Título: Íris Rezende: a anunciada volta do PMDB histórico
Autor: Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Jornal do Brasil, 25/10/2004, País, p. A-2

Nas pesquisas, ex-governador tem vantagem folgada sobre candidato do PT

Lideranças políticas tradicionais foram esquecidas nas urnas de 3 de outubro. Não é o caso de Íris Rezende Machado, 70 anos. Um dos fundadores do PMDB, lidera as pesquisas de preferência do eleitorado de Goiânia, uma diferença tranquila em relação ao adversário petista Pedro Wilson. Confirmados os índices em 31 de outubro, sairá da campanha em ascensão no Estado e no partido. Até agora, o PMDB elegeu o dirigente municipal de Campo Grande. Além de Goiânia, na segunda etapa do processo eleitoral, disputa o comando de Teresina, no Piauí. Iris é um político cauteloso com números. O favoritismo variável entre 19 e 22 pontos percentuais dos levantamentos de opinião pública não arrefecem seu ânimo. Passa os dias percorrendo os bairros da capital da Goiás. Não esqueceu as duas derrotas recentes - para o governo estadual, em 1998, e para o Senado, em 2002.

''Jamais senti uma dor tão grande quanto a da derrota em 1998. E nada me ensinou tanto'' - admite.

Militante estudantil, Iris revelou-se político em 1965, quando se elegeu vereador. Sempre pelo PMDB, quatro anos depois, tornou-se prefeito pela primeira vez. Cassado pelo regime militar, dedicou-se à advocacia. De volta aos palanques, em 1982 elegeu-se governador de Goiás, na primeira eleição direta depois do ciclo de presidentes militares. Foi ministro da Agricultura, do governo de José Sarney, e da Justiça durante o período Fernando Henrique Cardoso. Em 1990, reelegeu-se governador e, quatro anos depois, senador. De sua cobertura, em Goiânia, tem uma vista privilegiada da cidade. ''Meu berço político é aqui'', resume, apaixonado.

- Como o senhor avalia as pesquisas favoráveis?

- Goiânia é meu berço político. Aqui pratiquei política estudantil, me elegi pela primeira vez vereador, depois deputado estadual e minha terceira eleição disputada foi para prefeito. Impulsionamos um trabalho participativo que deixou marcas positivas. Não descuidei de Goiânia. Quando prefeito e governador atuamos em todas as frentes de trabalho.

- Como surgiu a idéia de ser candidato?

- De repente, meu nome começou a ser lembrado nas pesquisas espontâneas. Já na terceira pesquisa, sem que eu me declarasse candidato, meu nome já era o primeiro. Quase ganhamos no primeiro turno. No segundo turno, todos os partidos que apoiavam o candidato do governador, o deputado Sandes Júnior (PP), decidiram aderir ao atual prefeito. Comigo ficaram três forças: PDT, parte do PFL e PTC. Estamos guardando uma diferença de 20 pontos. Mas é uma luta pesada porque contra mim estão os três poderes - federal, estadual e municipal.

- O PT estaria fazendo um jogo pesado?

O que está acontecendo aqui é uma verdadeira selvageria. Boatos, ondas, agressões, injúrias, material apócrifo, sem o mínimo respeito à dignidade e à honra. Nunca vi coisa igual, tamanha falta de responsabilidade, de compostura, de decência.

- O discurso adotado em São Paulo de que um prefeito de oposição teria dificuldade de negociar acordos com o governo federal também é feito aqui?

- Soltam tudo. Eles aproveitam que estão com o poder na mão. Mas o povo me conhece, não tem dado muito ouvido

- Líderes históricos de vários partidos não foram bem na eleição. A que o senhor atribui essa sua sobrevivência política?

-Sempre fui um madrugador, um construtor de obras. Deixei muito forte minha marca como prefeito e depois como governador. Construímos casas em mutirão em todas cidades, distribuímos muitos lotes urbanizados. Hoje, há uma população angustiada pela falta de ação do governo. A cidade cresce muito e a prefeitura não acompanha o crescimento. O povo, conhecendo meu estilo, sabe que poderei realizar um bom trabalho..

- A política municipal valoriza mais a administração do que a ideologia?

- Sim. O povo quer política de resultados, está carente de ações concretas. A população de Goiânia está amedrontada, prisioneira em sua própria casa a partir das 19 horas. São questões assim que levam o povo a preferir eleger alguém que apresente algo de positivo em seu benefício.

- Apesar do apoio ao governo Lula, parte do PMDB gostaria de um partido independente do Planalto. Qual a sua opinião?

- O PMDB tem sobre os ombros a responsabilidade de contribuir para a governabilidade do país. Mas o PMDB tem que se impor junto ao governo federal, fazendo respeitadas suas bandeiras. Caso contrário, ficando simplesmente como apêndice do governo, perdendo sua credibilidade junto ao povo e, conseqüentemente, perdendo liderança.

- Essa defesa de bandeiras poderia acontecer com o partido no governo, com dois ministérios, como é atualmente?

Na época, quando ainda estava nos últimos dias de Senado, disse que era favorável a que o PMDB ajudasse na governabilidade, mas sem ocupar cargos no governo. Seria mais simpático, o partido teria mais autoridade para impor suas posições. Mas decidiram pela aceitação de posição no governo. Paciência.

- Qual a razão da baixa representatividade nas capitais e nas grandes cidades, ao contrário do que ocorre no interior?

- Isso vem de algum tempo. O PMDB é, pela sua origem, um partido diferenciado. Surgiu numa hora muito importante, crítica, a época da ditadura. Foi o instrumento no qual o povo brasileiro se agarrou na luta pela liberdade. É um partido que faz parte da alma do brasileiro. É por isso que, com tantos desacertos, este partido não acaba. Justamente pelo apoio que tem no interior. A população de interior ainda conserva este compromisso com o partido.

- Mas como impedir que o partido perca expressão política?

- O PMDB tem que assumir uma posição muito corajosa, principalmente nas próximas eleições. Tem de participar como candidatura própria. Se não o fizer, fica muito difícil.

- O senhor vê algum nome neste momento?

- Tudo tem seu tempo, sua hora. Mas temos um quadro muito rico de valores.

- O que o senhor acha do governo Lula?

Ele assumiu o governo dotado de um espírito de prudência muito forte, não deixando se levar pela ação dos segmentos mais radicais de seu partido. Entendo que, a partir de agora, o governo federal precisa partir para uma política de resultados.

- Em que áreas?

Tem que pensar numa infra-estrutura mais arrojada, nas áreas de energia, de ferrovias, nas rodovias. E, ao mesmo tempo, ser mais ousado na própria área econômica, para permitir o desenvolvimento e minimizar o sofrimento do povo.