Título: PT adia corte de cabeças
Autor: Sérgio Pardellas
Fonte: Jornal do Brasil, 04/07/2005, País, p. A3
O Partido dos Trabalhadores (PT) avalia cortar na própria carne num último esforço de salvar a legenda da mais profunda crise em que mergulhou desde o manifesto de sua fundação em fevereiro de 1980. Mas a medida, desta vez, foi adiada por mais 72 horas. A reunião da Executiva Nacional do partido prevista para ontem só acontecerá amanhã. A decisão justificada oficialmente no site do PT, pela impossibilidade de alguns membros estarem presentes, gerou inconformismo em petistas, que temem o rumo a ser seguido pela sigla.
Em conversas realizadas durante o fim de semana entre integrantes da cúpula petista, depois da denúncia da revista Veja de que o publicitário Marcos Valério foi avalista de um empréstimo de R$ 2,4 milhões que o partido obteve em 2003 junto ao Banco BMG, concluiu-se que a permanência do tesoureiro Delúbio Soares e do secretário-geral Sílvio Pereira no PT tornou-se insustentável. Até o início da noite de ontem, a tendência era de que o afastamento dos dois fosse anunciada amanhã na reunião extraordinária da Executiva do PT em São Paulo, o que ensejaria de imediato a reformulação da Executiva do partido. O presidente do PT, José Genoino, que resiste a renunciar ao cargo e se diz traído por Delúbio, seria preservado, ficando responsável por nomear uma Comissão Executiva provisória responsável por conduzir o partido até as eleições diretas em setembro.
O partido, porém, ainda não bateu o martelo. As negociações para uma saída concordada e menos desgastante possível para o PT prosseguirão durante todo o dia de hoje. Entre as hipóteses em discussão ainda estão a renúncia coletiva de toda a Executiva, incluindo o presidente Genoino, e a antecipação das eleições do partido para daqui a 15 dias, com o Diretório Nacional se encarregando de eleger a nova Executiva à luz da crise.
Ontem, as principais lideranças nacionais do partido não escondiam o desconforto com a atual situação. O ex-ministro da Educação, senador Cristovam Buarque, defendeu a instalação de uma Comissão Partidária de Inquérito (CPI) para investigar as denúncias que pesam sobre o partido. Essa ''CPI'' interna, sugeriu o senador, não poderia ser composta por integrantes da atual direção, mas por ''notáveis'', pessoas acima de qualquer suspeita, de alta respeitabilidade, ''petistas, como Antônio Cândido, e não petistas também''.
- Hoje, infelizmente, todos os que foram candidatos pelo PT estão sob suspeição - afirmou Cristovam Buarque.
Para o senador, a crise transcende a questão ética. Segundo ele, faltou ao PT definir com clareza suas prioridades ao desembarcar no poder.
- É uma crise da capacidade de usar a democracia para mudar o Brasil para melhor. Não bastam pessoas honestas. Precisamos também de pessoas com capacidade e propostas para mudar o país - defendeu.
O deputado federal Chico Alencar (PT-RJ) também defende o desligamento do partido de todos os envolvidos nas denúncias do deputado Roberto Jefferson:
- Os apontados têm de se empenhar em prestar esclarecimentos nas instâncias que investigam o escândalo do mensalão. É bom para o partido que eles se afastem. Eu estou sugerindo isso.
A opinião de Alencar é partilhada pelo deputado federal Dr. Rosinha (PT-PR).
- É inaceitável que os três [Genoino, Delúbio e Sílvio]continuem a falar em nome do PT. Não somos cúmplices - afirma o deputado.
Outros integrantes do partido já manifestaram descontentamento com a atitude do partido em defender os apontados nas denúncias do deputado Roberto Jefferson. O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) chegou a defender publicamente o afastamento de Delúbio Soares do partido até que as averiguações sejam realizadas.