Título: ''Caso Nixon era menos grave''
Autor: Paulo Celso Pereira
Fonte: Jornal do Brasil, 11/07/2005, País, p. A4

Dezenas de quadros de propaganda do regime socialista soviético formam a decoração do gabinete do prefeito Cesar Maia. Poderia ser normal, desde que ele não fosse o pré-candidato do PFL, considerado o quartel-general da direita brasileira, à Presidência da República. Aos 60 anos, completados no último dia 18, o prefeito esbarra agora na prudência necessária para avaliar se vale a pena disputar o cargo. Aval do partido, ele já tem, resta saber qual a reação do eleitorado: ¿Não vou sair da Prefeitura para concorrer; só sairei se for uma candidatura fortemente competitiva¿. Caso não dispute a Presidência, Cesar pode concorrer ao governo do Estado. Essa opção, no entanto, depende dos candidatos que estarão pleiteando o Palácio Guanabara. O prefeito diz que no quadro atual não tentaria, mas deixa o futuro em aberto: ¿Pode haver um campo em que seja nomeação para mim. E outro que seja uma eleição dificílima¿.

Sumido do noticiário desde as primeiras denúncias que atingiram o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quando falou até em impedimento do presidente ao fazer uma analogia com o caso Nixon, Cesar garante que a saída de cena foi uma decisão do partido, que não quer ser ¿acusado de oportunismo¿. Acrescenta, no entanto, que hoje, Lula não poderia renunciar nem que quisesse. ¿Ao contrário do que aconteceu com Jânio, que pediu renúncia tendo 93% do Congresso e em 10 minutos ela foi aceita, se Lula renunciasse hoje, o Congresso rasgaria o pedido e mandaria um emissário dizer ao presidente que não aceita¿.

Para o prefeito do Rio, Lula já está fora das eleições de 2006. Segundo ele, depois dessas denúncias, ficou provada a ¿desqualificação para o exercício do cargo¿ do presidente. ¿Isso resulta na impossibilidade política de se reeleger. Ele vai concorrer, mas não se elegerá¿, profetiza.

- Como está a sua campanha ou pré-campanha à presidência da República?

- O PFL decidiu há dez dias, em reunião na casa do senador Jorge Bornhausen que a pré-campanha será feita com pouca visibilidade. Vamos atuar em alguns estados, mas não vamos usar esse processo como pré-campanha para não ser entendido como oportunismo. Nos programas de televisão do PFL aparecerei parcialmente, com um tempo maior do que os outros, mas não vou ocupar todos os espaços do PFL.

- Já está fechado seu nome para a Presidência?

- Não. Em março será feita uma avaliação. Não vou sair da Prefeitura do Rio para concorrer. Vou sair se for uma candidatura competitiva. O PFL não vai abrir mão do Rio para marcar posição. Se chegar em março, e a candidatura for fortemente competitiva, vamos em frente. Se não, continuo na prefeitura. Aí o PFL toma uma decisão. Vai com uma candidatura própria de um nome conhecido do PFL, o Marco Maciel, por exemplo, ou, dependendo das circunstâncias, se soma ao PSDB.

- No caso de aliança, existe a possibilidade de o senhor candidatar-se ao governo do estado?

- Em política, dizer que não existe a possibilidade é correr o risco. Perguntar qual é a chance de isso acontecer com os dados que tenho hoje, eu diria zero por cento. Não posso fazer uma antecipação de dez meses. A chance é zero.

- Que dados impedem sua candidatura?

- Ser prefeito do Rio tem uma dimensão de governador. E tem a responsabilidade dos Jogos Pan-Americanos. Principalmente nesse momento, que essa crise nacional, está obstruindo decisões do governo federal. Com isso, sair da prefeitura seria em função de uma candidatura competitiva a presidente. Sair para o governo do estado, segundo o PFL, não se deveria fazer. Mesmo sendo o favorito, como é o meu caso hoje.

- Como o senhor vê a intervenção federal no Rio durante a crise da saúde? Foi negativa ou positiva para sua imagem?

- O importante é uma avaliação em função do momento em que o político se expõe. Hoje os hospitais que geram desgastes são aqueles que voltaram ao governo federal. Semana passada, o Hospital de Ipanema estava com todas as salas de cirurgia fechadas. Na semana anterior, o Hospital do Andaraí estava sem emergência. No início era uma grande crise na saúde pública, depois se levantou a suspeita de que havia interesse político nisso. Hoje, posso dizer que lá em cima, no Planalto, há um arrependimento enorme por essa intervenção. Se eu puser uma pesquisa na rua, o fator saúde não vai influenciar o voto.

- O PSDB e o PFL disputam eleitorado?

- Não. O PSDB é um partido paulista. São Paulo é o estado com a maior proporção de eleitores, economicamente o mais forte. Um candidato que sai alavancado de São Paulo é um candidato que vai para essa posição. Sem o estado de São Paulo, o Alckmin vai para quarto lugar. Se você retirar o estado de São Paulo, Alckmin perde para mim. É muito difícil fazer previsão.

- Deputados aliados ao senhor, dentre os quais seu filho, já haviam comentado algo sobre o mensalão?

- Não era um grupo de deputados, o Congresso todo falava sobre mensalão. Quando dei a entrevista à Folha de S. Paulo, em abril, falei sobre o mensalão e dois deputados do PT me processaram. O JB apresentou uma matéria com o Miro Teixeira, que acabou recuando sobre o tal do mensalão. O Severino Cavalcanti deu uma entrevista em fevereiro citando o valor do mensalão para a Folha .

- E o Roberto Jefferson?

- Ele pode não falar toda a verdade, mas tudo que ele falar é verdade. Um político com a experiência dele sabe que, quando fala a verdade, não entra em contradição. Pode-se depor à vontade, ou fazer como o Marcos Valério, tem de mentir. Para não mentir não fala. Vai no Supremo, pega o habeas corpus e está protegido.

- O PMDB acabou sendo envolvido no mensalão. Há possibilidade de envolver o PFL?

- Não posso falar do que acontece em Rondônia. Agora, na Câmara dos Deputados e no Senado, garantidamente não. Nem PSDB, nem PFL. Por que? Porque eles foram depurados. Mensalão já levou gente. Nós elegemos 84 deputados e temos 64. Não quer dizer que tenham ido por isso. Alguns foram porque sua base eleitoral precisava de um posto de saúde, de asfaltamento, mas não há razão para quem está nesse jogo ficar na oposição.

- Uma parte dos dissidentes pode estar envolvida?

- Não vou me aventurar a dar essa opinião. Não há razão para permanecer no PFL quem quiser receber mensalão.

- Uma das denúncias do Roberto Jefferson é o uso de empresas públicas para a arrecadação de dinheiro de campanha. Como o senhor, que foi candidato três vezes à Prefeitura, avalia essa denúncia?

- Ele não denunciou, fez uma afirmação. O uso não quer dizer necessariamente que é para enriquecimento. É para ter voto. Há políticos que não têm essa prática. São políticos de opinião pública. Fui deputado federal duas vezes e nunca botei um metro de asfalto. Sempre tive voto de opinião pública. Não posso julgar porque é um assunto que não fez parte da minha vida política.

- Em termos de contribuição de campanha, ele falou que nenhuma empresa pode ajudar por dentro...

- Diria que a cada eleição menos se consegue que as empresas estejam dispostas a dar tudo por dentro. Deve-se desconectar quem recebe de quem doa. Por exemplo, contribuir ao partido apenas, que faz a alocação do recurso, sem divulgar a origem. Se um empreiteiro quer dar dinheiro para a campanha de um deputado, o deputado não pode receber, mas o partido sim. A doação deve ser para o partido.

- Como o senhor vê as denúncias no governo Lula?

- É uma situação nova, que é o uso de delivery. É uma empresa especializada na distribuição de recursos para deputados. A empresa do Marcos Valério fazia delivery de mensalão. Temos um caso novo e gravíssimo: a corrupção privada acoplada a corrupção pública.

- Mas Fernando Henrique é acusado de ter pago a deputados para se reeleger...

- Vamos admitir que, sem a ciência de FH, amigos dele tenham feito isso. Mas não é aluguel de mandato, é a corrupção corriqueira. O aluguel de mandato é uma coisa inacreditável. Eu nunca vi isso. Teve um que disse assim: corrupto que se enxerga não aceita esse esquema.

O senhor já falou em impeachment do Lula. Acredita nisso?

- Não falei em impeachment. No dia 6 de junho, quando Roberto Jefferson deu a entrevista, disse que o caso do Nixon era menos grave do que esse caso. Hoje posso dizer que o caso do Nixon é um bilhão de vezes menos grave. Ele renunciou e respondeu por crimes de responsabilidade. O Roberto Jefferson esteve com o presidente em janeiro e março. Depois disso não houve o ato formal do presidente pedindo a investigação. O que vai acontecer lá na frente? A opinião pública vai sendo alcançada por ondas. O ''Manuel da enxada'' vai ser alcançado daqui a dois ou três meses.

- Considera possível Lula renunciar?

- Tomara que não. Repito o que o Marco Maciel disse. Se ele renunciar vai ser o contrário do Jânio. No Jânio, aceitaram a renúncia em dez minutos, no caso do Lula não vão aceitar. No final, a opinião pública vai desqualificá-lo da função de presidente, mas não da sua posição pessoal.

- Lula se reelege?

- É impossível. Ainda corre o risco de não ir para o 2º turno. A majestade do poder foi completamente desfeita.