Título: Além do Fato: Os riscos dos fundos DI
Autor: Ricardo Leal
Fonte: Jornal do Brasil, 07/07/2005, Economia & Negócios, p. A18
Já ouvi muita gente dizer que os fundos DI não oferecem risco. Tanto quem investe quanto, pior ainda, quem orienta investidores. Também já vi gente atribuindo o maior risco destes fundos à possibilidade de variação do valor do fundo no curto prazo. Eu não posso concordar com estas visões e explico por quê. Tomemos dois dos tipos de risco de um fundo de investimento: um decorrente da volatilidade do preço dos títulos que compõem um fundo e outro que vem do risco de crédito. Falemos inicialmente deste último. O risco de crédito advém da capacidade e do desejo de pagar. Os fundos DI são em grande parte constituídos de títulos públicos federais cuja remuneração é pós-fixada em função do resultado acumulado da taxa Selic. Além destes títulos, os fundos também podem conter outros de emissores privados, tais como CDB dos bancos e títulos emitidos por empresas. Entretanto, o fato é que os títulos públicos federais com remuneração pós-fixada pela Selic, especialmente as Letras Financeiras do Tesouro (LFT), são a maior parte dos títulos dos fundos e, portanto, o risco destes fundos advém do governo.
Assim, a pergunta a se formular seria: são os títulos do Tesouro brasileiro totalmente seguros? Há risco de crédito considerável? Ou seja, será que se pode não receber o que é devido? Uma resposta positiva a estas perguntas teria conseqüências seriíssimas. No prazo de um ou poucos anos, julgo que não há risco de um calote como o da Argentina. Entretanto, é fato que a dívida pública não pára de subir em termos absolutos e que os nossos juros, como ninguém pode ignorar, são elevadíssimos. Se os juros reais andam a mais de 10% ao ano, então é porque há um risco elevado.
Os juros podem ser elevados por conta de outros fatores também, tais como a escassez de poupança, mas isto alimenta o risco de financiamento do governo. Por isso, não creio que não haja risco de crédito em um país onde o governo tem que tomar dinheiro a mais de 10% de juros reais ao ano.
O risco de crédito existe e é elevado. Mesmo no exterior, o adicional de juros que o Brasil tem que pagar em dólares, além do que paga o tesouro dos EUA para prazos similares, é da ordem de 5% ao ano, maior do que o que bancos americanos com a mesma classificação de risco de crédito do Brasil têm que pagar (não mais que 3% ao ano). Por isso, julgo que os fundos DI, bem como quase todos os demais fundos, correm um risco sério e de difícil diversificação para a maioria dos brasileiros que é o risco de inadimplência do governo federal, por mais improvável que isto possa parecer hoje em dia. Se perguntado se o fundo DI tem risco, eu diria: claro que sim. Como um fundo que remunera a taxas tão elevadas não teria risco? Ou o Brasil segue uma lógica financeira diferente da dos demais países?
Finalmente, cabe um comentário a respeito do outro tipo de risco, o da volatilidade do preço dos títulos que compõem o fundo DI. Este tipo de risco, hoje, é realmente baixo, embora há pouco tempo, por conta de mudanças nas regras de como se apura o valor de mercado dos títulos, alguns grandes fundos DI tenham sofrido variações desfavoráveis substantivas. Não acredito que isto torne a acontecer e atribuo aos fundos DI um baixíssimo risco de volatilidade de preço hoje.
A ameaça existente, como um asteróide que ruma para a Terra, é a probabilidade de inadimplência federal. Se ela se concretizar um dia, mesmo que não seja nesta década, como podemos nos proteger? Afinal, a maioria de nós poupa para um futuro um tanto distante também.
* Professor do Instituto Coppead de Administração da UFRJ