Título: PMDB negociou cargos públicos com Valério
Autor: Paulo de Tarso Lyra e Sérgio Pardellas
Fonte: Jornal do Brasil, 06/07/2005, País, p. A2
O líder do PMDB na Câmara conseguiu, em uma nota com oito pontos, agravar a crise política do PT, colocar uma sombra nas negociações da reforma ministerial e promover o publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza a negociador de cargos no governo federal. Com a intenção de se defender das acusações de que seria um dos beneficiários do pagamento de mensalão, Borba jogou uma bomba no colo do Planalto e mostrou a disposição para ir à guerra, se necessário: - O que discuti com dirigentes do PT e o senhor Marcos Valério é o que lideranças partidárias discutem hoje e sempre: a nomeação de partidários para cargos na administração pública federal - afirma a nota.
No explosivo documento, Borba - que não apareceu ontem na Câmara - afirmou que a única nomeação bem sucedida nas conversas com Marcos Valério foi a do ex-presidente dos Correios, João Henrique, afilhado político do presidente nacional do PMDB, deputado Michel Temer (SP).
- Ele já havia, pela mesma indicação, exercido o cargo de ministro dos Transportes do governo Fernando Henrique - lembrou o líder peemedebista.
O teor da nota do líder do PMDB, na véspera do depoimento de Marcos Valério à CPI dos Correios, foi devastador. O líder do PT na Câmara, Paulo Rocha (PA), correu para o gabinete do líder Arlindo Chinaglia (PT-SP). Saiu escudado pela desculpa de que tinha que coordenar as ações em plenário para não dizer nada. Sobrou para Chinaglia, líder do governo.
- Não acredito que Valério tenha negociado cargos no governo. Nem o Roberto Jefferson, em seus momentos mais agudos, afirmou isso - afirmou o líder do governo.
Para o petista, a nota demonstra um acerto de contas interno, na medida em que Borba joga Temer na fogueira. Na véspera, o presidente nacional do PMDB havia cobrado do líder peemedebista explicações sobre as suspeitas de envolvimento com o mensalão. No documento divulgado ontem, Borba reconheceu que foi à agência do Banco Rural, em Brasília, mas para tratar de assuntos particulares.
- Nunca recebi do senhor Marcos Valério qualquer numerário ou recursos financeiros, limitando-se o relacionamento ao fato de que o mesmo fazia parte do grupo do PT, que exercia influência político-administrativa junto ao governo federal - garantiu.
No final da noite de ontem, o deputado José Borba entregou a liderança do partido na Câmara. Em seu lugar, assumiu o deputado Wilson Santiago (PMDB-PB).
Aliado do Planalto desde que assumiu a liderança do PMDB, no princípio de 2004, Borba verbalizou o que o PT e o governo procuram negar efusivamente nas últimas semanas: que Valério, acusado de ser o operador do mensalão, tinha influência política na gestão de Lula. A nota - que traz duros ataques a Temer e à ala oposicionista da legenda - teve imediata repercussão no Congresso e ameaçava inclusive a negociação entre o Planalto e o PMDB em torno da reforma ministerial.
Borba elaborou o texto em conjunto com um grupo restrito de aliados, entre eles Jader Barbalho. O objetivo principal não era atacar o governo, e sim a ala oposicionista da legenda, liderada por Michel Temer e pelo ex-governador Anthony Garotinho, que tentam retirá-lo do posto.
- Um dos poucos sucessos nas tratativas com o mesmo grupo (PT e Valério) foi para a presidência dos Correios, por indicação de Michel Temer, diz a nota, se referindo a João Henrique, exonerado na esteira da atual crise política.
Borba encerra dizendo que sempre exerceu a liderança do PMDB com a preocupação de ser merecedor da confiança dos companheiros, ''apesar da discordância de parte da bancada''.
Ontem, o presidente do PMDB afirmou ''não saber o motivo'' que levou Borba a assinar a nota. Ressaltou e que o conteúdo do texto pode atrapalhar a reforma ministerial. Disse ainda que uma das intenções de Borba era atingi-lo e negou ter sido o responsável pela indicação de João Henrique de Almeida para a presidência dos Correios.
O presidente do PT, José Genoino, também afirmou, por meio de nota, que nunca participou de reuniões com líderes partidários e Marcos Valério. Afirmou que ''quem representava o PT nas negociações de indicações de cargos no governo federal, como já é público, era o companheiro Silvio Pereira''. Na mesma nota, o secretário-geral do partido, Silvio Pereira (que pediu afastamento do cargo), afirma que somente discutiu cargos no governo com líderes e deputados dos partidos da base aliada.