 - até ontem, 982 armas apreendidas em 2005. A Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal não informou o número de mortes por armas de fogo em 2004 e 2005. Mas o número é elevado. De acordo com dados nacionais do Ministério da Saúde, armas de fogo foram o meio empregado em 63,9% de todos os homicídios registrados pelos Sistemas de Informação de Mortalidade e de Internação Hospitalar em 2002.
É para diminuir esse percentual que integrantes de ONGs e familiares de vítimas lutam para que a população vá às urnas se manifestar sobre o comércio de armas em outubro.
- Fazer o referendo o mais rápido possível é fundamental para decidir que tipo de país queremos para os nossos filhos, se vamos permitir o comércio da morte ou se desejamos construir um país onde eles vão poder viver em paz'', diz Valéria de Velasco, presidente do Convive, Comitê Nacional de Vítimas de Violência.
Familiares de vítimas de armas de fogo concordam com a avaliação de Valéria. Para eles, a aprovação do projeto é a oportunidade de evitar que outros venham a passar pela situação dolorosa de perder um ente querido.
- Se o desarmamento já tivesse sido feito, talvez eu pudesse ter meu filho ainda hoje - lamenta Cléia Lopes, mãe de Thiago Lopes Ramos, morto aos 16 anos por um disparo acidental, quando ele e amigos brincavam com a arma dos pais de um deles.
O deputado Alberto Fraga (sem partido/DF) não acredita, entretanto, que o referendo e mesmo o desarmamento sejam medidas eficazes no combate à violência. De acordo com o parlamentar, o referendo deveria ser realizado em 2006 para evitar um gasto, segundo ele, injustificado, de meio bilhão de reais.
- O custo do referendo é alto demais. Não se justifica gastar R$ 519 milhões, se desde o início da campanha do desarmamento as fábricas venderam apenas 1.044 armas em todo o país. Quem tinha de se desarmar, já se desarmou. Esse referendo é um projeto eleitoreiro do PT, infelizmente bancado pela Rede Globo e por aquela ONG milionária, a Viva Rio - afirma o parlamentar, que nega sofrer influência das doações feitas pela fabricante de munições CBC à sua campanha eleitoral em 2002.
Hoje, o deputado entrou com quatro emendas à medida provisória 253, a MP do Desarmamento. Uma delas pretende revogar o artigo que prevê a realização do referendo popular.