Título: Perdoar dívidas da África não basta
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 07/07/2005, Internacional, p. A8
O primeiro-ministro britânico, Tony Blair, diz que vai jogar pesado para fazer os países que integram o G8 (as sete nações mais industrializadas e a Rússia) aumentarem o máximo possível a ajuda financeira para a África. Blair diz que vai ''pressionar'' o G8 e sabe que vai ter que lidar com polêmicas. Também vai conduzir o primeiro dia de trabalho do grupo, hoje, na Escócia, tendo em mente desafio tão complexo quanto à falta de consenso em torno da ajuda: mesmo que se decida pelo perdão das dívidas externas de todas as nações daquele continente, a medida, isolada, não é suficiente.
Esse perdão poderia liberar recursos para a construção de escolas e hospitais, mas o impacto não seria tão dramático como inicialmente aparenta. Poucos países africanos esperam tirar vantagem da medida.
- Estes empréstimos são não-dedutíveis, então o acordo do G8 é como se fosse uma progressão natural - afirma Richard Dowden da School of Oriental and African Studies, na Grã-Bretanha. - É importante, mas não vai salvar a África.
Estimulado por Tony Blair, o G8 deve endossar um acordo alcançado no mês passado para retirar US$ 40 bilhões da dívida que 18 nações pobres - 14 delas na África - têm com credores internacionais.
Segundo analistas, o perdão do débito deve fortalecer os cofres dos governos africanos em US$ 1,5 bilhão ou US$ 2 bilhões por ano. Por todo o continente, isso significa que os chefes de Estado podem aumentar os gastos com o povo. Mas a quantia é pouca se comparada com as necessidades de 900 milhões de africanos.
- O perdão é importante, mas não substitui a discussão de problemas de desenvolvimento mais graves - opina Princeton Lyman, pesquisador do Council on Foreign Relations, em Washington.
Entre as barreiras para o desenvolvimento estão os subsídios das nações ricas, particularmente no setor agrícola, que fazem as mercadorias destes países mas baratas no mercado global do que os produtos da África, onde paga-se menos pela mão-de-obra. Os ricos - principalmente a União Européia, os Estados Unidos e o Japão - gastam aproximadamente US$ 350 bilhões por ano em proteção e subsídios agrícolas, revelou a Comissão para a África, em relatório pedido por Blair para ajudar a acabar com a pobreza no continente africano. A quantia é 16 vezes mais do que o mundo desenvolvido dá de ajuda para a África.
A maior parte dos empréstimos do Ocidente foram tomados durante a Guerra Fria, quando os líderes eram ''recompensados'' por seu comprometimento contra o comunismo em vez de suas habilidades econômicas e organização política.
- Muitos desses empréstimos não foram usados para aplacar as necessidades. O dinheiro acabou em contas bancárias privadas da Suíça e Londres - critica Dowden.
Agora, depois da queda do Muro de Berlim, os países ricos estão aumentando seu compromisso de ajudar os bons governos e a diminuir a corrupção. Mas anular dívidas antigas até hoje só beneficiou as nações mais pacíficas e bem administradas da África, enquanto os casos mais difíceis permanecem.
Blair desafiou os Estados do G8 a dobrarem a ajuda para a África dos atuais US$ 25 bilhões para US$ 50 bilhões até 2010, além de aumentar as doações para 0,7% de seus PIBs até 2015.
Depois de inicialmente resistir ao apelo, o presidente americano George Bush já anunciou que está dobrando a ajuda até 2010 - de US$ 4,3 bilhões para US$ 8,6 bilhões. No entanto, ativistas anti-pobreza criticam a Casa Branca pelo fato de que os US$ 8 bilhões prometidos estão US$ 6 bilhões abaixo do que propõe a meta fixada por Blair. (com Dow Jones Newswires)