Título: ''Não queria ser obstáculo para o partido''
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 10/07/2005, País, p. A2

Abatido, as olheiras visíveis, lágrimas no brilho do olhar, José Genoino era o espelho da derrota ao anunciar sua renúncia à presidência do PT no início da tarde de ontem. A reunião do Diretório Nacional foi tensa. Genoino não esperou pelas cobranças de companheiros sobre os empréstimos avalizados por Marcos Valério Fernandes de Souza, sócio das agências de publicidade SMPB e DNA, nem os comentários sobre a prisão do assessor parlamentar do irmão, o deputado José Guimarães, flagrado com a cueca cheia de dólares e uma mala com reais. Na noite anterior, sentindo-se sem respaldo partidário, avisou ao presidente Lula que se afastaria. E cumpriu a promessa.

- Neste momento difícil que atravessamos, considero que não deveria continuar presidindo o PT e faço isso com o sentimento de dever cumprido. Não quero ser obstáculo para revigorar o partido - anunciou Genoino cercado por líderes petistas como o prefeito de Aracaju, Marcelo Deda, o senador Aloizio Mercadante (SP) e o deputado e ex-ministro José Dirceu .

Num discurso de improviso, em vários momentos se controlou para evitar o choro.

- Nós do PT não praticamos irregularidades, o PT não compra nem paga deputados. A divisão no partido é só de táticas e estratégias. Não é entre bons e maus.

Deputado por 20 anos, presidente do partido nos últimos 30 meses, Genoino de certa forma tentou explicar como assinou pedidos de vultosos empréstimos feitos pelo partido no BMG e no Banco Rural sem saber quem era o avalista ao afirmar que gosta de ''viver o lado ético e romântico da política''.

- Volto agora à rotina de um simples cidadão, o cidadão José Genoino Neto. Vou pensar agora em como sobreviver na vida.

Se a saída de Genoino era reivindicada pela esquerda do partido e até por integrantes da tendência que controla a legenda, o anúncio da decisão pegou alguns de surpresa e provocou constrangimento em outros.

- Reconheço que não tenho mais maioria no Diretório - afirmou o então presidente do PT ao abrir a reunião da cúpula da legenda.

Poucos foram o que manifestaram algum tipo de reação ao comentário. O líder do partido na Câmara, Arlindo Chinaglia, tanto durante o encontro quanto depois, lembrou que saída de Genoino não resolveria o impasse político da legenda, emparedada por denúncias.

- Isso não vai resolver nada. O impacto fica e a curto prazo vamos sangrar mesmo - observou Chinaglia.

Crítico do comando do PT e da política econômica do governo Lula, o deputado Chico Alencar (RJ) contou que o silêncio acompanhou o comunicado do presidente do partido.

- Foi um silêncio ruidoso, forte. A gravidade levou-nos todos a reagir de forma circunspecta.

Genoino não queria aplausos. Esperou pela solidariedade da cúpula partidária e, como poucos se manifestaram e garantiram o apoio, decidiu sair para evitar constranger ainda mais o partido e o presidente Lula.

- Tenho de colocar minhas pretensões e opções em segundo plano. Nestes dias, consultando as lideranças e as forças políticas da legenda, e diante da responsabilidade do PT nesse momento para enfrentar a crise e superá-la, e ser um partido fundamental na viabilização das mudanças promovidas pelo governo Lula, buscar a repactuação interna e com a base social e política, informei ao Diretório Nacional que não deveria continuar presidindo o PT - anunciou no início do discurso de improviso, justificando a saída.

Foi embora sem responder a perguntas e sem definir seu futuro. Será substituído, até a convenção marcada para setembro, pelo atual ministro da Educação, Tarso Genro, que deverá deixar o cargo e abrir uma nova vaga na Esplanada dos Ministérios. O ex-ministro Ricardo Berzoini assumirá a secretaria-geral.