Título: Alternativas às PPPs
Autor: Antonio Corrêa Meyer e José Virgílio Enei
Fonte: Jornal do Brasil, 25/10/2004, Economia & Negócios, p. A-18

A Parceria Público-Privada (PPP) não pode ser tratada como a única solução para que o Estado logre atrair investimentos privados para projetos de relevante interesse social. A PPP poderá, sim, constituir uma importante alternativa, mas não deve inibir o emprego dos regimes tradicionais de contratação. O Semi-Árido brasileiro é emblemático. O Brasil possui uma vasta região ¿ concentrada no Nordeste e em Minas Gerais ¿ caracterizada pelo clima semi-árido, isto é, escassez de chuvas. Trata-se de região carente e pouco desenvolvida, mas rica em terras irrigáveis, com grande potencial agrícola, na extensa área que compõe o Vale do São Francisco. Segundo estudo do Banco Mundial, investimentos em irrigação poderiam promover desenvolvimento do Semi-Árido, oferta significativa de empregos, redução da pobreza e aumento das exportações.

Ciente desse potencial, o governo já promoveu nessa região, diretamente ou através da Codevasf e outros entes públicos, pesados investimentos em infra-estrutura comum de irrigação, estradas, energia e desapropriação de terras improdutivas para assentamento de pequenos agricultores.

Contudo, esses investimentos realizados pelo poder público no Semi-Árido têm se mostrado insuficientes e subaproveitados, pois as limitações e burocracia próprias da máquina estatal impedem que esta atue com a mentalidade empresarial necessária ao sucesso do agronegócio no contexto de competitividade global. Como resultado disso, as obras de infra-estrutura não são concluídas na extensão e no prazo desejados ou então não são operadas ou mantidas adequadamente. Os pequenos agricultores também não encontram a parceria empresarial necessária ao sucesso de seu empreendimento. Reconhecendo essas deficiências, o governo vem apostando nas PPPs como forma de inserir a comunidade empresarial na cadeia do agronegócio integrado, transferindo a esta a responsabilidade pelos investimentos em irrigação, operação e manutenção da infra-estrutura comum, cultivo de áreas próprias e integração de pequenos agricultores mediante coordenação de suas atividades, apoio tecnológico e compra de suas colheitas.

Alguns relevantes projetos já se encontram contemplados em regime de PPP no Plano Plurianual de 2004- 2007 como projetos-piloto.

Embora as PPPs possam criar novas opções de colaboração entre os setores público e privado, a perspectiva de sua aprovação não deve inibir iniciativas baseadas em regimes tradicionais. Primeiro porque as PPPs precisam ser aprovadas no Congresso e regulamentadas, para que então possam ser adotadas. E principalmente porque as PPPs devem ser reservadas a projetos que não seriam viáveis mediante a simples cobrança de tarifa ou preço no mercado.

No caso do Semi-Árido, estudos do governo indicam que alguns projetos, onde já foram feitos pesados investimentos públicos na infra-estrutura básica de irrigação, poderiam ser capazes de gerar produção agrícola suficiente para tornar viáveis investimentos privados.

Se isso é verdade, o governo poderia servir-se de instrumentos vigentes como a concessão de uso de bem público, de direito real de uso ou de serviço público, para transferir desde já à iniciativa privada a responsabilidade pela realização de tais investimentos.

O desenvolvimento não depende só de novas leis, mas da mudança de paradigmas, como a supressão do viés social de subsistência dos projetos de irrigação para imprimir a visão moderna do agronegócio economicamente sustentável e capaz de gerar o progresso da região e do País.